Dez mortos em referendo constitucional boicotado pela oposição

Oposição acusa o presidente Alpha Condé, de 82 anos, de querer perpetuar-se no poder. Está a chegar ao fim o segundo mandato de cinco anos, mas nova Constituição poderá ser usada como desculpa para recomeçar a contagem.
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Pelo menos dez pessoas morreram no domingo em confrontos entre a polícia e manifestantes durante um referendo constitucional na Guiné-Conacri, que a oposição boicotou por considerar que é uma tentativa do presidente Alpha Condé de se perpetuar no poder.

Forças anti-governamentais ficaram debaixo de fogo das forças de segurança que "efetuaram detenções massivas, dispararam cegamente e mataram pelo menos 10 pessoas", segundo o FNDC (que abarca vários partidos e forças de oposição). O grupo apelou a novos protestos esta segunda e terça-feira.

Inicialmente previsto para 1 de março, mas adiado após severas críticas de organizações internacionais à insegurança, o referendo constitucional decorreu no domingo debaixo de grande tensão.

Em alguns locais, por exemplo no centro de Conacri, a capital da Guiné-Conacri (oficialmente República da Guiné), a votação arrancou à hora prevista (08:00 locais, a mesma em Lisboa), mas noutros, como em Ratoma, que fica nos subúrbios, registaram-se atrasos devido aos atos de violência.

De acordo com a imprensa local, logo nas primeiras horas de votação, houve material eleitoral queimado, confrontos com a polícia e locais de voto vandalizados, em locais como Cosa, Hamdallaye, Dar-es-salam e Lambanyi, nos subúrbios de Conacri, embora noutras regiões o processo tenha prosseguido sem perturbações.

Ao votar pela manhã em Conacri, o presidente Alpha Condé pediu calma aos cidadãos, apesar da agitação social e dos receios à volta da pandemia do covid-19, que já infetou duas pessoas no país.

"Lavem as mãos e distanciem-se das pessoas", recomendou Condé à população.

Os 5,3 milhões de eleitores recenseados na Guiné-Conacri foram chamados às urnas para eleger o parlamento e decidir sobre uma nova Constituição que poderá permitir a renovação do mandato de Alpha Condé.

Ensino obrigatório até aos 16 anos, fixação da idade legal para contração de matrimónio nos 18 anos, proibição da mutilação genital, proibição do trabalho escravo e infantil, garantia de direitos iguais às mulheres em caso de divórcio, atribuição às mulheres de, pelo menos, um terço dos lugares parlamentares, abolição da pena de morte e limitação de mandatos presidenciais a um máximo de dois períodos de sete anos (contra os atuais cinco anos) são algumas das alterações ao texto fundamental do país.

No entanto, oposição e críticos do presidente temem que a nova versão da Constituição possa oferecer ao chefe de Estado, 82 anos, a possibilidade de recomeçar a contagem do número de mandatos presidenciais, algo que é atualmente proibido por lei.

A União Europeia advertiu na sexta-feira que não estão reunidas as condições para uma "votação transparente e pacífica" nas eleições legislativas e referendo constitucional, sublinhando a "extrema polarização" do país.

A Guiné-Conacri enfrenta uma crise política desde outubro, com manifestações e protestos violentos contra a intenção anunciada do presidente de disputar um terceiro mandato como chefe de Estado em 2020. Mais de 30 civis e um polícia morreram desde o início dos protestos.

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