Quatro emendas sobre o Brexit vão a votação hoje na câmara dos Comuns
Hoje é mais um dia de maratona de debates e votações sobre o Brexit no Parlamento do Reino Unido. O speaker da câmara dos Comuns, John Bercow, aceitou a votação cinco emendas relacionadas com o processo de saída da UE. Uma já foi entretanto retirada e, por isso, só quatro serão votadas pelos deputados britânicos a partir das 19.00.
A primeira emenda, a do Labour, vai no sentido de requerer ao governo de Theresa May que negoceie alterações à declaração política que estejam em linha com as cinco exigências contidas na carta que o líder da oposição trabalhista Jeremy Corbyn enviou recentemente à primeira-ministra do Partido Conservador. Esta emenda trabalhista não fala, porém, na ideia de um segundo referendo.
Paul Waugh, editor executivo para a área da Política do HuffingtonPost.Uk, escreveu no Twitter que o Labour está a medir mais as palavras agora no que toca à ideia de uma segunda consulta popular sobre o Brexit. E cita o porta-voz de Corbyn: "Nós apoiaremos um voto do público para prevenir um Brexit dos Tories que seja nocivo ou uma saída sem acordo. Mas claro que continuaremos a apoiar outras opções para impedir outros desfechos, tais como um plano alternativo para uma parceria económica e, claro, eleições legislativas antecipadas".
Na segunda-feira, recorde-se, Corbyn declarou numa reunião do grupo parlamentar trabalhista: "Estamos comprometidos em também apresentar ou apoiar uma emenda a favor de um voto popular para impedir que um Brexit conservador prejudicial seja imposto no país". O líder do Labour sempre resistira a apoiar publicamente a ideia de um segundo referendo. Mas teve que fazê-lo sob pena de ver mais deputados saírem do partido, depois de nove terem abandonado o Labour na semana passada para cofundarem O Grupo Independente em Westminster.
A segunda emenda aceite por Bercow é a do Partido Nacionalista Escocês (SNP). Esta diz simplesmente que o Reino Unido não deve sair da UE sem um acordo em nenhuma circunstância. Se, a nível nacional, o resultado do referendo de 23 de junho de 2016 sobre o Brexit foi de 52% a favor da saída e de 48% contra, na Irlanda do Norte e na Escócia a maioria dos eleitores votou a favor da permanência do Reino Unido na UE. Inglaterra e País de Gales votaram contra. O SNP já ameaçou em diversas ocasiões que, em caso de Brexit, sobretudo de No Deal Brexit, a Escócia poderia reavivar a ideia de repetir o seu próprio referendo sobre a independência da Escócia do Reino Unido.
A terceira emenda, entretanto retirada, era a da deputada Caroline Spelman, do Partido Conservador, com o apoio de Jack Dromey, do Labour. Defendia a criação de tempo, na sessão de amanhã na câmara dos Comuns, para debater a proposta de lei de Yvette Cooper no sentido de os Comuns poderem legislar para impedir um No Deal Brexit. Em várias ocasiões, a UE já avisou que o Reino Unido, se não tiver um acordo aprovado no Parlamento, sairá sem acordo a 29 de março. Mesmo que vote contra isso. Sairá da UE a 29 de março em modo No Deal Brexit. O único mecanismo que poderia usar seria o de retirar, unilateralmente, o artigo 50.º do Tratado de Lisboa. Segundo o Tribunal de Justiça da UE pode fazê-lo.
A quarta emenda é a apresentada pelo deputado conservador Alberto Costa. Esta vai no sentido de garantir os direitos dos cidadãos comunitários que vivem no Reino Unido e dos cidadãos britânicos que vivem em países da UE27 em caso de No Deal Brexit. Theresa May já garantiu que esses direitos iriam ser respeitados. Os governos dos restantes Estados da UE também desenvolveram os seu planos de contingência a confiar nisso e a acreditar no princípio da reciprocidade. Mas a verdade é que, factualmente falando, não há nada escrito, com valor jurídico, que obrigue o Reino Unido a respeitar os direitos adquiridos dos cidadãos europeus que vivem no seu território se sair da UE sem um acordo com essa mesma UE.
