Propaganda ou caminho para a paz: Trump e Kim esquecem o passado
"Decidimos deixar o passado para trás", afirmou Kim Jong-un no fim do encontro com Donald Trump em Singapura. O líder norte-coreano prometeu que "o mundo vai ver grandes mudanças". Já o presidente americano sublinhou a "ligação especial" com Kim e garantiu querer convidá-lo para uma visita à Casa Branca.
Durante o encontro - o primeiro entre um presidente americano em funções e um líder norte-coreano - Trump e Kim assinaram um acordo em que se comprometem "com o estabelecimento de novas relações EUA-RPDC e a construção de um regime de paz duradouro e robusto na Península Coreana". No documento, o "presidente Trump comprometeu-se a fornecer garantias de segurança à RPDC, e o Presidente Kim Jong-un reafirmou o seu firme compromisso de completar a desnuclearização da Península da Coreia".
Vago e com poucos detalhes
Apesar destas declarações, alguns analistas sublinham a falta de medidas concretas no documento. Para Laura Bicker, enviada da BBC a Singapura, o acordo é "vago e com poucos detalhes". A verdade é que não há qualquer referência a uma verificação do processo de desnuclearização ou mesmo um calendário para essa desnuclearização.
Do lado americano, as garantias de segurança também não são especificadas. Os EUA têm neste momento 28500 soldados na Coreia do Sul (onde os EUA mantêm uma presença militar desde a guerra da Coreia - 1950-53), cujo futuro não é mencionado no acordo. Ambos os lados se comprometeram a prosseguir o diálogo.
Um dos pontos principais do documento assinado por Trump e Kim é o compromisso de trabalharem na questão dos restos mortais dos prisioneiros de guerra e desaparecidos em combate, incluindo a imediata repatriação dos que já estão identificados.
O que isto significa para cada líder
Donald Trump: para já o presidente americano poderá ligar qualquer sucesso que este encontro tenha à "pressão máxima" que impôs sobre a Coreia do Norte, com reforço das sanções económicas e ameaças de ação militar. Muitos acreditam que esta será a narrativa do lado americano, aconteça o que acontecer. Mesmo se , para já, Trump foi o único a deixar Singapura com uma obrigação concreta: acabar com os exercícios militares conjuntos com a Coreia do Sul.
Kim Jong-un: para o líder norte-coreano o encontro com Trump é, em si, uma vitória. Líder de um dos países mais isolados do mundo (que lidera desde 2011 tendo herdado o poder do pai e do avô), ser reconhecido no palco internacional é mais do que os seus antecessores conseguiram. E dá-lhe legitimidade.
Como chegámos até aqui
Depois de em 2017 terem deixado o mundo a temer uma nova guerra com a sua troca de insultos e ameaças, que culminaram no sexto ensaio nuclear de Pyongyang, em setembro, em 2018 Trump e Kim protagonizaram uma acalmia e aproximação. Tudo começou com o discurso de ano novo de Kim que abria a porta ao diálogo com os EUA. O grande mentor desta aproximação foi Moon Jae-in, o presidente sul-coreano que conseguiu que as duas Coreias desfilassem sob a mesma bandeira nos Jogos Olímpicos de Inverno, organizados em janeiro por aquele país.
A 27 de abril, Moon e Kim reuniram-se na zona desmilitarizada (DMZ) que separa os dois países desde a guerra, tendo-se comprometido a assinar o acordo de paz que porá fim oficial a um conflito que terminou apenas com um armistício. Os dois líderes coreanos voltaram a encontrar-se uma segunda vez, desta vez do lado norte-coreano da DMZ.
Aplausos da China
A China qualificou a cimeira como "histórica" e apelou a uma "desnuclearização total" para ultrapassar as tensões na península coreana.
Trump e Kim "estarem juntos e falarem como iguais tem um significado importante e positivo, e está a criar uma nova história", disse aos jornalistas o chefe da diplomacia chinesa, Wang Yi.
"O cerne da questão nuclear da península [coreana] é a segurança. A parte mais importante e difícil desta questão de segurança para os EUA e a Coreia do Norte é sentarem-se para encontrarem uma forma de resolução através de conversações entre iguais", adiantou Wang Yi, citado pela AFP.
A par da "desnuclearização total", o governante chinês defendeu a necessidade de haver "um mecanismo de paz para a península" capaz de satisfazer as "razoáveis preocupações de segurança" norte-coreanas, acrescentou.
15 segundo a apertar a mão
O encontro de Trump e Kim começou com um aperto de mão que vai ficar para a história Os dois líderes apareceram diante dos jornalistas reunidos no hotel Capella em Singapura cumprimentaram-se e viraram-se para as câmaras durante cerca de 15 segundos. Os dois dirigiram-se depois à sala onde decorreu o encontro. Apenas ficaram acompanhados pelos tradutores.