May admite não ter apoio para terceiro voto sobre o Brexit
A primeira-ministra britânica, Theresa May, admitiu esta segunda-feira à tarde que não existe apoio suficiente para levar o acordo do Brexit a uma terceira votação na câmara dos Comuns esta semana. "Não há apoio suficiente nesta câmara para submeter o acordo a uma terceira votação", declarou a líder conservadora, começando a sua intervenção no Parlamento britânico por dar conta dos resultados do Conselho Europeu na passada semana. May foi forçada a reconhecer a falta de apoio nomeadamente depois da recusa do Partido Unionista Democrática em aprovar o acordo por considerar que nada mudou em relação ao backstop, ou seja, mecanismo de salvaguarda destinado a evitar o regresso de uma fronteira física entre a Irlanda do Norte e a República da Irlanda depois da saída do Reino Unido da União Europeia.
"Antes do Conselho Europeu escrevi ao presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, a pedir alterações ao backstop e uma extensão do Artigo 50º. E tendo em conta a sua posição, senhor speaker [John Bercow], de que o acordo do Brexit tinha que ser alterado para ser levado a nova votação. Tive que pedir uma extensão do Artigo 50º. O que lamento ter feito. Queria que deixássemos a União Europeia a 29 de março", declarou May, avisando os deputados: "O que quer que aconteça esta semana todos devem estar seguros de que alterar o acordo de retirada não é uma opção".
May lembrou as condições da extensão concedida pela UE27 ao Reino Unido: "Se esta câmara aprovar o acordo esta semana sairemos até 22 de maio. Se a câmara não aprovar o acordo sairemos a 12 de abril". A primeira-ministra informou ainda que o governo já depositou o instrumento legal para mudar a data do Brexit. "A data para a nossa saída já foi alterada a nível internacional, mas se não for aprovada a alteração contida no instrumento legal isso representará confusão, embora não vá alterar a data agora reconhecida a nível internacional para o Brexit".
No instrumento legal depositado lê-se: "O regulamento 2 emenda a definição de "data de saída" na secção 20(1) e (2) do Acto de 2018 para garantir que o dia e a hora especificados nessa definição é 11.00 da noite de 22 de maio de 2019 ou 11.00 da noite de 12 de abril de 2019, dependendo de se a câmara dos Comuns aprova o acordo de saída em tempo válido. Isto reflete o novo dia e hora a que os tratados deixarão de se aplicar ao Reino Unido à luz da extensão". May informou esta tarde, no Parlamento, que a alteração da data do Brexit será levada a votação esta quarta-feira.
Na sua intervenção, May criticou a emenda que vai ser apresentada esta segunda-feira à noite a votação pelos deputados, no sentido de ser a câmara dos Comuns a assumir a iniciativa no que toca à organização da votação das emendas no Parlamento britânico, especificando que o governo não apoiará esta emenda.
A emenda subscrita pelos deputados conservadores Oliver Letwin e Dominic Grieve e pela trabalhista Hilary Benn pretende retirar ao governo a precedência no estabelecimento da agenda de trabalhos na Câmara dos Comuns na próxima quarta-feira, "dada a necessidade de a Câmara debater e votar caminhos alternativos". O plano prevê que os deputados apresentem uma série de propostas com alternativas, as quais serão debatidas e votadas consecutivamente para saber se existe alguma que reúna o apoio de uma maioria de deputados. Esta ideia de votos indicativos já tinha sido sugerida e rejeitada antes, mas o impasse no Parlamento relativamente ao Brexit poderá permitir que seja validada desta vez.
A chefe do governo conservador avisou que os votos indicativos podem levar a resultados que podem não ser passíveis de negociação com a UE porque o Reino Unido é apenas parte da equação. E indicou que o governo britânico não se compromete em implementar qualquer resultado que saia desses votos indicativos. "O governo não pode dar um cheque em branco a qualquer coisa que venha a ser votada", reafirmou, sugerindo que uma das decisões por voto indicativo que poderia recusar seria a de organizar um segundo referendo sobre o Brexit.
May, cuja intervenção foi várias vezes interrompida e obrigou à intervenção do speaker da câmara, John Bercow, para pedir ordem, enumerou as opções que ainda existem em cima da mesa em aberto, como sejam um segundo referendo, uma extensão maior do Artigo 50º que obrigará os britânicos a participar nas eleições europeias de maio e que, sublinhou, levarão o Reino Unido para um soft Brexit no qual não votou.
Reagindo à intervenção da primeira-ministra, o líder do Partido Conservador, Jeremy Corbyn, declarou: "o Brexit é agora um embaraço nacional, com promessas falhadas atrás de promessas falhadas, as propostas da primeira-ministra foram rejeitadas pelo Conselho Europeu e novas condições foram-lhe impostas". O líder do Labour acusou a líder dos Tories de não procurar um consenso entre os vários partidos, ignorar largas partes do Reino Unido, bem como as pessoas que se têm manifestado [a favor de um voto popular] e assinado petições [a favor da revogação do Artigo 50º]. E desafiou May a declarar que o seu acordo está morto. Algo que ela não fez. Pois disse ainda esperar que a aprovação seja possível.
"O governo não tem um plano. Para si é tudo uma questão de pôr os interesses do Partido Conservador à frente dos interesses do país. É tempo de o Parlamento assumir o controlo. Vamos, por isso, apoiar a emenda que vai ser apresentada mais tarde", anunciou Jeremy Corbyn. atestando: "É tempo de limpar esta trapalhada. É tempo de o Parlamento trabalhar num Plano B e, em conjunto, acredito que vamos ser bem sucedidos onde o governo falhou".
Constatando que a UE anunciou hoje a conclusão dos seus preparativos para um No Deal Brexit, o líder parlamentar do DUP, Nigel Dodds, questionou-se porque é que são necessárias mais duas semanas. "O que vai mudar em duas semanas?", questionou-se. E afirmou que, pela primeira vez, parece estar a ver a primeira-ministra justificar o pedido de extensão do Artigo 50º com a necessidade de mais tempo para preparar um No Deal Brexit. O líder parlamentar do Partido Nacionalista Escocês (SNP), Ian Blackford, sublinhou que todo este processo é um embaraço para o governo e insistiu na tecla de que os escoceses votaram contra o Brexit no referendo de 23 de junho de 2016 e que não hesitarão em fazer um novo referendo sobre a independência da Escócia para conseguir, por essa via, permanecer na UE.