Depois de 20 anos de cadeia, ADN prova inocência de Christopher Tapp

Novas técnicas de investigação ao ADN permitiram encontrar o verdadeiro culpado pela violação e assassínio de Angie Dodge em 1996.
Publicado a
Atualizado a

Depois de ter estado 20 anos preso pela violação e assassínio de Angie Dodge, Christopher Tapp foi considerado inocente de todas as acusações. As novas técnicas de análise de ADN e os novos conhecimentos de genética permitiram encontrar o verdadeiro culpado.

"É uma nova vida, um novo começo, um novo mundo para mim e estou só a aproveitar um dia de cada vez", disse Tapp, de 43 anos, quando na passada quarta-feira ouviu a decisão do tribunal.

O que aconteceu?

Filha de Jack e Carol Dodge, Angie Raye Dodge nasceu a 2 de dezembro de 1977, em Vancouver, Washington. Era a única menina e a mais nova dos quatro filhos do casal. Terminou o liceu em Idaho Falls, em 1995, e continuou os seus estudos na Universidade Estadual de Idaho. Os amigos recordam-na como uma rapariga inteligente e feliz, que gostava da natureza, de acampar, das férias e das festas de Natal. Aos 18 anos, Angie morava sozinha num apartamento em Idaho Falls.

Entre as 00:45 e as 11:15 de 13 de junho de 1996, Angie foi violada e brutalmente assassinada em sua casa. O seu corpo foi encontrado por dois colegas que ficaram preocupados pelo facto de ela não ter ido trabalhar nessa manhã. A polícia começou imediatamente a investigar o caso e recolheu inúmeras pistas - incluindo uma amostra de sémen e cabelos, no local do crime. De acordo com os testes de ADN realizados na altura, o sémen e os cabelos pertenciam ao mesmo suspeito desconhecido.

O primeiro suspeito

Em janeiro de 1997, Christopher Tapp, de 20 anos, tornou-se o principal suspeito do caso. Apesar de o seu ADN não coincidir com as amostras recolhidas no local do crime, o Departamento da Polícia de Idaho Falls tinha a teoria de que várias pessoas teriam estado envolvidas no crimes e que uma dessas pessoas seria Tapp.

O rapaz foi interrogado pela polícia durante várias horas até, finalmente, confessar o seu envolvimento na violação e no assassínio. Mais tarde, quando foram divulgadas as cassetes do interrogatório, surgiram muitas dúvidas, uma vez que parecia que Tapp tinha sido forçado a confessar o crime.

Christopher Tapp foi condenado em 1998, por um júri de Bonneville County, a 30 anos de prisão. Ele recorreu da sentença mas em julho de 2001 o Supremo Tribunal confirmou a condenação. Entre 2002 e 2015, Tapp também fez vários pedidos de reavaliação de pena ao tribunal, mas os pedidos foram recusados. Exceto um.

Em março de 2017, Christopher Tapp foi libertado após 20 anos de prisão. O seu advogado, John Thomas, chegou a acordo com o Procurador Público, Daniel Clark, estabelecendo que a condenação de assassínio em primeiro grau iria manter-se no cadastro de Tapp, mas a condenação por violação seria retirada. Tapp também abdicou do direito a recurso.

"Estou satisfeito", disse, no dia em que saiu da prisão. "É diferente não ter algemas. Quero provar a todos que posso ser alguém e fazer alguma coisa certa."

A mãe nunca desistiu

Ao longo dos últimos 23 anos, Carol Dodge, mãe de Angie, nunca deixou de lutar pela sua filha. Se aquele não tinha sido o único homem envolvido no crime, ela estava decidida a encontrar os outros culpados. Acompanhou todas as investigações e fez a sua própria investigação, contratando especialistas e fazendo o possível para que o caso de Angie não fosse esquecido.

Há poucos meses, Carol Dodge contou a um jornal local que todos os dias fazia meditação e expressava vocalmente as suas frustrações sobre o assassínio da filha.

Muito devido à pressão da mãe, a polícia continuou à procura do criminoso cujo ADN foi encontrado no local do crime, por vezes pedindo ajuda ao FBI e a outros especialistas. Em 2016 e 2017, graças a novas técnicas de análise de ADN, foi possível identificar várias características dos suspeitos - cor do cabelo, cor da pele, cor dos olhos, sardas, etc. A partir desses dados foi feito um retrato de como poderia ser esse homem em 1996, com 25 anos.

Em novembro de 2018, a polícia de Idaho entrou em contacto com a Parabon, uma empresa que usa a mais recente tecnologia na análise de ADN. A amostra já estava muito degradada e, em condições normais, os especialistas não teriam aceitado o caso. Mais uma vez, a mãe de Angie Dodge decidiu intervir e pediu para que, ao menos, tentassem.

O verdadeiro culpado

CeCe Moore, da Parabon, liderou esta investigação através da qual foi identificado um grupo de seis pessoas que embora não correspondessem ao ADN recolhido no local do crime poderiam estar, ainda que de forma distante, geneticamente relacionadas à pessoa em causa. Foi necessária uma longa (e revolucionária) investigação da árvore genealógica e das relações familiares destas pessoas para chegar a um homem, que poderia ser o criminoso: Brian Dripps, que teria morado numa rua ao lado da de Angie Dodge entre abril e agosto de 1996.

Em maio deste ano, Dripps foi localizado e a polícia começou a vigiá-lo. Foram necessárias apenas 20 horas para que obtivessem uma beata que o homem deitou fora pela janela do carro. A análise a esta amostra de ADN revelou-se totalmente compatível com as amostras de sémen e cabelos recolhidos no local do crime.

A 15 de maio, Brian Leigh Dripps, de 53 anos, foi detido e, apesar de inicialmente negar o seu envolvimento nos crimes, acabou por confessar ter cometido a violação e o assassínio em 1996. E também confessou ter agido sozinho. "Ele disse que pretendia apenas violá-la, não tencionava matá-la", lê-se na acusação. "Confirmou que entrou no apartamento de Dodge sozinho e com uma faca com a intenção de violá-la, o que de facto fez, e que tinha colocado uma faca na sua garganta durante o ato, acabando por cortá-la."

Dripps encontra-se detido na prisão de Bonneville County e irá ser ouvido em tribunal a 2 de agosto.

Finalmente, inocente

A 11 de junho, o procurador público de Bonneville pediu a exoneração de Christopher Tapp. "Existem provas claras e convincentes de que ele não cometeu o crime", escreveu Daniel Clark no requerimento. "Portanto, o Estado pede ao tribunal que anule o veredicto, altere a sentença e arquive o caso." O advogado de Tapp, John Thomas, também fez um sexto apelo ao tribunal, "baseado em novas provas de que Christopher Tapp é na verdade inocente".

Aos 43 anos, John Tapp foi pela última vez a tribunal na passada quarta-feira para ser, finalmente, declarado inocente de todas as acusações.

Ao longo do último ano a "genealogia genética" já ajudou a resolver cerca de 70 casos nos Estados Unidos, usando ADN encontrado nos lugares do crime e comparando-o com o ADN em diversas bases de dados e bases genealógicas para encontrar familiares dos alegados criminosos. Neste caso, além de permitir encontrar o culpado, foi também possível provar a inocência de outra pessoa.

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt