Hamilton, admirado como abolicionista, seria afinal dono de escravos
Alexander Hamilton, um do Pais Fundadores dos EUA que é admirado como um abolicionista no musical de sucesso na Broadway com o seu nome, era afinal dono de escravos.
A conclusão é de um estudo, que foi escrito no ano passado mas só agora publicado online, da historiadora Jessie Serfilippi, da mansão histórica dos Schuyler, em Albany, Nova Iorque. Os Schuyler eram os sogros de Hamilton.
No trabalho "Uma coisa odiosa e imoral: A história escondida de Alexander Hamilton como um dono de escravos", Serfilippi escreveu que "há pouco espaço no discurso moderno para questionar os pensamentos e sentimentos do fundador sobre a escravatura".
Contudo, indica, "não só Alexander Hamilton escravizou pessoas, mas o seu envolvimento na instituição da escravatura foi essencial para a sua identidade, tanto pessoal como profissionalmente".
O facto de Hamilton ter trabalhado como intermediário na compra e venda de escravos para membros da família e amigos já era sabido pelos historiadores. Mas se ele pessoalmente tinha escravos tem sido um tema em debate entre os especialistas.
Serfilippi estudou os "livros de caixa" de Hamilton, os seus registos pessoais, junto com cartas e outros documentos. "Estes tornam evidente que a escravatura de homens, mulheres e crianças de ascendência africana era parte da vida pessoal assim como profissional de Hamilton", escreveu. "Fontes primárias provam que Hamilton comprou escravos para si próprio", indicou.
Ela explica que eles surgem nos registos como "criados", mas eram na realidade escravos.
"É vital que o mito de Hamilton como 'o Pai Fundador abolicionista' acabe", escreve a historiadora. "Estes documentos tornam claro que Alexander Hamilton era dono de escravos."
Ron Chernow, cuja biografia de Hamilton publicada em 2004 o descreve como um "abolicionista intransigente" (e que serviu de inspiração para o musical de sucesso de Lin-Manuel Miranda), disse ao The New York Times que o estudo de Serfilippo era um "trabalho de investigação fantástico que alarga a nossa perceção do envolvimento de Hamilton com a escravatura em vários aspetos".
Mas discordou de várias conclusões, nomeadamente na alegação de que a escravatura era "essencial para a identidade" de Hamilton. Elogiando o "escrutínio duro" da autora, Chernow disse que ela omite "todas as informações que iriam contra as suas conclusões".
No seu estudo, Serfilippi admite que "ocasionalmente, Hamilton expressou simpatias abolicionistas". Contudo, acrescenta a historiadora, "algumas das ideias que escreveu e que se acredita expressarem simpatias abolicionistas ou a evolução de tais sentimentos, estão mais na linha da sua política do que da sua moral".
E conclui: "A verdade que se revela nos livros de caixa e nas cartas de Hamilton deve ser reconhecida de forma a honrar as pessoas que ele escravizou."
Hamilton, que foi ajudante do general George Washington durante a Revolução Americana e acabou por se tornar no primeiro secretário do Tesouro dos EUA (o seu rosto figura atualmente na nota de dez dólares), foi morto num duelo com Aaron Burr, em 1804.