Maduro tira ao novo Parlamento poderes sobre o banco central
Assembleia controlada pela oposição tomou posse, um cenário inédito desde 2000. Exército dificultou acesso dos deputados antiregime e chavistas abandonaram cerimónia
A Venezuela viveu ontem um dia histórico, com a tomada de posse da nova Assembleia Nacional, a primeira com uma maioria de oposição em 16 anos. A cerimónia decorreu rodeada por fortes medidas de segurança e o presidente Nicolás Maduro conseguiu ter a última palavra, ao divulgar o conteúdo de um pacote de medidas que inclui a transferência para si de vários poderes sobre o Banco Central da Venezuela que até agora estavam nas mãos dos deputados.
A notícia de que haveria em breve um pacote de reformas foi dada por Maduro a 30 de dezembro, precisamente um dia antes de expirar os poderes que lhe haviam sido dados pela Assembleia Nacional, ainda controlada pelos chavistas, para legislar qualquer matéria. O conteúdo destas reformas foi anunciado ontem pela manhã, algumas horas antes da tomada de posse do novo Parlamento.
E foi assim que o presidente reclamou para si vários poderes sobre o Banco Central da Venezuela até agora pertencentes ao Parlamento. Desta forma, foi suprimida a obrigação de que a ratificação da nomeação do presidente do órgão regulador seja "ratificada pelo voto da maioria dos membros da Assembleia Nacional" e este responsável passará a "ser nomeado pelo presidente ou presidenta da República por um período de sete anos".
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Estas alterações à lei que rege o banco central eliminam também a faculdade que o Parlamento, por maioria, tinha em nomear dois dos seis elementos da direção da instituição, possibilidade que passa a ser agora da exclusiva responsabilidade do chefe do Estado.
O novo presidente da Assembleia Nacional, Henry Ramos Allup, pertencente à oposição, classificou estas alterações legislativas como um "retrocesso".
Corte de emissão
O centro de Caracas acordou tomado pelos militares, que criaram cinco anéis de segurança em torno do edifício da Assembleia Nacional, que pela primeira vez em muito tempo não exibia uma fotografia gigante de Hugo Chávez.
Segundo o jornal El Mundo, este aparato tinha o objetivo de dificultar o acesso dos deputados da nova maioria à cerimónia, nomeadamente os três eleitos que foram impedidos de iniciar funções na sequência de uma decisão do Supremo Tribunal de Justiça. "Começaram a agredir um grupo de deputadas. Saímos em sua defesa e travaram-nos à coronhada. Outros foram atirados ao chão", contou ao El Mundo José Brito, um dos deputados da oposição.
Enquanto a cerimónia de tomada de posse decorria no Parlamento, a primeira aberta a toda a imprensa, nas ruas de Caracas realizaram-se manifestações pacíficas de apoio, tanto à oposição, como ao chavismo.
Os deputados do regime abandonaram o Parlamento mais cedo, alegando que Ramos Allup havia violado o regulamento interno ao conceder a palavra a deputados da oposição após a tomada de posse. "Se é muito importante dar o direito à palavra a alguns dos deputados da oposição, que se convoque uma sessão extraordinária, mas eles insistem em violar as leis", disse Diosdado Cabello, que até ontem presidiu ao Parlamento, explicando que o regulamento estabelece que "na primeira sessão apenas se procede à instalação da Assembleia".
A saída dos chavistas deu-se depois de deputados da oposição insistirem na criação de uma lei de amnistia para os presos políticos na Venezuela. "É ilógico que os assassinos se perdoem a si mesmos", comentou Cabello. Após este incidente, a TV estatal deixou de transmitir a cerimónia, passando imagens das manifestações de apoio ao regime que decorriam na rua.