Formatos made in Portugal. A originalidade compensa?
A falta de investimento, resultado dos baixos recursos financeiros da indústria, leva os canais a não apostarem na criação de formatos originais. Love on Top é uma das exceções
Love on Top, o mais recente reality show da TVI, é um original português que tem despertado interesse internacional depois de apresentado na feira de conteúdos televisivos MipTV, em Cannes. Está a reunir a curiosidade da China, Alemanha, França, Itália, Dinamarca e América Latina, conforme revelou Bruno Santos, diretor de programas do canal de Queluz de Baixo.
Contrariando a tendência do mercado televisivo português de apostar em programas internacionais já testados no estrangeiro, foi o próprio responsável a encomendar aos profissionais da estação e da produtora Endemol um reality/dating show, deixando Lurdes Guerreiro, diretora geral da respetiva produtora, "surpreendida mas satisfeita pela confiança depositada".
Mas se Love on Top está a ter expressão internacional, porque não apostam mais os canais portugueses em formatos originais? "Portugal não tem um mercado financeiramente pujante na área da TV, o que leva a que as estações tenham que gerir muito bem os seus orçamentos, não podendo correr riscos e fazer apostas que, eventualmente, depois possam sair falhadas", explica Frederico Ferreira de Almeida, diretor-geral da produtora FremantleMedia Portugal.
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Macarena Rey, CEO da Shine Iberia, corrobora e acrescenta que, em Portugal, existem apenas duas janelas para o entretenimento em prime time por semana, o que leva a que as estações televisivas produzam pouco e o façam apenas com formatos de êxito comprovado lá fora.
Os responsáveis das televisões portuguesas optam por não avançar com programas criados de raiz por estes exigirem orçamentos elevados. "Quando se avança para um formato de grande dimensão, torna-se necessário construir um cenário. Tudo isso é feito a priori e o grau de investimento com que um programador se vê confrontado faz com que se torne menos confortável", esclareceu Daniel Deusdado, diretor de programas da RTP, que destacou o papel da estação pública como único interveniente no mercado audiovisual a poder sujeitar-se a alguma experimentação e maturação de novos formatos.
Segundo Deusdado, Portugal precisa de traçar um longo caminho para se tornar competitivo no mercado dos conteúdos de entretenimento. "A escala de valor do país precisa de crescer muito para as pessoas pensarem que uma coisa feita em Portugal é algo que pode ser representativo e ter talento para atrair outros pontos do globo. Já conseguimos isso em algumas áreas: na tecnologia, na música e no futebol. No meio audiovisual, ainda não."
Apesar destas dificuldades, a vontade de criar e oferecer aos telespectadores programas inovadores, de preferência portugueses, é unânime e partilhada tanto por produtores como pelos diretores dos canais. "Estamos a trabalhar em três novos formatos. Dois deles são originais portugueses. Estamos a falar de talent show, entretenimento puro e duro e dating", avançou Frederico Ferreira de Almeida.
O passo dado com Love on Top promete, nas palavras de Bruno Santos, ser a primeira aposta de outras da estação de Queluz de Baixo. "Se esta der certo, e até agora está, gostaríamos de tentar fazer outras coisas. Não só reality shows."
Ficção e animação
Se no campo dos programas de entretenimento a produção e o sucesso de formatos nacionais são escassos, o mesmo não se pode dizer dos produtos de ficção nacional e infantis. Nos últimos anos, Portugal tem exportado várias novelas e séries. No caso da SIC, fonte oficial da estação explica que a aposta em "produção própria de conteúdos em português tem sido feita, mas com a opção por formatos de ficção, uma vez que se traduzem em melhores audiências". Angola, Argentina, Bolívia, Bulgária, Chile, Costa Rica, El Salvador, Equador, Estónia, França, são exemplos dos países em que as produções Rosa Fogo, Perfeito Coração e Lua Vermelha já estão.
Como exemplo máximo surge a novela Laços de Sangue, exibido no acesso ao horário nobre em Itália, na RAI. Por sua vez, a TVI tem uma tradição ainda maior na venda de novelas produzidas pela Plural. A Única Mulher ainda não tinha estreado e já tinha sido vendida para Angola. Moçambique e Chile também já exibem a trama.
Esta semana estreou-se o primeiro conteúdo português emitido na TV norte-americana. Os desenhos animados Nutri Ventures, passam no canal Qubo, nos EUA. A série, criada por uma empresa 100% portuguesa, já era transmitida em 19 países ainda antes dos direitos de transmissão terem sido vendidos para os Estados Unidos.