Amnistia acusa rebeldes sírios de crimes contra a humanidade
A Amnistia Internacional denuncia os abusos cometidos pelas forças rebeldes sírias, acusadas de usarem métodos semelhantes aos do governo de Bashar al-Assad
Quando em 2012 os grupos rebeldes opostos ao regime de Bashar al-Assad, na Síria, começaram a ocupar as cidades de Alepo, Idlib e arredores, os civis sentiram alívio, pensando estar assim protegidos dos métodos de tortura e repressão utilizados pelas forças leais ao regime de Damasco. A esperança foi, contudo, um estado de espírito efémero rapidamente destruído pela "lei das armas" imposta por rebeldes que queriam estabelecer a sua própria ordem.
A denúncia é da Amnistia Internacional, num relatório divulgado esta terça-feira, que diz que esses movimentos armados têm levado a cabo crimes e violações semelhantes àquelas praticadas pelas forças de Al-Assad.
"Os grupos de oposição ao governo sírio têm cometido sérias violações dos direitos humanos, incluindo raptos, tortura e execuções sumárias", reporta o relatório "A tortura foi o meu castigo".
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Milhares de pessoas têm sido sujeitas a detenções arbitrárias, tortura, desaparecimentos forçados e outros maus tratos, sendo as forças do Governo as principais, mas não as únicas, responsáveis por estes crimes. "Os abusos por parte de grupos armados não-estatais têm agravado o sofrimento dos civis", sublinha o referido documento.
O relatório regista um conjunto de atrocidades cometidas sobre civis da responsabilidade de cinco principais movimentos armados, entre eles a Frente al-Nusra, que em 2013 jurou lealdade à Al-Qaeda.
"Alguns destes grupos, compostos predominantemente por cidadãos sírios, foram controlando áreas cada vez maiores das cidades de Alepo, de Idlib e arredores, entre 2012 e 2015, e permaneceram no poder nessas zonas até hoje com o apoio de Governos como do Qatar, Arábia Saudita, Turquia e Estados Unidos", explica a organização não-governamental dedicada à defesa dos direitos humanos.
Os cidadãos destas áreas vivem agora com medo constante de serem raptados e torturados por estas forças rebeldes que aí impõem normas sociais rígidas, impedem a critica popular à sua ação e estabelecem instituições administrativas, quase judiciais.
A justiça para centenas de milhares de vítimas da guerra civil que assombra a Síria desde 2011 mantém-se, por isso, uma ilusão quer nas zonas ocupadas por rebeldes quer nas áreas dominadas pelo governo de Al-Assad, ambos até agora não responsabilizados pelos seus crimes.
Os métodos de tortura atribuídos pelo relatório da Amnistia Internacional a estes grupos incluem espancamento com objetos e as posições "shabeh" (a vítima fica suspensa do teto pelos pulsos durante horas) e "dulab" (em que a vítima é enfiada num pneu com a cabeça pressionada contra os joelhos, sendo depois espancada.) Os residentes de Alepo e de Idlib têm ainda testemunhado execuções sumárias de civis, membros capturados das forças armadas e de segurança do Governo, militantes do Estado Islâmico e de outros grupos rivais e pessoas suspeitas de serem "espiãs."
Desde 2014, o número de raptos e casos de tortura de jornalistas, advogados, ativistas e trabalhadores humanitários por grupos armados pertencentes ao Exército da Conquista e às coligações de Conquista de Alepo têm também aumentado, realçando a intolerância relativa à liberdade de expressão e protesto vivida nestas zonas.
As conclusões da Amnistia Internacional são resultado de entrevistas a 70 pessoas que vivem ou trabalham em áreas controladas por rebeldes no noroeste da Síria (Idlib e partes de Alepo.)
Desde 2011, a guerra civil na Síria, que começou entre as forças do regime de Assad e grupos rebeldes que procuravam derrubar o presidente, mas agora se tornou num conflito de todos contra todos, com os grupos rebeldes a defrontar-se também entre si, já fez mais de 400 mil mortos e 11 milhões de refugiados e deslocados internos, segundo a ONU.