Shutdown nos EUA: Trump bate recorde de Clinton
Na sexta-feira, os 800 mil funcionários federais afetados pelo encerramento parcial dos serviços federais norte-americanos sentiram na pele - ou antes, na conta bancária - os efeitos da medida. Todos ficaram sem receber salário, embora cerca de metade esteja em casa, e a outra, considerada essencial, esteja a trabalhar sob requisição.
Até agora é assim que funciona. Mas na sexta-feira a Câmara dos Representantes aprovou uma lei, com 411 votos a favor e sete contra, que prevê a restituição salarial em retroativos. Aprovada pelo Senado, segue para a Sala Oval, para ser promulgada ou vetada por Donald Trump.
Um quarto dos funcionários federais, ou seja, 800 mil, da maioria dos ministérios (departamentos), como o de Estado, da Justiça, de Segurança Interna e das agências federais, fechando museus e monumentos e afetando quer os funcionários do fisco quer os vigilantes dos parques nacionais, por exemplo.
A crise foi provocada pelo presidente norte-americano. Ao ver que o Orçamento aprovado na Câmara dos Representantes - na altura ainda de maioria republicana - não incluía financiamento para a construção parcial do muro com o México, o presidente insistiu na necessidade de 5,7 mil milhões de dólares (5 mil milhões de euros) para acabar com o que chamou de "crise" na fronteira. Uma crise causada pela entrada ilegal de imigrantes, de terroristas e de drogas, alega.
Os democratas - e alguns republicanos - discordam da construção do muro. É considerado um projeto caro, ineficaz e que não resolve os problemas de fundo da imigração. Por outro lado, as acusações de Trump de que a morte das duas crianças imigrantes sob custódia das autoridades norte-americanas foi culpa dos democratas cavaram um fosso maior.
A agência de notação Standard & Poor's calculou que a paralisação custou 3,6 mil milhões de dólares (3,1 mil milhões de euros) até sexta-feira. Se permanecer assim mais duas semanas o prejuízo vai superar o que Donald Trump exige para a construção do muro, avisa a empresa. "Enquanto alguns impactos indiretos podem ser recuperados quando os serviços da administração federal forem abertos, os impactos diretos são irreparáveis, informou a S&P em comunicado. "A perda de produtividade e de funcionários na atividade económica não será recuperada."
No dia 16 de dezembro de 1995, o presidente Bill Clinton, em discórdia com a maioria republicana no Congresso acerca do financiamento de setores como a saúde, educação e meio ambiente no Orçamento de 1996, A crise durou 21 dias e terminou no dia 6 de janeiro de 1996, quando republicanos e democratas chegaram a um acordo sobre o Orçamento. O encerramento já tinha sido precedido de outro mais curto, de cinco dias, em novembro.
Neste momento não. Na quarta-feira, a última reunião do presidente com a presidente da Câmara, Nancy Pelosi, e com o líder da minoria do Senado, Chuck Schumer, demorou apenas 14 minutos. "Uma perda total de tempo", escreveu no Twitter. "Perguntei o que vai acontecer em 30 dias se eu desbloquear as contas rapidamente, vão aprovar a segurança na fronteira, que inclui um muro ou vedações de aço? Nancy disse não. Eu disse tchau, nada funciona!". O senador republicano Lindsey Graham tentou levar para a mesa a hipótese da legalização das centenas de milhares de imigrantes que chegaram aos EUA em crianças. Mas não houve progressos.
Já disse mais do que uma vez que está a considerar a hipótese. É a saída mais airosa que o presidente tem para sair da armadilha que montou. Por lei, ficaria com autoridade para alocar dinheiro do orçamento militar para projectos de construção do muro. É uma tática que poderia deixar quer Trump quer os democratas reivindicar vitória e acabar com o shutdown. Trump poderia dizer que iria cumprir a promessa de campanha eleitoral. Os democratas poderiam dizer que não cederam e iriam interpor ações judiciais para bloquear a medida alegando abuso de autoridade de Trump. A meio do novo capítulo de conflito, já em terreno judicial, Trump poderia finalmente assinar legislação que reabrisse os serviços federais. Num encontro com líder locais na sexta-feira à noite (hora portuguesa), o presidente dos EUA foi citado a dizer: "A solução mais fácil era eu declarar emergência nacional... mas não vou fazer isso tão depressa".