Governo austríaco fica nas mãos da extrema-direita
FPÖ vai gerir Administração Interna, Defesa e Negócios Estrangeiros, mas abdica de referendo sobre permanência na UE.
Três pastas de primeira importância nas mãos do Partido da Liberdade (FPÖ, em alemão), o mais jovem governante do mundo na figura do chanceler Sebastian Kurz, do Partido Popular (ÖVP), e o compromisso de ambos os parceiros da coligação, ontem formalizada em Viena, de que a Áustria permanecerá fiel aos seus compromissos europeus, são os principais elementos a reter no regresso da extrema-direita ao poder neste país.
O FPÖ, liderado por Heinz--Christian Strache, obtém as pastas da Defesa, Negócios Estrangeiros e Administração Interna, o que lhe dá margem de manobra nestas áreas, mas teve de ceder num ponto em que o conservador Kurz não abdicou, como o dirigente da extrema-direita reconheceu na conferência de imprensa conjunta em que o acordo foi anunciado: a Europa.
Para um politólogo austríaco, Anton Polinka, citado pela AFP, "o ÖVP impôs-se nas questões mais importantes, a começar pela política europeia". Esta matéria estará sob supervisão direta do novo chanceler, dado especialmente relevante já que a Áustria estará na presidência rotativa da UE na segunda metade de 2018.
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Antes da concretização do acordo, Kurz, de 31 anos, tentou neutralizar os receios sobre uma presença da extrema-direita no governo, garantindo que esta assumira "um posicionamento pró-europeu". O novo governo toma posse amanhã perante o presidente Alexander van der Bellen, que ganhou as eleições de dezembro de 2016 derrotando um candidato do FPÖ, por 53,8% contra 46,2%.
Segundo o novo chanceler, o seu partido e o FPÖ estão de acordo na concretização "de uma cooperação europeia mais aprofundada nas áreas em que isso se justifica, como a justiça, a defesa das fronteiras", mas também "maiores competências deixadas aos Estados, sempre que tal seja possível", disse Kurz, de 31 anos.
Por seu lado, Strache renuncia à realização de um referendo sobre a saída austríaca da União Europeia (UE). "Estamos com a UE, apoiamos o projeto de paz na Europa, nem por isso deixa de haver questões que vemos de forma crítica", disse o líder do FPÖ, partido que ficou em terceiro lugar nas legislativas de outubro, com 26%, ficando pouco atrás dos sociais-democratas do SPÖ, no poder desde 2006, em coligação com o ÖVP.
Mas não deixa de ser evidente que a extrema-direita austríaca tem hoje mais influência no governo de Viena do que na sua primeira passagem pelo poder, entre 1999 e 2005. Nas legislativas de 1999, o partido ficou em primeiro lugar, com ligeira vantagem sobre o ÖVP, mas dos ministérios mais relevantes, além do cargo de vice-chanceler, ficou apenas com a Defesa. A passagem do FPÖ pelo governo levou então os restantes membros da UE à imposição de sanções diplomáticas. Um cenário que não se deve repetir na atualidade, notavam ontem alguns comentários, argumentando que, perante o peso das forças populistas no quadro político europeu, a opção de sanções poderia revelar-se contraproducente, reforçando os extremistas.
No total, o FPÖ e o ÖVP têm seis ministérios cada, com a Economia, as Finanças e a Justiça a ficarem com o segundo.
Figuras como Marine Le Pen, da Frente Nacional francesa, ou Geert Wilders, do Partido da Liberdade da Holanda, aplaudiram o acordo, com a primeira a declarar estar-se "perante uma muito boa notícia para a Europa".