Juiz: "Embora mereça todo o respeito, não significa que está imune à investigação"
Eram 06.00 da manhã em São Paulo (mais três horas em Lisboa) quando os elementos da Polícia Federal bateram à porta da casa de Lula da Silva, em São Bernardo do Campo, para cumprir um mandado do juiz Sérgio Moro. O ex-presidente foi alvo de uma ordem de "condução coercitiva", usada para o obrigar a declarar no âmbito do processo Lava-Jato, com o magistrado a deixar claro que só devia ser usada caso Lula recusasse o convite para ir prestar declarações e esclarecendo que não deviam ser usadas algemas.
"Embora o ex-presidente mereça todo o respeito, em virtude da dignidade do cargo que ocupou (sem prejuízo do respeito devido a qualquer pessoa), isso não significa que está imune à investigação", escreveu Moro no despacho, alegando haver "motivo circunstancial relevante para justificar a diligência". A polícia federal cumpriu ainda vários mandados de busca e apreensão, numa lista onde estava incluída a casa de São Bernardo do Campo, mas também a sede do Instituto Lula, o apartamento tríplex do Guarujá e o sítio em Atibaia (que o ex-presidente nega serem seus).
A mesma mensagem de que ninguém está acima da lei foi veiculada numa nota do Ministério Público Federal (MPF): "Dentro de uma república, mesmo pessoas ilustres e poderosas devem estar sujeitas ao escrutínio judicial quando houver fundada suspeita de atividade criminosa, a qual se apoia, neste caso, em dezenas de depoimentos e ampla prova documental". O MPF diz que há provas de que Lula era um dos "principais beneficiários" do esquema de corrupção na Petrobras.
Condução coercitiva
Moro emitiu, a pedido do MPF, o "mandado de condução coercitiva" contra Lula (e a sua mulher, Marisa Letícia, que deverá testemunhar numa data posterior), explicando no despacho que este só deveria ser usado caso o ex-presidente não aceitasse o convite para prestar declarações. Numa conferência de imprensa, depois de ter sido ouvido durante três horas nas instalações da Polícia Federal no aeroporto de Congonhas, Lula disse que Moro não precisava da coerção. "Seria simples me convidar para um depoimento que eu iria. Eu gosto de Curitiba, podia ir lá depor", indicou.
O despacho do juiz lembrava que a decisão de emitir o mandado de condução coercitiva "não envolve qualquer juízo de antecipação de responsabilidade criminal, nem tem por objetivo cercear direitos do ex-presidente ou colocá-lo em situação vexatória". Além disso, "não implica cerceamento real da liberdade de locomoção, visto que dirigida apenas a tomada de depoimento". Lula disse contudo que se sentiu como "um prisioneiro".
O objetivo da ordem de "condução coercitiva" era prevenir "incidentes que podem envolver lesão a inocentes", com Moro a lembrar os confrontos entre manifestantes a favor e contra Lula diante do Fórum Criminal de Barra Funda, em São Paulo, onde o ex-presidente estava previsto testemunhar a 17 de fevereiro. A polícia teve que intervir nessa ocasião. Os confrontos voltaram contudo a repetir-se ontem.
Durante o depoimento, segundo o deputado Paulo Teixeira, do Partido dos Trabalhadores, Lula perdeu a calma com algumas das perguntas da polícia. E à saída pediu para se pentear, dizendo que ainda vestia a T-shirt do ginásio que tinha quando a polícia entrou na sua casa.