Entre a "curiosidade" e a "resistência". Crianças ucranianas aprenderam português em Odivelas

Cerca de 25 jovens que fugiram da guerra na Ucrânia, com idades entre 6 e os 15 anos, aprendem português desde julho na Escola Básica D. Dinis.

Na véspera do arranque do ano letivo nas escolas de Odivelas, um grupo de jovens ucranianos teve quinta-feira a sua última aula de Português, em que tiveram de desenhar e descrever o regresso às aulas.

Duas alunas mostram um talento natural para o desenho, com um traço inspirado na banda desenhada, e, na fila da frente, um rapaz tenta conjugar os verbos em português, mas, com a ajuda da professora, Iolanda Fernandes, o jovem vira-se para o amigo e diz com um sorriso: "Ele está a brincar comigo."

Depois de fugirem da guerra e serem acolhidos em Portugal com as famílias, cerca de 25 jovens da Ucrânia começaram a aprender português, na Escola Básica D. Dinis, em julho, e voltaram a estas aulas na primeira quinzena de setembro, sendo que o último dia de aulas conta apenas com oito jovens a estudarem uma língua que desconheciam.

"Nós procuramos ensinar os conteúdos mais importantes para as situações que vão encontrar no dia-a-dia, na escola e na rua", explica Iolanda Fernandes, que dá aulas de Língua Portuguesa não materna e procurou, durante três horas por dia, dar o "básico" do português, o equivalente ao nível A1 no quadro europeu de referência para as línguas.

Apesar de reconhecerem uma "evolução" ao longo das aulas e de a turma perceber o que lhe é pedido, a professora e a tradutora veem os estudantes, de idades entre os 6 e os 15 anos, com ritmos diferentes.

"Uns meninos têm mais facilidade de aprender, outros demonstram muita resistência. Acho que isso está relacionado com a experiência que passaram na Ucrânia", constata a tradutora de ucraniano - português Anna Hutsul, que acompanhou as aulas, ao mesmo tempo que reconhece uma maior necessidade de acompanhamento das crianças do ensino primário porque "apanharam o início da pandemia, a guerra e não aprenderam a escrever ucraniano".

Já Iolanda acredita que alguns jovens "vêm com a expectativa de voltar e se calhar sentem que não necessitam de aprender a língua portuguesa", embora outros mostrem "curiosidade e vontade de aprender".

O chefe da divisão dos programas de educação, igualdade e cidadania da Câmara de Odivelas, Bruno Santos, admite que o acolhimento dos jovens nos últimos meses "não foi fácil" por se tratar "de um processo complexo montado num curto espaço de tempo".

"Tivemos dificuldades em encontrar professores disponíveis para poder disponibilizar este apoio suplementar" aos deslocados da guerra, reconhece Bruno Santos, que se mostra sensível aos ainda escassos conhecimentos de português dos jovens: "se houver a necessidade de reforço da língua portuguesa, podemos fazê-lo".

Esta iniciativa fez parte do programa "Férias em português", desenvolvido em julho para jovens deslocados da guerra na Ucrânia, em que as aulas decorriam de manhã e depois faziam atividades à tarde, como programas desportivos, idas à praia, aulas de 'surf' e experiências culturais.

Os jovens ucranianos em Odivelas olham para o início do ano letivo na sexta-feira com um misto de sentimentos, entre o entusiasmo de recomeçar as aulas e a vontade de regressar ao país do seu coração.

Ainda assim, para os estudantes do ensino básico, é mais fácil estarem próximos do seu país: o ano letivo na Ucrânia começou em 1 de setembro e os alunos do ensino básico têm aulas 'online' a partir de Portugal nas escolas ucranianas. "Trabalham aqui de manhã e depois vão para as aulas da Ucrânia até à noite", descreve Anna, que diz admirar o esforço dos jovens.

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