Ecologista, ativista anticorrupção. Zuzana Caputova é a primeira mulher a presidir à Eslováquia

Aos 45 anos e sem experiência política, capitalizou com o descontentamento dos eslovacos. Já a compararam a Macron e já teve o apelido de Erin Brockovich da Eslováquia.
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Ecologista, ativista anticorrupção, europeísta, defensora dos direitos dos homossexuais e do aborto num país maioritariamente católico romano. Sem experiência na política, Zuzana Caputova apresentou-se com as suas ideias liberais às urnas e viu os eslovacos, embalados pelos protestos e pela onda contra a corrupção, elegerem-na a primeira mulher presidente do país.

Quando tinham sido apuradas 99,84% das assembleias, a advogada de 45 anos reunia 58,38% dos votos enquanto o seu rival, Maros Sefcovic, conseguiu 41,61% dos votos - dados do gabinete de estatísticas da Eslováquia.

Divorciada e mãe de dois filhos, Caputova é uma ousider na política e por isso, mas também pelas suas ideias reformistas, já a compararam a Emmanuele Macron, o presidente da França. Na campanha, destacou-se pelas críticas ferozes ao governo e na militância pelas causas ambientais e anticorrupção.

Como advogada, Caputova travou uma luta de 14 anos com uma empresa que queria construir um aterro ilegal na sua cidade natal. Não só ganhou o caso como ganhou também o apelido de "Erin Brockovich da Eslováquia", numa referência ao filme de Steven Soderbergh interpretado por Julia Roberts em 2000.

Mas apesar de ser uma inexperiente, nestas presidenciais, Zuzana Caputova enfrentou - derrotou - um adversário de peso: Maros Sefcovic, comissário europeu da Energia, diplomata de carreira, de 52 anos, e apoiado pelo partido no poder, Smer-SD.

"É possível não ceder ao populismo", foi uma das primeiras frases de Zuzana Caputova, em reação ao anúncio dos resultados, acrescentando que a sua vitória prova igualmente que se pode "ganhar a confiança das pessoas sem recorrer a um vocabulário agressivo e aos ataques pessoais".

"Estas eleições provam que podemos ganhar sem atacar os adversários e acredito que esta tendência se confirmará nas eleições para o Parlamento Europeu [em maio] e nas legislativas no próximo ano", declarou a futura presidente eslovaca, que deverá tomar posse a 15 de junho. Apelou também à união do povo eslovaco: "Procuremos o que nos une, coloquemos a cooperação acima dos interesses pessoais."

O bouquet de flores

O rival, Maros Sefcovic, veio já assumir a derrota e telefonou a Caputova a felicitá-la pela vitória. "Mandei-lhe um bouquet de flores, porque a primeira mulher presidente da Eslováquia merece um bouquet."

O presidente cessante Andrej Kiska também já reagiu: "Muitos países provavelmente nos invejam por escolher uma presidente que simboliza valores como a decência." "A Eslováquia está a atravessar uma crise moral e tem falta de um presidente como Zuzana Caputova", acrescentou.

Por seu turno, o primeiro-ministro, Peter Pellegrini, espera "uma cooperação construtiva".

A crise desencadeada pelo assassinato do jornalista

Estas eleições aconteceu um ano depois da crise desencadeada pelo assassínio de um jornalista de investigação e das muitas manifestações antigovernamentais que se seguiram. Analistas políticos consideram, aliás, que a vitória de Caputova se pode explicar pelo descontentamento popular face ao poder depois da morte de Jan Kuciak e da sua noiva, Martina Kusnirova - recorde-se que o homicídio ocorreu quando o jornalista se preparava para publicar um artigo sobre as alegadas ligações entre os políticos eslovacos e a máfia italiana.

Nessa altura, os eslovacos saíram à rua e Zuzana Caputova estava entre os que protestavam. As manifestações, sem precedentes no país desde a queda do comunismo no início dos anos 90, tiveram fortes repercussões e levaram à demissão do primeiro-ministro Robert Fico.

Até agora, cinco pessoas foram detidos, entre elas o presumível homicida, um multimilionário que tinha laços com o Smer-SD, o partido no poder. Na quinta-feira passada, o Parlamento Europeu pediu à Eslováquia que continue a investigação do caso, "incluindo todas as possíveis conexões políticas". Os eurodeputados expressaram "preocupação com alegada corrupção, conflito de interesses, impunidade (...) em círculos de poder eslovaco".

Capitalizar com o descontentamento

Já foi comparada ao presidente Macron, também ele um outsider chegado ao poder com um programa reformista. Zuzana Caputova submeteu-se ao voto dos eslovacos prometendo lutar por uma justiça igual para todos, melhores cuidados para os idosos e maior proteção ambiental. Mas o descontentamento público contra a corrupção terá sido, talvez, o tema com que mais capitalizou nas presidenciais. E assim a Eslováquia contraria uma tendência que viu políticos populistas e antieuropeus ganharem terreno a Europa.

Caputova é membro do partido liberal sem assento parlamentar - o Partido Progressista da Eslováquia - que ela prometeu abandonar se fosse eleita. Nestas eleições teve o apoio da oposição, bem como do atual presidente.

A vencedora das presidenciais deste sábado vai tornar-se o quinto presidente da Eslováquia, um país com 5,4 milhões de habitantes, membro da zona euro e da NATO - desde que o país ganhou independência, em 1993, depois da Checoslováquia se ter dividido em duas.

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