9 respostas para entender tudo sobre as eleições nos EUA
Houve mais de 114 milhões de votantes - em 2014 tinham sido apenas 83 milhões. Esta foi a eleição intercalar mais votada dos últimos tempos e isso deve-se, segundo os analistas, à questão Trump. Trump não foi a votos mas esteve no centro de tudo
Porque este era, no fundo, um referendo à sua presidência - como o próprio fez questão de acentuar, arriscando, até, um pouco. Foi assim, para os que queriam votar contra ele ou para os que queriam mostrar o seu apoio.
De acordo com uma sondagem da CNN, 39% dos americanos disseram ter votado nas intercalares para castigar Donald Trump, enquanto 26% disseram ter ido às urnas para apoiar o presidente. O mesmo estudo mostra que 44% dos americanos disseram aprovar a forma como Trump gere o país, enquanto 55% não aprova.
Haverá mais mulheres no Congresso do que nunca. E mais mulheres votaram nestas eleições. E mais mulheres serão governadoras. E houve, desde o início das primárias, mais mulheres a concorrer.
Tudo isto não será apenas efeito do empoderamento do movimento feminino mundial, mas também. Houve o #metoo, houve as atitudes anti-femininas de Donald Trump, com o escândalo "grab her by the pussy" - (agarrá-la pela vagina). Pode dizer-se que todo este movimento começou nas marchas de mulheres logo a seguir à eleição de Trump. Este ano as mulheres contribuíram com $159 milhões para candidaturas femininas, duas vezes e meia mais do que tinha acontecido há dois anos.
Vamos a números. Nestas eleições foram eleitas 116 mulheres, ao todo - para congressistas e governadoras. A maior parte estavam do lado democrata. 476 mulheres foram candidatas, o número anterior era de 298. No dia das eleições, 237 estavam em bolentins de votos - anteriormente só 167.
Haverá pelo menos 95 mulheres em 435 congressistas na Câmara dos Representantes - até agora eram 84 - e 23 em 100 senadores (10 já lá estavam, as outras foram eleitas). Nestas mulheres todas há 38 negras - o que significa também um grande aumento da diversidade.
Dois exemplos importantes da mudança que isto significa: no Kansas, Laura Kelly venceu a governação a Kris Kobach, apoiante ferrenho de Trump, que fez camapnha com ele nas últimas semanas.
Abigail Spanberger, uma antiga agente da CIA, ganhou na Virginia ao membro da Câmara dos Representantes e estrela dos conservadores Dave Brat. Há quatro anos, Brat tinha derrotado o antigo líder dos republicanos, Eric Cantor.
No Arizona, Martha McSally, uma piloto da Força Aérea republicana e a democrata, bissexual, ainda estavam a disputar o lugar no Congresso. Em 33 distritos isto aconteceu - mulheres a concorrerem contra mulheres.
Aparentemente sim. Dos 28 novos congressistas democratas, 27 eram mulheres.
43% dos candidatos democratas para o Senado e a Camara de Representantes erema mulheres. E apenas 22% dos republicanos.
Há um caso interessante, do lado dos republicanos, a senadora do Tenesse Masha Blackburn, conservadora com quem Trump fez campanha. Mas os restantes exemplos contam-se pelos dedos de uma mão.
E, de facto, as mulheres, sobretudo as mais educadas, votaram claramente à esquerda nestas eleições, por mais de 18 pontos percentuais, segundo uma sondagem da NPR . Os homens brancos, e sem educação superior, preferiram um candidato republicano por 33 pontos. Este é um intervalo de 51 pontos... uma grande diferença que marca uma América muito dividida, também do ponto de vista de género.
Os governadores são uma espécie de primeiros-ministros dos estados americanos, e têm grande poder - nomeadamente de orçamento. Os democratas já estão em 25 governos estaduais, o que significa mais sete do que tinham. Os republicanos perderam sete lugares. Novo México, Kansas, Illinois, Michigan e Maine são os estados que até agora passaram das mãos republicanas para democratas. Foram a a votos 36 dos 50 governadores. Destes cinco estados, quatro foram ganhos por mulheres - a exceção é o Illinois.
Isto tem especial importância por causa de Gerrymandering, uma espécie de redesenho dos círculos eleitorais que está nas mãos do poder estadual e pode favorecer um partido em relação a outro.
Além da questão das mulheres há mais primeiras vezes. Há as primeiras descendentes de índios americanos eleitas, Deb Haaland do Novo México, e Sharice Davids do Kansas.
