Conservadores, Nigel Farage, o Brexit e o Dia D no adeus de Trump ao Reino Unido
O líder do Partido do Brexit, Nigel Farage, disse nesta terça-feira que o presidente norte-americano, Donald Trump, "acredita totalmente no Brexit" mas está "obviamente preocupado que esteja a demorar tanto tempo". Farage foi um dos políticos britânicos convidados para um encontro privado com Trump, que os recebeu após reunir-se com a primeira-ministra, Theresa May. A visita acaba nesta quarta-feira com as comemorações do 75.º aniversário do Dia D.
"Bom encontro com o presidente Trump - ele acredita mesmo no Brexit e está a adorar a sua viagem a Londres", escreveu Farage no Twitter, após a reunião na residência oficial do embaixador norte-americano no Reino Unido.
Mais tarde, no seu programa na rádio LBC, Farage explicou que tinha recebido um "convite privado" para um encontro com Trump e que ele "acredita totalmente no Brexit, pensa que é a coisa certa para o país. Ele está obviamente preocupado que esteja a levar tanto tempo".
"É importante respeitar a escolha do povo e sair da União Europeia com um acordo sobre o Brexit. Mas este assunto vai continuar aqui no Reino Unido. O mais importante é sair. O presidente sugeriu processar a UE, não o fizemos, negociámos e conseguimos um bom acordo", disse nesta terça-feira a primeira-ministra britânica, Theresa May, numa conferência de imprensa conjunta com Trump.
"Eu teria processado. Mas talvez ela seja melhor negociadora do que eu. Eu previ o que ia acontecer. Foi uma previsão muito forte. Achei que ia acontecer por causa da imigração. Mas provavelmente por outras razões também. Achei que ia acontecer. E que vai acontecer. Este país merece a sua independência. Acredito que será bom para o país", afirmou, por sua vez, Trump, que no passado aconselhou May a processar a UE em vez de negociar com ela.
Questionado pelos jornalistas sobre possíveis encontros com Boris Johnson e Michael Gove, candidatos à sucessão de May, que se demite nesta sexta-feira da liderança dos Tories, o presidente respondeu: "Conheço o Boris, ele tem feito um bom trabalho, mas não conheço Gove."
Além de Farage, o presidente norte-americano encontrou-se com o ex-líder conservador Iain Duncan Smith e o antigo ministro do Ambiente Owen Paterson. Uma porta-voz do primeiro disse que a reunião já tinha sido marcada há um tempo e que ambos falaram "de um grande número de temas, incluindo o Brexit".
Trump deu ainda uma entrevista ao jornalista Piers Morgan, que será transmitida nesta quarta-feira de manhã no seu programa das manhãs da ITV.
No âmbito das discussões sobre o pós-Brexit, Trump afirmou nesta terça-feira em Londres: "O Reino Unido é o nosso principal investidor externo. Os EUA estão comprometidos com um acordo fenomenal de comércio com o Reino Unido. Tremendo. Duas ou três vezes superior às trocas que temos agora. Esta é a maior aliança que o mundo alguma vez viu."
O presidente dos EUA considerou "uma honra voltar a Londres nas comemorações dos 75 anos do Dia D" e agradeceu "à rainha, uma mulher fantástica, também à primeira-ministra e ao senhor May pela acolhedora receção. Amanhã iremos participar numa cerimónia em Portsmouth. A nossa relação especial assenta em valores comuns. Como a liberdade. Mas também como o direito à vida e à herança. Agradeço o apoio do Reino Unido para derrotar o califado do Estado Islâmico. Agradeço a participação do Reino Unido para a NATO e eu e a primeira-ministra concordámos que todos os membros da NATO têm de cumprir as suas obrigações e aumentar as suas contribuições para 2% do PIB. Os EUA e o Reino Unido querem garantir que o Irão nunca terá armas nucleares. Também em relação à segurança das fronteiras sabemos que a segurança é nacional".
