May enfrenta moção de censura: "Vou contestar esse voto com tudo o que tenho"
A primeira-ministra britânica, Theresa May, enfrentará esta quarta-feira uma moção de censura à sua liderança do Partido Conservador, depois de pelo menos 48 deputados do seu partido terem declarado ter perdido a confiança no seu trabalho.
O desafio à liderança surge num momento chave da discussão sobre o Brexit, após May ter adiado a votação no parlamento britânico do acordo que negociou com Bruxelas.
Nas redes sociais, mais de cem deputados conservadores já indicaram o seu apoio à primeira-ministra. Ela precisa de 158. Segundo as contas do jornalista Andrew Neil, da BBC, ela já tem esse apoio. Contudo, sendo o voto secreto, isso não garante que irá ganhar.
Caso May perca a moção de censura, os Tories terão que eleger um novo líder que assumirá automaticamente a chefia do governo britânico, sem necessidade de convocar eleições gerais (estas estão previstas apenas para 2022). Só uma moção de censura no parlamento ou a decisão de May de antecipar as eleições é que implicaria nova ida às urnas.
"Vou contestar esse voto com tudo o que tenho", disse May, lembrando que é membro do partido há 40 anos e que sempre serviu o "interesse nacional". A primeira-ministra diz que, neste momento, fazer isso é garantir que haverá um Brexit, voltando a defender que o seu acordo é o melhor possível.
"Uma mudança de liderança agora vai pôr o futuro do nosso país em risco e criar incerteza quando menos precisamos", avisou May, dizendo que será impossível que haja um novo líder até 21 de janeiro (último prazo para a aprovação do acordo de Brexit) e isso arrisca dar o controlo das negociações à oposição no Parlamento. Segundo May, os únicos a beneficiar seriam o líder do Labour, Jeremy Corbyn, e o ministro-sombra das Finanças, John McDonnell.
Tudo porque o novo líder conservador não teria tempo para reabrir as negociações e conseguir um novo acordo até 29 de março (data do Brexit). Por isso, "uma das suas primeiras medidas teria que ser estender o prazo da aplicação do artigo 50, atrasá-lo ou revogá-lo completamente, quando as pessoas querem que avancemos", referiu May. Além disso, nada garante que ele conseguisse renegociar alguma coisa.
"As semanas gastas em confrontos entre nós apenas criarão mais divisões, numa altura em que devemos estar juntos para servir o nosso país", afirmou a primeira-ministra, numa declaração à porta do número 10 do Downing Street.
"Mas os conservadores não devem ser um partido de um único tema. Somos um partido de toda a nação. Moderado, pragmático, convencional, comprometido a reunificar o nosso país e a construir um país que funciona para todos - a agenda que estabeleci no primeiro discurso no exterior desta porta", afirmou.
"Garantir o Brexit que o povo britânico votou. Construir um país que funciona para todos. Dediquei-me incansavelmente a essas tarefas desde que me tornei primeira-ministra. E estou pronta para acabar o trabalho", concluiu.
A primeira-ministra tem um dia preenchido pela frente. Ao meio-dia, vai ao Parlamento para a sessão semanal de perguntas e respostas, enfrentando Corbyn. A reunião do conselho de ministros, prevista para as 14.00, foi entretanto cancelada. Às 17.00, May irá discursar no Comité 1922 (como é conhecido o grupo parlamentar conservador formado por deputados que não têm cargos no governo), antes do início da votação, às 18.00.
O líder do Comité 1922, Graham Brady, anunciou que já tem 48 cartas de deputados conservadores a declarar a perda de confiança em Theresa May, desencadeando automaticamente o voto de confiança.
A votação secreta decorrerá entre as 18.00 e as 20.00, sendo os votos contados "imediatamente depois e um anúncio feito o mais rápido possível", indicou Brady. Num comunicado, o líder do comité afirmou: "O limiar de 15% do grupo parlamentar a pedir um voto de confiança na líder do Partido Conservador foi ultrapassado."
Nessa votação, caso haja 158 votos contra May entre os 315 deputados do partido no Parlamento implicam a sua saída de líder do Partido Conservador e consequentemente do número 10 de Downing Street. Mas, caso May vença, ficará blindada durante um ano, não podendo ser novamente desafiada durante esse período.
O desafio à liderança surge depois de a primeira-ministra ter adiado a votação do acordo de Brexit no parlamento britânico, sabendo à partida que não tinha o número de apoios necessários para ultrapassar esse obstáculo. May iniciou na terça-feira um périplo pelas capitais europeias à procura de mais garantias, mas foi sempre recebida com a rejeição dos líderes europeus em renegociar o Brexit. Amanhã há Conselho Europeu.
Vários ministros estão a publicar no Twitter o seu apoio à primeira-ministra que, segundo as contas dos media, já terá cem votos a favor.
"Apoio a primeira-ministra a 100% - e exorto todos os deputados conservadores a fazer o mesmo. Ela está a lutar pelo nosso país e não há ninguém melhor colocado para garantir que a decisão do povo britânico de deixar a União Europeia é cumprida", escreveu Michael Gove, ministro do Ambiente.
"A primeira-ministra tem o meu apoio total, desde logo porque ela sempre fez o que acredita firmemente ser o interesse nacional. O nosso país precisa que todos lutemos por um bom acordo e que nos preparemos para o cenário de um não-acordo", escreveu Penny Mordaunt, ministra para o Desenvolvimento Internacional e secretária de Estado para a Mulher e a Igualdade.
Por outro lado, um dos principais críticos e opositores internos a May, o deputado Jacob Rees-Mogg, que foi um dos que escreveu uma das cartas a Brady, defende que "o país precisa de um novo líder".
Se May perder, desencadeia uma corrida à liderança, estando impedida de concorrer nessa eleição. O seu sucessor ou sucessora será também chefe do governo, não havendo necessidade de convocar eleições gerais (estas estão previstas apenas para 2022).
Se existirem vários candidatos, existe um voto secreto entre os deputados conservadores. O candidato com menos votos vai saindo a cada votação (que se repete às terças e quintas) até que só restem dois. Esses vão depois a votos entre todos os militantes do partido (especialistas indicam que o processo pode ser rápido, visto que a informação já está toda organizada).
Quando David Cameron decidiu afastar-se da liderança do partido, após o referendo do Brexit de 2016, houve cinco candidatos. A escolha final seria entre Theresa May e a ministra Andrea Leadsom, que recuou antes do voto dos militantes, permitindo que May se tornasse líder sem oposição.