May sai de Bruxelas de mãos a abanar mas ainda acredita num milagre nas próximas semanas
Theresa May espera regressar a Bruxelas nas "próximas semanas" para continuar a discutir as condições do acordo do Brexit, nomeadamente em relação a algumas "clarificações" que ainda considera necessárias para convencer os deputados britânicos a aceitá-lo. As declarações dos 27, a dizerem que as discussões estão fechadas, não a demovem e May ainda acredita que "é possível" haver mais clarificações ao acordo sobre a saída do Reino Unido da UE.
"Discuti isso com os meus parceiros europeus, incluindo com o presidente [do Conselho Europeu Donald] Tusk e [da Comissão Europeia Jean-Claude] Junker e outros", afirmou a primeira-ministra britânica, no segundo dia de uma cimeira em que vários líderes se manifestaram indisponíveis para continuar a falar do acordo de retirada do Reino Unido da União Europeia.
"Sei que se disse que não haverá mais clarificações. Mas as minhas discussões com os líderes europeus mostram que clarificações além das conclusões do Conselho [Europeu] são, de facto, possíveis", disse, prometendo regressar a Bruxelas nas "próximas semanas".
Quanto ao que foi discutido na cimeira, reconhece que sobra apenas um conjunto de reafirmações, sobre o que já estava decidido. "A União Europeia deixou claro que tem a firme determinação para acelerarem a relação futura ou outra disposição alternativa, garantindo que não haverá uma fronteira [entre a Irlanda do Norte e a República da Irlanda], até 31 de dezembro de 2020", disse, concluindo que "então o backstop [mecanismo de salvaguarda sobre a fronteira entre as duas Irlandas] não será necessário".
Mas "se alguma vez o backstop for desencadeado será apenas temporariamente e a União Europeia usará os melhores esforços para negociar e concluir rapidamente um acordo posterior que substitua o backstop"", salientou a primeira-ministra britânica, acreditando que o funcionamento da solução de último recurso para a Irlanda é agora mais claro.
Os 27 debateram exaustivamente as questões relativas ao Brexit, deixando "claro como a água" que "não vai haver qualquer garantia legal e vinculativa", sobre o acordo de retirada do Reino Unido da União Europeia.
No final de um debate, Juncker denunciava a "falta de clareza" sobre o que Theresa May veio pedir a Bruxelas, classificando até como "nebulosas" as negociações com o Reino Unido.
Na sexta-feira pela manhã, no arranque da cimeira, Theresa May acabou por se dirigir ao presidente da Comissão, questionando-o num tom severo, sem se perceber exatamente qual foi o assunto tratado por ambos. Mais tarde, perante os jornalistas, Juncker tentou explicar as diferentes interpretações e o significado da palavra nebulosidade, em francês e em inglês, considerando que não possuem o mesmo sentido em ambas as línguas e por isso terá sido "mal interpretado".
A chanceler alemã, Angela Merkel, vincou, por seu lado, que o acordo de saída "não vai mudar", salientando que "a integridade do mercado único deve permanecer intacta e que o Acordo da Sexta-feira Santa (que pôs fim ao conflito da Irlanda do Norte em 1998) deve permanecer intacto". Além disso, esclareceu que "nenhum dos 27 da UE quer que o backstop chegue a ser necessário, mas que exista", disse ela. "Vamos ver como a primeira-ministra britânica reage a isso", acrescentou.
O Conselho Europeu aprovou umas conclusões minimalistas, que ficam muito aquém daquilo que pretendia Theresa May, limitando-se a "reafirmar das conclusões do Conselho de 25 de novembro", a data em que a União Europeia deu o aval político ao acordo aceite pelo governo de May sobre o Brexit. É caso para dizer que May sai de Bruxelas de mãos a abanar no que toca a novas concessões sobre o backstop por parte dos seus parceiros europeus.
A chefe do governo britânico enfrenta uma furiosa oposição interna ao acordo e não se sabe até quando vai aguentar-se no poder. No próprio Executivo, que aprovou o acordo do Brexit de novembro, houve demissões de ministros. Só o ministro do Brexit já é o terceiro. Depois, os deputados britânicos, incluindo os rebeldes do Partido Conservador, estão contra o acordo por causa da questão do backstop para a Irlanda do Norte. Ameaçam chumbá-lo no Parlamento.
Foi por isso que May adiou a votação que estava prevista para esta terça-feira que passou. Na quarta-feira, sobrevivey a uma moção de censura dentro do Partido Conservador, mas a margem não a deixou festejar muito tempo e aqueles que pediam a sua demissão continuam a pedi-la à mesma: 200 deputados votaram a favor de May, mas 117 votaram contra.
O líder do Labour, Jeremy Corbyn, desafiou May a submeter o acordo do Brexit à votação dos deputados na próxima semana. Mas ela nada disse quanto a isso. Downing Street apenas tinha feito saber, através de uma porta-voz, que o voto acontecerá antes de 21 de janeiro de 2019. O Brexit está previsto para 29 de março de 2019.
Face a isto, continuam a aumentar as vozes que pedem um voto popular sobre o acordo do Brexit, bem como as que pedem a realização de um segundo referendo. Isso mesmo voltou a defender esta sexta-feira o ex-primeiro-ministro do Reino Unido Tony Blair, que é do Labour. As divisões no Reino Unido são já de tal ordem que até os conservadores escoceses ameaçaram entretanto sair do Partido Conservador britânico, se necessário, para apoiar um segundo referendo sobre o Brexit.