May, por seu lado, enaltecendo também a relação histórica que existe entre os dois países, arranjou forma de vincar em que é que as lideranças dos dois países diferem. "Nesta semana comemoramos a coragem dos que deram a vida no Dia D há 75 anos. O Reino Unido e os Estados Unidos são aliados que ficaram lado a lado nessa altura e que continuam lado a lado até hoje. Por isso estou muito feliz por receber o presidente dos Estados Unidos nesta sua visita ao Reino Unido. Quando a Rússia usou gás nervoso nas ruas de Londres, o presidente expulsou russos. Na Síria, quando as crianças sírias foram vítimas de armas químicas, o Reino Unido e os EUA, a par da França, responderam. Enfatizamos a importância da NATO e conseguiu-se que as contribuições dos países fossem aumentadas. Sempre falei contigo de forma aberta, Donald, sabendo que também sempre fizeste o mesmo comigo. Falámos do potencial desestabilizador do Irão e na necessidade de evitar que o Irão tenha armas nucleares. Apesar de termos abordagens diferentes. O Reino Unido mantém-se fiel ao acordo sobre o nuclear com o Irão. O Reino Unido mantém-se também comprometido com uma abordagem sobre as alterações climáticas e com o acordo de Paris."
Antes da conferência de imprensa de May e Trump, o líder da oposição trabalhista, Jeremy Corbyn, dirigiu-se aos manifestantes em Whitehall condenando, entre outras coisas, os ataques do presidente ao mayor de Londres. Sadiq Khan foi acusado na véspera pelo milionário republicano de ser "um falhado". O autarca trabalhista retorquiu acusando Donald Trump de ser o poster-boy da extrema-direita.
Reafirmando a oposição do seu partido contra o racismo, recordando que foi contra a guerra no Iraque em 2003, apesar de ter sido um primeiro-ministro trabalhista, Tony Blair, que levou o Reino Unido a alinhar com os EUA de George W. Bush, Corbyn rejeitou qualquer acordo comercial entre o Reino Unido e os EUA que ponha à venda o NHS. Segundo o líder dos trabalhistas, o Serviço Nacional de Saúde deve manter-se gratuito. "Quando se negoceia um acordo comercial tudo está em cima da mesa, até o NHS", declarou Trump, na sessão de perguntas e respostas aos jornalistas, na conferência de imprensa conjunta que deu com a primeira-ministra Theresa May.
Corbyn explicou que não foi ao banquete real de segunda-feira à noite mas que não está a boicotar ninguém. E mostrou-se disponível para se encontrar e para falar com o presidente norte-americano. Apesar disso, Trump disse aos jornalistas não querer reunir-se com Corbyn: "Não conheço Jeremy Corbyn. Ele queria uma reunião. Eu disse que não. Ele é uma força negativa. Decidi não reunir-me. Quanto aos protestos, nós saímos do palácio, só vimos pessoas a comemorar a nossa aliança. Eu só vi um pequeno grupo de pessoas. Por razões políticas. Isso são fake news. Lamento dizer." E sobre Sadiq Khan acrescentou: "Não tem sido um bom mayor, pelo que ouço, o crime tem aumentado. Ele é uma força negativa. Ele magoa as pessoas com o que diz. Ele devia centrar-se no trabalho dele."
No Twitter, Corbyn insistiu: "Theresa May permaneceu impávida e serena ao lado de Donald Trump enquanto ele dizia que o NHS 'estará sobre a mesa' num acordo comercial com os EUA. É para isso que estão a preparar-se os candidatos à liderança dos Tories e Farage, que estão, em fila, à espera do desastre capitalista que será um No Deal."
Os manifestantes concentraram-se em Trafalgar Square e também na praça de Westminster, junto ao Parlamento britânico, onde estava um balão que representa Trump bebé, com fralda e um telemóvel na mão.
