Compromisso de Malthouse. Junta defensores e críticos do Brexit, mas será a solução?

Os deputados britânicos votam esta tarde, às 19.00, uma saída sem acordo do Reino Unido da União Europeia, mas há uma emenda que poderá alterar o debate - a emenda F que foi escolhida por Bercow.
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Como prometido, a primeira-ministra britânica, Theresa May, leva esta quarta-feira a debate na Câmara dos Comuns a ideia de um Brexit sem acordo, lembrando contudo que essa poderá ser a saída caso os deputados e a União Europeia não cheguem a um acordo. Mas há uma emenda que pode alterar o debate, que é conhecida como o compromisso de Malthouse.

A primeira-ministra "pede que esta câmara rejeite aprovar uma saída da União Europeia sem um Acordo de Saída e sem as Bases para a Futura Relação a 29 de março de 2019; e nota que sair sem um acordo continua a ser o padrão no Reino Unido e na União Europeia, a menos que esta câmara e a União Europeia ratifiquem um acordo", lê-se no texto que May quer que seja aprovado.

Mas entre as várias emendas ao texto há a do chamado Compromisso de Malthouse. E Bercow escolheu-a. Uma solução que foi negociada entre defensores e críticos do Brexit dentro do Partido Conservador de May e que leva o nome do secretário de Estado para a Habitação, Kit Malthouse, que conseguiu que ambos os lados se sentassem à mesma mesa.

O que diz a emenda f?

A emenda f, que na prática é o chamado plano B do compromisso de Malthouse, incluída na ordem do dia do Parlamento britânico é apresentada por membros do eurocético European Research Group de Jacob Rees-Mogg e Steve Baker, defensores do Brexit, e por antigos membros do governo que queriam a permanência do Reino Unido na União Europeia, com os ex-ministros Damian Green e Nicky Morgan.

O texto propõe quatro pontos. O primeiro é que o governo deve publicar a projeção de tarifas para as importações no caso de um Brexit sem acordo (algo que o governo fez esta manhã). O segundo é que, de forma a permitir que as empresas se preparem para essas tarifas, que o governo peça a extensão do artigo 50 até às 22.59 de 22 de maio de 2019, data em que o Reino Unido sairia então da União Europeia. Recorde-se que atual data é a de 29 de março. Theresa May avisou esta manhã os deputados que terão possibilidade de votar a extensão do artigo numa nova votação, na quinta-feira, caso a saída sem acordo seja rejeitada esta quarta-feira.

O terceiro ponto diz que, "depois disso, num espírito de cooperação e para iniciar discussões sobre o Relacionamento Futuro, o Governo deve oferecer mais um conjunto de acordos mútuos com a União Europeia e os Estados membros durante um período acordado que termina a 30 de dezembro de 2021, período durante o qual o Reino Unido pagaria a soma acordada equivalente às suas contribuições líquidas para a UE e satisfaria as suas outras obrigações de direito internacional".

Na prática, a ideia é um período de transição mais alargado do que o atualmente previsto, durante o qual os britânicos pagariam a "conta do divórcio" de 39 mil milhões de libras. Estariam em vigor as regras de um acordo de livre comércio sem tarifas.

O quarto ponto diz que o governo deve garantir unilateralmente os direitos dos cidadãos europeus residentes no Reino Unido, algo que a primeira-ministra já disse que já fez -- da mesma forma que muitos países europeus, como Portugal, já aceitaram manter os direitos dos cidadãos britânicos que vivem no país, mesmo no caso de um Brexit sem acordo.

O plano B do compromisso de Malthouse não faz referência ao polémico backstop, o mecanismo de salvaguarda para evitar uma fronteira física entre Irlanda do Norte e República da Irlanda. Essa referência existia contudo no plano A, que basicamente era semelhante ao atual Acordo de Saída, mas alargava o período de transição e defendia mudanças ao backstop -- passaria por concordar com um acordo de comércio livre básico com a União Europeia, que não requeria nova tecnologia e se baseia em processos administrativos existentes (como na Suíça). A ideia seria apresentar o plano A à União Europeia e caso esta recusasse, avançar com o plano B.

Que apoios tem esta emenda?

Os defensores do compromisso de Malthouse acreditam que esta emenda teria a capacidade de atrair o voto de muitos conservadores -- a primeira-ministra deu liberdade de voto aos conservadores, incluindo os membros do governo, diante da ameaça de demissões em massa caso desse ordens para recuarem esta ideia.

Os aliados unionistas do DUP (que garantem a maioria ao governo de May) já tinham dado o seu apoio a esta proposta, podendo ainda haver vários deputados trabalhistas que votariam a favor, para garantir que cumpriam com o resultado do referendo nos seus círculos eleitorais.

O problema é que do lado europeu, os líderes já repetiram em várias ocasiões que não estão preparados para renegociar o acordo de saída, do qual o backstop faz parte. O principal negociador europeu do Brexit, Michel Barnier, deixou o aviso na terça-feira, durante o debate sobre o acordo de May, dizendo que havia "a perigosa ilusão" que o Reino Unido poderia beneficiar de um período de transição sem um acordo de saída. "A única base legal para a transição é o acordo de saída. Não haver acordo significa não haver transição", referiu.

Há mais emendas a debate?

O presidente da Câmara dos Comuns, John Bercow, anunciou antes do debate as emendas que serão debatidas -- no total havia oito e ele escolheu duas.

Além da emenda sobre o compromisso de Malthouse, Bercow escolheu a emenda a. Apresentada por Caroline Spelman, esta defendeu que o Reino Unido não pode sair da União Europeia sem um Acordo de Saída e sem um plano para a Futura Relação. Uma emenda igual foi aprovada em finais de janeiro por uma maioria de oito votos.

Havia emendas que defendiam a extensão do artigo 50 para permitir um segundo referendo sobre o Brexit, as que defendiam cancelar a saída do Reino Unido da União Europeia e até as que defendiam que a ideia de uma saída sem acordo deve continuar em cima da mesa, enquanto o governo volta a negociar com a União Europeia.

Apesar de poderem ser aprovadas, as emendas não são vinculativas para o governo britânico. Contudo, Theresa May não poderá ignorar caso uma delas consiga uma maioria de votos no Parlamento, especialmente porque tem sofrido pesadas derrotas com o seu acordo de Brexit -- por 230 votos em janeiro e por 149 na terça-feira.

(Notícia atualizada às 15:09 após Bercow anunciar que emendas serão discutidas esta tarde)

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