Crianças migrantes: "A força dos funcionários deixou marcas nos meus pulsos"

Menores que foram levados para centros de abrigo e detenção de migrantes revelam casos de maus-tratos, que incluem uso de algemas ou longos períodos na solitária, além da administração de drogas sem consentimento dos pais.
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As denúncias de maus-tratos nos centros de abrigo e detenção de menores, que foram separados dos pais ao cruzar ilegalmente a fronteira entre o México e os EUA ou chegaram sozinhos ao país, começam a chegar aos tribunais norte-americanos e daí às páginas dos jornais ou às televisões.

Há denúncias de centros sem condições de higiene, noutros casos os e-mails ou telefonemas dos menores eram monitorizados. Numa denúncia, diz-se que, em pleno verão no Texas, as crianças ficavam em quartos sem ar condicionado. Noutra, contam que eram ser seguradas com violência para receberem injeções, que os registos médicos indicam serem de antipsicóticos ou sedativos.

Num centro, em Shenandoah Valley, na Virgínia, uma dúzia de jovens juram ter sido agredidos enquanto estavam algemados e detidos em solitária durante longos períodos de tempo, ou serem obrigados a ficar nus em celas de cimento. A agência AP teve acesso a esse processo.

"Sempre que tentavam conter-me e me colocavam numa cadeira, eles algemavam-me", segundo um jovem hondurenho, que chegou ao centro quando tina 15 anos. "Também punham um saco sobre a minha cabeça".

John Doe 2

A CNN cita também um caso nesse centro, não sendo claro se é o mesmo jovem ou não. John Doe 2 (anónimo 2), como é identificado pela CNN, entrou ilegalmente nos EUA com a mãe quando era criança. Na primavera passada, já com 15 anos, foi apanhado pelos serviços de imigração e acabou num centro de detenção.

Quando tentou fugir do primeiro abrigo, e depois de ter começado a ficar agressivo e de se ter tentado magoar, acabou transferido por "problemas de comportamento" para um dos centros destinados aos jovens migrantes mais perigosos, Shenandoah Valley, na Virgínia.

Aí, os funcionários diziam mal dele e de outras crianças hispânicas em inglês, sem perceber que eles podiam perceber. Irritado, respondia, e era dominado e agredido pelos funcionários.

"Eles agarram nas minhas mãos e põem-nas atrás das minhas costas, para não me poder mexer. às vezes, usam canetas para me acertar nas costelas, às vezes agarram a minha mandíbula com as mãos", disse na declaração. "São maiores do que eu. Às vezes há três ou quatro a usar a força contra mim ao mesmo tempo. A força usada pelos funcionários deixou marcas nos meus pulsos, nas minhas costelas e no meu ombro. O médico deu-me ibuprofeno para a dor", relatou.

Nos documentos do tribunal, o centro negou os maus-tratos aos menores, mas admitiu que os funcionários usam o confinamento ou as restrições quando eles lutam entre si ou com a equipa. A "cadeira de contenção de emergência" é usada como último recurso contra comportamento agressivo.

O governador da Virginia, o democrata Ralph Northam, deu ordens para a abertura de uma investigação.

Texas

No centro de tratamento Shiloh Residential, no Texas, uma rapariga de 11 anos de El Salvador disse em tribunal como um professor a tratava de "estúpida" e outros funcionários a agrediram.

"Uma funcionária pôs os dois polegares na minha garganta e as mãos à volta do pescoço. Doía e estava a ofegar, à procura de ar.A funcionária disse que estava só a brincar, mas fiquei assustada", contou, segundo os documentos aos quais o Huffington Post teve acesso. "Preferia voltar para as Honduras e viver nas ruas do que ficar em Shiloh".

Atualmente, quase 11 800 crianças (mais de 2300 crianças separadas dos pais quando cruzaram ilegalmente a fronteira entre o México e os EUA e as restantes chegaram não acompanhadas) estão em mais de cem centros de detenção ou abrigos em 17 diferentes estados.

Os casos atualmente em tribunal são prévios à política de tolerância zero de Donald Trump, aplicada apenas desde meados de abril, que implica que todos os migrantes apanhados a cruzar a fronteira sejam acusados de um crime e detidos, levando à separação dos menores.

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