"O senhor Trump é um homem ofensivo e perigoso e não penso que lhe devamos dar honras no palácio. O comportamento dele no Médio Oriente tem sido atroz, fomentou o conflito entre israelitas e palestinianos", disse à agência Lusa o reformado Bruce Bennet, ativista de um movimento contra as armas nucleares, que esteve no protesto.
Também Matty, estudante que viajou cerca de três horas de comboio, da região de Devon, no sudoeste de Inglaterra, teceu críticas à visita de Trump. "Não penso que nós, os contribuintes, devamos pagar esta visita de Estado quando a maioria não o quer aqui. Ele representa o racismo contra o qual lutámos no Dia D", referiu.
Questionado sobre se vê necessidade de restringir a troca de informações entre os EUA e o Reino Unido por causa da Huawei, Trump disse: "Não. Porque vamos ter um acordo sobre a Huawei. Não vejo necessidade de restrições. Este é um grande aliado e nós nunca tivemos problemas com este aliado." Antes da chegada de Trump ao Reino Unido, o seu conselheiro de segurança nacional John Bolton afirmou, citado pela Reuters, que os britânicos ainda não tomaram a sua decisão final sobre a Huawei e a 5G.
Recorde-se que no início de maio Theresa May, que abandona o n.º 10 de Downing Street a 7 de junho, demitiu o ministro da Defesa Gavin Williamson por fuga de informação sobre o acordo com a Huawei para desenvolver a rede 5G. Em causa, revelou a imprensa, está a informação veiculada pelo jornal Telegraph, que noticiou que a primeira-ministra acordou que a chinesa Huawei ajudasse a desenvolver a rede 5G do Reino Unido, apesar dos vários alertas sobre os riscos de segurança nacional que isso pode vir a representar para o país.
Trump quer que os EUA ganhem a corrida do desenvolvimento da 5G e não admite que o seu país seja ultrapassado neste campo por qualquer outro. "Não podemos permitir que qualquer outro país ultrapasse os EUA nesta poderosa indústria do futuro (...) simplesmente não podemos permitir que isso aconteça", disse Donald Trump, em abril, na Casa Branca.
O desenvolvimento do 5G tem sido marcado por polémicas relacionadas com a fabricante chinesa Huawei. Esta é acusada de espionagem industrial e outros 12 crimes pelos Estados Unidos, país que chegou a proibir a compra de produtos da marca em agências governamentais e que tem tentado pressionar outros países a excluir a empresa no desenvolvimento das redes 5G.
Ainda no âmbito das discussões sobre o pós-Brexit, Trump afirmou nesta terça-feira em Londres: "O Reino Unido é o nosso principal investidor externo. Os EUA estão comprometidos com um acordo fenomenal de comércio com o Reino Unido. Tremendo. Duas ou três vezes superior às trocas que temos agora. Esta é a maior aliança que o mundo alguma vez viu."
O segundo dia da visita de Estado ficou concluído com um jantar oferecido por Trump na Winfield House, a residência oficial do embaixador dos EUA no Reino Unido, no qual esteve presente o príncipe Carlos.
No último dia de visita de Estado, Trump e Melania vão participar, juntamente com a rainha e o príncipe Carlos, nas comemorações em Portsmouth, no sul do Reino Unido, do desembarque na Normandia, há 75 anos.
O evento irá contar a história do desembarque através de um espetáculo musical, que inclui a leitura de testemunhos e mostras militares, incluindo o voo de 25 aviões modernos e históricos da Segunda Guerra Mundial.
Depois das comemorações, a rainha despede-se do presidente dos EUA, que segue para uma visita à Irlanda, tendo previsto um encontro com o primeiro-ministro Leo Varadkar, que já recebeu na Casa Branca.
Se o tempo o permitir, Trump deverá conseguir encaixar um jogo de golfe no seu clube em Doonberg.
Na quinta-feira, Trump segue para França, para as comemorações oficiais do Dia D.