EUA acusam Maduro de "narcoterrorismo" e oferecem 15 milhões pela sua captura
O Departamento de Justiça norte-americano acusou o presidente venezuelano, Nicolás Maduro, de "narcoterrorismo", alegando que ele conspirou com a guerrilha colombiana das FARC nos últimos 20 anos para "inundar os EUA com cocaína" para "minar a saúde e o bem-estar" deste país. O Departamento de Estado anunciou entretanto uma recompensa de 15 milhões de dólares por qualquer informação que permita a sua detenção.
Maduro é acusado de ser um dos líderes do cartel Los Soles e converter o Estado venezuelano numa empresa criminosa ao serviço dos traficantes de droga e dos grupos terroristas. "Estimamos que entre 200 e 250 toneladas de cocaína tenham sido enviadas da Venezuela por estas rotas. Essas 250 toneladas equivalem a 30 milhões de doses letais", segundo a Justiça norte-americana.
"O alcance e a magnitude do narcotráfico só foram possíveis porque Maduro e outros corromperam as instituições da Venezuela e forneceram proteção política e militar para os desenfreados crimes de narcoterrorismo", acrescentam, alegando que "os acusados traíram o povo venezuelano e corromperam as instituições venezuelanas para encher os bolsos com o dinheiro da droga".
O anúncio foi feito durante uma conferência de imprensa do procurador-geral, William Barr, tendo sido antecipado uns momentos antes pelo senador Marco Rubio, no Twitter. "Hoje, Nicolás Maduro será indiciado pelo Departamento de Justiça e acusado de narcoterrorismo", escreveu o senador republicano da Florida.
Além de Maduro, que arrisca prisão perpétua, há mais 14 pessoas na lista de acusados do Departamento de Justiça. Entre eles o presidente da Assembleia Nacional Constituinte da Venezuela e número dois do regime, Diosdado Cabello, e o ministro da Indústria e vice-presidente para a área económica, Tareck El Aissami. Dois ex-militares estão também acusados: Hugo Carvajal Barrios, ex-diretor da secreta militar (que chegou a ser preso em Espanha mas se encontra em parte incerta após a justiça ter dado luz verde para a extradição para os EUA), e Clíver Alcalá Cordones, um general na reforma.
O Departamento de Estado oferece uma recompensa de 15 milhões de dólares por informações para a captura de Maduro, assim como uma recompensa de até dez milhões por informações sobre cada um destes quatro militares ou políticos.
Da acusação do Departamento de Justiça fazem ainda parte o presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Maikel Moreno; o ministro da Defesa, Vladimir Padrino López; o ministro do Interior, Justiça e Paz, Néstor Reverol, o ex-ministro da Energia Elétrica, Luis Motta Domínguez, e o antigo vice, Nervis Villalobos. Acusam-se ainda dois ex-líderes da guerrilha das FARC, Iván Márquez e Jesús Santrich.
"O povo venezuelano merece um governo transparente, responsável e representativo que atenda às necessidades do povo - e que não trai a confiança do povo, desculpando ou empregando funcionários públicos envolvidos no tráfico ilícito de estupefacientes", segundo a nota assinada pelo secretário de Estado, Mike Pompeo. "Os EUA estão empenhados em ajudar o povo venezuelano a restaurar a sua democracia através de eleições presidenciais livres e justas que lhes proporcionarão um liderança nacional honesta e competente", acrescenta.
Os EUA, como cerca de meia centena de países, reconhecem o presidente da Assembleia Nacional, Juan Guaidó, como presidente interino da Venezuela. Apesar da pressão que tem sido feita ao longo de mais de um ano, Maduro, que tem o apoio de Rússia e China, não cedeu o poder.
A acusação de um chefe de Estado é muito pouco comum, lembra a agência norte-americana AP, mas em ambos os documentos Maduro é apresentado como ex-presidente.
No Twitter, este não reagiu diretamente à acusação, mas deixou uma mensagem contra os EUA e a Colômbia: "Repito a minha denúncia! Desde os EUA e a Colômbia conspira-se e deu-se a ordem para encher de violência a Venezuela. Como chefe de Estado estou obrigado a defender a paz e a estabilidade de toda a pátria, em qualquer circunstância que apareça. Não puderam nem poderão"
Maduro, de 57 anos, chegou ao poder em 2013, depois da morte do mentor, Hugo Chávez. Foi eleito nesse mesmo ano e reeleito em 2018, numas eleições que parte da comunidade internacional não considerou livres e justas. O ex-motorista de autocarros, que foi chefe da diplomacia e número dois de Chávez, acusa há muito o "império" norte-americano de estar à procura de qualquer desculpa para assumir o controlo das maiores reservas de petróleo do mundo (as venezuelanas), comparando o que está a acontecer com a invasão do Panamá, em 1989, e o derrube do general Manuel Noriega, o líder de facto do país, acusado de tráfico de droga na Florida.
Barr, o atual procurador-geral, já estava na altura num cargo sénior no Departamento de Estado, e Elliott Abrams, o atual enviado para a Venezuela, era secretário de Estado adjunto para a América Latina.
A 20 de dezembro de 1989, o então presidente George Bush (pai) anunciava a invasão do Panamá, argumentando com a necessidade de implementar a democracia no país, combater o tráfico de drogas, garantir a abertura do canal do Panamá e fazer que Noriega fosse capturado e julgado nos EUA - tinha sido acusado em 1988 de tráfico de droga e lavagem de dinheiro. Durante a invasão terão morrido mais de 2500 pessoas.
Depois de inicialmente fugir, Noriega acabaria por se entregar a 3 de janeiro de 1990. Foi condenado nos EUA a 40 anos de prisão, cumprindo 17, antes de ser extraditado para França (onde também era procurado). Condenado a sete anos, foi contudo entregue em 2011 ao Panamá, onde morreu, em maio de 2017. Estava em prisão domiciliária por causa de um tumor no cérebro.