Zuckerberg no Parlamento Europeu: "Foi um erro, peço desculpa"
Mark Zuckerberg está esta tarde no Parlamento Europeu, em Bruxelas, a dar explicações sobre o uso indevido dos dados de 87 milhões de utilizadores do Facebook, por parte da Cambridge Analytica, 2,7 milhões dos quais de cidadãos europeus (63 080 deles portugueses).
"É bom estar de volta à Europa", começou por dizer, agradecendo o convite dos eurodeputados. E sublinhou os aspetos positivos do Facebook, como "o facto de milhares de pessoas terem podido marcar-se como seguras nos ataques terroristas de Berlim, Paris, Londres e Bruxelas, de os refugiados o usarem para contactar com as famílias, de 18 milhões de pequenas e médias empresas usarem o Facebook e poderem, por isso, contratar mais pessoas".
Mea culpa em Bruxelas
Fazendo um mea culpa, Zuckerberg, de 34 anos, admitiu: "Também se tornou evidente que nos últimos anos não fizemos o suficiente para evitar que as ferramentas que construímos fossem usadas de forma errada. Quer seja no caso das fake news, interferência estrangeira em eleições ou o uso indevido dos dados pessoais de cada um, não tivemos uma visão suficientemente abrangente da nossa responsabilidade. Isso foi um erro, peço desculpa".
Prosseguindo, referindo-se a escrutínios como as eleições para o Parlamento Europeu de 2019, o fundador do Facebook declarou: "Nos próximos 18 meses há eleições muito importantes... Em 2016 fomos muitos lentos em identificar a interferência russa nas eleições dos EUA. Desde então fizemos muito investimento para tornar este tipo de ataques a eleições, através do Facebook, mais difíceis. Trabalhamos com outras empresas para conseguir prevenir ameaças em tempo real". E deu como exemplo a cooperação já realizada no passado entre o Facebook e o governo da Alemanha.
No período de perguntas dos presidentes dos grupos políticos, oito ao todo, o líder dos liberais do ALDE, Guy Verhofstadt, umas das vozes que mais exigiram que a sessão desta tarde fosse pública, desafiou Zuckerberg a cooperar com as autoridades da concorrência europeias "para ver se existe ou não um monopólio".
Verhofstadt perguntou se Zuckerberg não acha que Facebook, WhatsApp e Instagram devem existir separados. "Eu acho, realmente, que temos aqui um grande problema que não vai ser resolvido por dizerem apenas que vocês vão resolvê-lo por vocês mesmos".
"Já pediu desculpas aí umas 15 ou 16 vezes"
Sublinhando que, nos últimos anos, Zuckerberg "já pediu desculpas aí umas 15 ou 16 vezes", Verhofstadt questionou o norte-americano se "o Facebook vai compensar os utilizadores do Facebook e que quantia lhes daria?"
"Pedir desculpas é bom, é necessário, mas sabe perfeitamente que não é suficiente", declarou, por sua vez, o líder do Partido Popular Europeu, Manfred Weber.
Nigel Farage, líder eurocético, britânico, defensor máximo do brexit, começou por dizer a Zuckerberg: "Eu sou o maior utilizador de Facebook em todas as instituições europeias. Sou o seu melhor cliente". Denunciando, por outro lado, censura, Farage questionou: "Admite que o Facebook, hoje em dia, é uma plataforma que não permite todas as ideias, de forma imparcial? A caça às fake news está muito na moda, mas isso não se tornou uma desculpa para tais restrições à liberdade de opinião e de expressão?"
Agradecendo as perguntas colocadas pelos representantes dos cidadãos europeus, Zuckerberg disse que os discursos relacionados com bullying, ódio, terrorismo não têm lugar nas suas plataformas. "Nunca seremos perfeitos nisto. Muitas das pessoas que tentam interferir em eleições, por exemplo, têm acesso às mesmas ferramentas tecnológicas do que nós".
Parceiros de fact checking em todos os países
No que toca ao tema das fake news, disse, "não as queremos". E categorizou-as: "spam meramente motivado por razões económicas, contas falsas de Facebook que tentamos identificar em poucos minutos depois de terem sido criadas, a partilha de informações falsas feitas pelas próprias pessoas. Nós, o Facebook, não queremos estar na posição de termos que ser nós a dizer que informação é falsa ou não. Daí a necessidade de uma terceira parte, parceiros que façam um trabalho de fact checking em vários países e em várias línguas".
"Mais ferramentas para uma melhor transparência que pensamos poderem ser implementadas em todo o mundo este verão", prometeu Zuckerberg, referindo também a hipótese de se poder apagar todas as pesquisas no futuro. Passando para a questão da regulação, disse: "A questão não é a necessidade de regulação. A questão é que tipo de regulação estamos a falar. Temos que ver que não é por exemplo uma regulação que ponha em causa o desenvolvimento de mais ferramentas de Inteligência Artificial ou que impeça o desenvolvimento de ideias como eu, enquanto estudante universitário, fiz". Em seguida, admitiu que, sim, claramente, o mercado do Facebook é o da publicidade. "O Facebook sempre pagou todos os impostos exigidos por lei em todos os países", garantiu.
A reunião acontece a quatro dias da entrada em vigor no espaço da UE do Regulamento Geral sobre a Proteção dos Dados Pessoais. Este vai alterar a forma como as empresas, online e offline, gerem e armazenam os dados dos utilizadores. Todas as entidades corporativas, Facebook incluído, vão ter de se adaptar à nova legislação. "Vamos cumprir" com as novas regras da UE, garantiu Zuckerberg.
"Já estamos a ultrapassar o tempo"
Sobre se o Cambridge Analytica é ou não a ponta do Iceberg, Zuckerberg sublinhou que, hoje em dia, depois das alterações feitas em 2014, que entraram em vigor em 2015, os acessos indevidos a dados pessoais seriam impossíveis. "Vamos ficar em contacto para que as vossas perguntas tenham todas as respostas. Já estamos a ultrapassar o tempo, para além do que foi estabelecido", disse o fundador do Facebook, dando a sessão por encerrada.
Alguns eurodeputados reclamaram que as suas questões, bastante concretas, não tinham sido respondidas e voltaram a lamentar o formato encontrado. O presidente do Parlamento Europeu, Antonio Tajani, sugeriu em seguida que todos os líderes dos grupos políticos enviem as suas perguntas por escrito e que elas sejam respondidas por Zuckerberg. Verhofstadt, liderando mais uma vez as vozes de protesto, responsabilizou então Tajani, dizendo-lhe que iria ele recolher as perguntas e assegurar que as respostas, dadas por escrito, chegariam a quem as fez.
Parlamento Europeu versus Congresso dos EUA
Ao contrário do que aconteceu em abril no Congresso dos EUA, o fundador do Facebook não foi ouvido no plenário do Parlamento Europeu, mas à porta fechada pelos líderes dos grupos políticos europeus e pelo presidente e pelo relator da Comissão para as Liberdades Cívicas, Justiça e Assuntos Internos (LIBE).
Após muita polémica, a reunião dos eurodeputados com o fundador do Facebook foi transmitida pela internet. Mas durou menos de duas horas, enquanto que a comparência de Zuckerberg no Congresso dos EUA durou 10 horas, divididas por dois dias.
A seguir ao encontro com os líderes dos grupos políticos e os representantes da comissão LIBE, houve uma conferência de imprensa do presidente do Parlamento Europeu Antonio Tajani.