Há a mulher mais jovem membro do congresso, a nova-iorquina democrata Alexandria Ocasio-Cortez, progressista e membro do Partido Socialista, com 29 anos. Há a primeira mulher negra do Massachussets, Ayanna Pressley. As primeiras muçulmanas, Rashida Tlaib e Ilhan Omar. Há um gay que vai ser governador, no Colorado, Jared Polis, que concorreu com uma agenda progressista num estado bastane conservador.
Não. Segundo todos os dados, o grande tema da campanha foi a Saúde. A saúde, nos EUA, é um problema sério, porque não há um plano estatal na maior parte dos estados, e os seguros de saúde dependem de quem tem um bom emprego. Obama tentou reverter isto usando o Obamacare, inspirado no sistema que existe no Massachussets, e tornando o seguro obrigatório.
Segundo o Wesleyan Media Project mais de 60% dos anúncios de campanha visavam este assunto. Em 2014 tinham sido 10 %.
A imigração também terá desempenhado um papel importante - atirando os democrtas para a esquerda progressista, até pelas atitudes mais radicais de Donald Trump. Normalmente os democratas não gostam de falar de emigração - até porque é terreno minado entre o seu eleitorado natural de trabalhadores urbanos. Mas dessa vez, Trump fez o tema entrar na campanha e de forma que facilitava aos democratas escolher o lado.
Mais interessante é verificar que, ao contrário do que costuma ser habitual, a economia não esteve no centro das atenções. É verdade que uma economia a crescer não é assunto - mas todas as sondagens indicam que ninguém votou com esse tema na cabeça. Outro sinal interessante é que os mesmos que dizem que a economia está ok são os mesmo que consideram que a América está a ir por maus caminhos, segundo a CNN. Ou seja, Trump sempre a desbravar novos caminhos.
É pouco provável, apesar de haver mais alguns democratas radicais no congresso. Na verdade, até durante a campanha, os líderes do Partido Democrata preferiram não se pronunciar sobre essa possibilidade. Por um lado há um passado não muito positivo: quando os republicanos insistiram no impeach a Clinton isso teve efeitos negativos no partido. Por outro, com os atuais números seria impossível conseguir dois terços do Senado a votar o impeach, embora ainda haja alguns críticos de Trump à direita.
Apesar disto, quando o novo Congresso tomar posse, em janeiro, o impeachment vai com certeza voltar a estar em cima da mesa. Até poque há vários assuntos em investigação, e o procurador especial Robert Mueller continua e aproxima-se do presidente, depois de já ter levado ao banco dos réus alguns dos principais colaboradores de Trump, do seu antigo gestor de campanha, Paul Manafort, ao seu antigo advogado, Michael Cohen.
Em causa está o envolvimento da equipa Trump na alegada ingerência russa nas presidenciais de 2016 para mudar os resultados a favor dos republicanos.
Pode, para já, negociar, algo que não está muito no seu estilo, mas pode mudar - dependendo das circunstâncias. E tudo dependerá também da atitude da maioria democrata na Câmara dos Representantes. Nancy Pelosi deverá ser a líder, de novo, e já disse no discurso de vitória que o Congresso voltará a ser o controlador e o garante da constituição.
Os líderes do Partido Democrata já tinham deixado claro durante a campanha que se vencessem a Câmara, não iriam facilitar a vida ao presidente. A começar por travarem a agenda de Trump em áreas como a saúde, a imigração ou a reforma fiscal.
Trump foi incansável durante a campanha, percorrendo o país para dar apoio a candidatos republicanos e admitindo mesmo que votar neles era votar nele. O objetivo era claro, manter o controlo sobre ambas as câmaras do Congresso de forma a aprovar mais cortes nos impostos, em conseguir aprovar medidas para restringir ainda mais a entrada de imigrantes na América.
Além disso, o grande projeto de Trump de construir um muro na fronteira com o vizinho do Sul para travar a entrada de imigrantes ilegais continua à espera de financiamento. E este vai ser ainda mais difícil de obter com uma Câmara dos Representantes democrata.
A reforma da Saúde promete marcar a segunda metade do mandato de Trump. Nos primeiros dois anos, apesar de ter maioria em ambas as câmaras do Congresso, o presidente não conseguiu revogar o Obamacare, a reforma da saúde de Barack Obama que veio dar seguro de saúde a milhões de americanos. Agora, com uma Câmara democrata, essa reforma promete ser ainda mais difícil de negociar.
Ontem os analistas falavam também de acordos na questão das infraestruturas. Ver-se-á.