Alberto Costa, que foi entretanto demitido de um cargo no governo, era secretário parlamentar do ministro para a Escócia. Isto depois de o ministro do Interior, Sajid Javid, ter dito numa comissão parlamentar que não havia "nada de errado" com a emenda apresentada por ele e que o governo conservador a iria apoiar. A emenda de Costa diz: "Requer-se à primeira-ministra que procure, o mais rapidamente possível, um compromisso conjunto do Reino Unido e da UE no sentido de adotar a parte 2 do acordo de retirada sobre os direitos dos cidadãos qualquer que seja o desfecho das negociações sobre outros aspetos que constam no acordo de retirada" do Reino Unido da UE.
Segundo um porta-voz de Downing Street, citado pelo Guardian, Costa demitiu-se do governo. "Como sabem não se pode ser membro do governo e apresentar emendas a legislação do governo. Claramente este é um tema em relação ao qual ele está muito empenhado e por isso escolheu demitir-se". Durante a tarde, o secretário de Estado David Lidington, anunciou que o governo irá apoiar a emenda de Costa, depois de May ter dado a entender, na véspera, que tal não aconteceria.
A quinta emenda é a da deputada trabalhista Yvette Cooper. Esta cita os compromissos feitos na terça-feira por Theresa May em relação à possibilidade de os deputados britânicos poderem votar numa extensão do artigo 50º a 14 de março caso não haja acordo sobre o acordo e depois de os deputados terem votado sobre o No Deal.
Fazendo algumas concessões à ala mais moderada do Partido Conservador, sob pena de sofrer novas fugas de deputados, como as que aconteceram na semana passada quando três eleitas desertaram para O Grupo Independente, May comprometeu-se a regressar à câmara dos Comuns com um acordo do Brexit revisto até 12 de março. Nomeadamente no que toca à questão do backstop, ou seja, mecanismo de salvaguarda destinado a evitar o regresso de uma fronteira física entre a Irlanda do Norte e a República da Irlanda.
Caso este não seja aprovado, no dia 13 os deputados votam sobre um No Deal Brexit. Se esta hipótese também for derrotada, no dia seguinte, dia 14, será aprovada uma moção no sentido de perguntar se os deputados querem uma extensão do artigo 50.º Se estes votarem sim, May voltará à UE27 para pedir a extensão, in extremis.
"Se o governo não conseguir o apoio para o seu plano no próximo dia 12 de março, apresentaremos no dia seguinte uma nova moção perguntando aos deputados se estão dispostos a sair da UE sem um acordo. Se recusarem esta possibilidade, apresentaremos no dia 14 uma nova moção a perguntar à Câmara se devemos solicitar uma extensão breve e limitada do artigo 50.º", declarou Theresa May, na esperança de, com esta promessa, evitar mais demissões no seu governo.
Entretanto, os líderes da UE27 começaram a reagir à ideia de uma extensão do artigo 50.º O primeiro-ministro de Portugal foi dos primeiros. Na segunda-feira, em Sharm el-Sheikh, no Egito, à margem da cimeira UE-Liga Árabe, António Costa mostrou-se favorável a uma extensão do artigo 50.º por considerar que um No Deal é o pior dos cenários. No mesmo sentido falou esta quarta-feira a chanceler alemã, Angela Merkel, dizendo que o seu governo não se oporá a uma extensão. Já o presidente de França, Emmanuel Macron, manteve o seu tom de intransigência. "Concordaríamos com uma extensão do artigo 50.º apenas se ela for justificada por uma nova escolha dos britânicos. E não, de forma alguma, uma extensão sem ter um objetivo claro". Uma extensão ao artigo 50º terá que ser aprovada por unanimidade pela UE27.