A luta contra o racismo na América. Pequenas e grandes cidades saíram à rua pacificamente

Em Raeford, Washington, Los Angeles, Nova Iorque, Chicago, Filadélfia, São Francisco e um pouco por todo o mundo, milhares de pessoas juntaram-se nas ruas para um protesto pacífico contra o racismo, depois da morte do afro-americano George Floyd, que deixou de respirar quando um​​​​​​ polícia pressionou o seu pescoço com o joelho.
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A respiração ofegante e os pedidos de socorro de George Floyd tornaram-se uma bandeira. As imagens do jovem afro-americano no chão com o pescoço pressionado pelo joelho de um polícia insensível à suplica "não consigo respirar" viajaram pelo mundo através da Internet. Mas a resposta superou a comunidade online e milhares foram para as ruas lembrar, de forma pacífica, que o racismo existe. Este sábado, o apelo soou da América, à Europa ou à Austrália, mas foi nos Estados Unidos - país de Floyd - que teve maior expressão.

Washington, Los Angeles, Nova Iorque, Chicago, Filadélfia, São Francisco. Em todas estas cidades os protestos atingiram dimensões maiores. Na primeira, onde as autoridades esperavam mais de 200 mil manifestantes, várias ruas tiveram mesmo de ser fechadas ao trânsito no centro da cidade. A maioria dos grupos concentrou-se em frente ao Capitólio e ao Monumento a Lincoln, tendo seguido depois em direção à Casa Branca, onde se encontrava o presidente Donald Trump, com segurança reforçada.

A presidente da Câmara de Washington, Muriel Browser, que tem sido criticada por Trump, também se associou aos protestos, que pretendem mobilizar um milhão de pessoas nas ruas. "Temos de respeitar a constituição", lembrou, citada pela cadeia televisiva CNN.

Os cenários para as primeiras grandes manifestações mundiais em tempo de pandemia da covid-19 escolhidos variaram muito. Se uns procuraram os símbolos de poder nacional e outros a vista, como a famosa ponte de São Francisco, houve também quem tenha transmitido a mensagem em lugares mais discretos, em pequenas cidades do interior.

Foi o caso da cidade onde George Floyd nasceu: Raeford, no Estado da Carolina do Norte, perto de Fayetteville. Aqui as pessoas formaram uma longa fila no exterior da igreja batista, onde o corpo do afro-americano está a ser velado, enquanto aguardavam pela sua vez de entrar. O funeral está marcado para terça-feira, em Houston.

George Floyd, 46 anos, morreu a 25 de maio, em Minneapolis, Estado do Minnesota, depois de um polícia branco lhe ter pressionado o pescoço com um joelho durante cerca de oito minutos numa operação de detenção, apesar de Floyd dizer que não conseguia respirar.

A morte de Floyd ocorreu durante a sua detenção por suspeita de ter usado uma nota falsa de 20 dólares (18 euros) numa loja.

Os quatro polícias envolvidos no caso foram despedidos, e o agente Derek Chauvin, que colocou o joelho no pescoço de Floyd, foi acusado de homicídio em segundo grau, arriscando uma pena máxima de 40 anos de prisão. Os restantes vão responder por auxílio e cumplicidade de homicídio em segundo grau e por homicídio involuntário.

Novos casos de violência policial, inclusive durante a repressão dos protestos, por vezes violentos, que têm ocorrido nos Estados Unidos desde a morte de George Floyd aumentaram o sentimento de revolta entre os norte-americanos. Vários vídeos têm sido divulgados a mostrar intervenções musculadas da polícia contra manifestantes pacíficos.

Pelo menos 10 mil pessoas foram detidas desde o início dos protestos, e as autoridades impuseram recolher obrigatório em várias cidades, incluindo Washington e Nova Iorque, enquanto o Presidente norte-americano já ameaçou mobilizar os militares para pôr fim aos distúrbios nas ruas.

Mas os manifestantes prometem não desmobilizar. "O nosso objetivo é literalmente manter este protesto a durar o mais possível", disse Rasheeda McCallum, 29 anos, de Brooklyn (Nova Iorque), um dos manifestantes, citados pelo jornal norte-americano New York Times.

Berlim, Londres, Nápoles, Lisboa e Porto

O rastilho pegou e, este sábado, depois de 12 dias consecutivos de manifestações nos Estados Unidos, espalhadas por mais de 650 cidades, outros países decidiram mostrar a sua solidariedade para com os norte-americanos e usar este exemplo para falar do racismo no seu país.

Na capital alemã, milhares vestiram-se de preto para dizer "estou aqui porque há racismo na Alemanha". Também na liga de futebol deste país, a Bundesliga, os jogos de sábado começaram com um minuto de silêncio em homenagem às vítimas de racismo.

Em Londres, uma multidão de cidadãos, a maioria com máscaras e luvas, concentrou-se na praça em frente ao parlamento britânico. Em Itália, várias centenas de pessoas protestaram de forma pacífica junto ao consulado dos Estados Unidos em Nápoles, gritando "Não consigo respirar" para denunciar o assassinato de George Floyd. Liberdade!" e "Sem justiça, sem paz", ouvia-se também ​​​​em inglês e italiano.

Em Portugal, houve manifestações em Lisboa, Porto, Braga, Coimbra e Viseu. Só na capital, a polícia estima que chegaram a estar em frente à Assembleia da República mais de seis mil pessoas.

Em Lisboa, ao longo de mais de duas horas e meia, os manifestantes percorreram os cinco quilómetros que separam a zona da Alameda, junto à Fonte Luminosa, até à Praça do Comércio, na Baixa. "Estamos saturados", disse à Lusa Catarina Gomes, de 34 anos, uma das manifestante, ainda antes do início do protesto, explicando que os negros "continuam a sentir racismo em várias situações do dia a dia", mesmo em Portugal.

"Cada vez há mais intolerância, as pessoas estão frustradas, muitas vezes por razões económicas, e começam a ser intolerantes", acrescentou.

Durante toda a semana, artistas organizaram-se e pararam em solidariedade com o movimento "Black Lives Matter". Já Bansky - o artista plástico anónimo que pinta murais às escondidas - criou uma nova obra para passar a mensagem: "primeiro, achei que devia ficar calado e ouvir as pessoas pretas sobre este assunto. Mas porque é que eu haveria de fazer isso? Não é um problema delas. É meu. O sistema está a falhar às pessoas de cor. O sistema branco", escreveu o artista no Instagram para legendar a sua mais recente obra - um retrato preto com uma vela ao lado.

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