Hariri regressa, suspende demissão e apela ao diálogo
Primeiro-ministro pediu "distanciamento" em relação a conflitos regionais. Em Sochi, Putin, Erdogan e Rouhani lançam "congresso nacional" para resolver guerra na Síria.
Trocado o fato e gravata por um blusão azul, cor do seu partido, Corrente do Futuro, Saad Hariri prometeu "Vou ficar com vocês" aos apoiantes que se reuniram no centro de Beirute para saudar o regresso do primeiro-ministro. No dia 4, foi da Arábia Saudita que Hariri anunciou a demissão da chefia do governo, denunciando o controlo do Hezbollah - seu parceiro de governo - e do seu aliado, o Irão, sobre a política libanesa e afirmando temer pela vida. Agora suspendeu a decisão.
"Discuti a minha demissão com o presidente que me pediu para esperar antes de a apresentar, permitindo mais consultas. Aceitei", explicou Hariri, cuja permanência em Riade levantou suspeitas de que estaria refém dos sauditas, seus protetores tradicionais. O primeiro-ministro negou as acusações. Ontem, diante da multidão que gritava "pela nossa alma, pelo nosso sangue, sacrificamo-nos por ti, Saad", Hariri apelou ao diálogo num país minado pelas crises políticas opondo os dois principais blocos - o do primeiro-ministro e o liderado pelo Hezbollah. O líder do grupo xiita libanês, Hassan Nasrallah, já se disse "aberto ao diálogo".
Aos 47 anos, Hariri seguiu as pisadas políticas do pai, Rafic, assassinado em 2005. No dia 18, após 14 dias em Riade, seguiu para França a convite do presidente Emmanuel Macron, abrindo caminho ao regresso ao Líbano. O primeiro-ministro, cuja demissão fora rejeitada pelo presidente Michel Aoun, pediu ainda respeito por "uma política de distanciamento" em relação aos conflitos regionais, uma alusão à Síria, onde o Hezbollah está ativo.
Congresso da oposição síria
A crise síria esteve ontem em debate em Sochi, na Rússia, onde o presidente Vladimir Putin recebeu os homólogos turco, Recep Erdogan, e iraniano, Hassan Rouhani. Os três acordaram a realização de um congresso que deve reunir regime e oposição sírios na estância russa no Mar Negro. "Os presidentes do Irão e da Turquia apoiaram a iniciativa de um congresso nacional sírio em Sochi", afirmou Putin após um encontro com Rouhani e Erdogan. Para o líder russo, este congresso, cuja data não foi revelada, deve "estimular" a resolução do conflito no quadro do processo de paz organizado em Genebra, sob a égide das Nações Unidas.
A guerra na Síria arrasta-se desde 2011 e já fez mais de 330 mil mortos e 11 milhões de deslocados, tendo começado como revolta popular contra o regime de Bashar al-Assad, mas tornando-se num conflito de todos contra todos, onde Irão e Arábia Saudita, as duas potências regionais medem forças por interpostas pessoas. Com Turquia, Rússia e EUA a também se envolverem, apoiando um ou outro lado.
Até agora, todos os esforços para encontrar uma solução diplomática para o conflito na Síria terminaram num impasse, com a oposição a exigir a saída de Assad do poder, o governo a insistir que o presidente tem de ficar e ambos os lados incapazes de impor a sua vontade pela força das armas.
Na abertura do encontro ontem, Putin, que na véspera recebera Assad, afirmou haver "uma verdadeira oportunidade" para acabar com a guerra. Desde que a Rússia se envolveu no conflito, em 2014, a balança pendeu para o lado do governo, com o exército a expulsar os últimos rebeldes de Aleppo há um ano. Nas últimas semanas, o Estado Islâmico (ou ISIS) perdeu os últimos territórios, vendo chegar ao fim o seu sonho de um califado na Síria e Iraque. As forças do governo controlam a gora a quase totalidade do território sírio, com exceção de algumas bolsas rebeldes e de uma faixa controlada pelos curdos, apoiados pelos americanos.