Barreiro está em Lisboa para mostrar tesouros dos seus tempos áureos
A CUF foi o maior complexo industrial no século XX na Península Ibérica. Até 31 de março, o espólio que retrata a vida naquela região está exposto na Gare Marítima de Alcântara.
Os tempos áureos do Barreiro como cidade industrial de referência em Portugal e na Península Ibérica, desde o início do século XX, estão retratados uma exposição Gare Marítima de Alcântara, até 31 de março. Ali estão expostos "Os Tesouros dos Arquivos do Barreiro... em Lisboa". O objetivo é recordar a história e promover o interesse por esta cidade da margem sul do Tejo, com uma programação diversificada que inclui colóquios, um torneio de xadrez e terminará com a Sunset Archive Party.
Um pano com indicações de como fazer os primeiros socorros no caso de haver um acidente de comboio, um cartaz dos sindicatos corporativos no início da ditadura, com promessas não cumpridas pelo regime, tais como o seguro de vida, invalidez e incêndio, e um outro cartaz da campanha de Norton de Matos com a frase "Garanti o futuro contra um sistema em que todos pagam muito e poucos recebem pouco", abrem esta exposição. "Quisemos começar por estes cartazes porque dão um bom exemplo da diversidade que aqui temos", afirma José Pacheco Pereira, historiador e responsável do Arquivo Ephemera.
Esta exposição foi transferida para Lisboa para lembrar toda a história do Barreiro e que pode ter na capital uma boa forma de ter destaque. "A ideia de trazer estes arquivos para Lisboa foi para mostrar que alguns dos arquivos mais importantes sobre a história portuguesa do século XX estão no Barreiro e não em Lisboa", afirma Pacheco Pereira.
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Estão reunidos na Gare Marítima de Alcântara elementos relevantes da história política e social de Portugal e do Barreiro. "Era uma terra operária e temos aqui tudo o que diz respeito ao mundo operário, aos conflitos, às greves, às prisões, às estruturas antes do 25 de abril. Do ponto de vista da história da nossa indústria, a CUF é a principal unidade, além de ser uma empresa que tentou inovar durante grande parte da sua existência", resume.
Esta exposição inclui o espólio cinco arquivos, que estão instalados no Parque Empresarial da Baía do Tejo do Barreiro, onde estava instalada a antiga CUF: o Arquivo dos Portos de Lisboa, Setúbal e Sesimbra, o Centro de Documentação do Museu Industrial da Baía do Tejo, o Arquivo Ephemera, o Espaço Memória e o Arquivo Fundação Amélia de Mello.
O Arquivo dos Portos de Lisboa, Setúbal e Sesimbra forneceu diversos documentos desde o século XIX até à atualidade, entre os quais fotografias, cartografias e processos históricos relativos à atividade portuária. O Centro de Documentação do Museu Industrial da Baía do Tejo incluiu objetos referentes ao início da construção das fábricas e ao que elas produziam. Já o Arquivo Ephemera contribuiu com livros, manuscritos, documentos e objetos relacionados com a memória da história social, cultural, sindical e política contemporânea. O Espaço Memória, por sua vez, cedeu a documentação sobre a história do Barreiro, da CUF e ainda relativa ao mundo operário e ao desporto na cidade. Finalmente, o Arquivo Fundação Amélia de Mello contribuiu para a exposição com peças emblemáticas do ponto de vista da história empresarial e económica de Portugal.
As várias mesas reúnem objetos e documentos que explicam a história portuguesa do século XX mas também do Barreiro e da CUF e é nesse contexto que o Arquivo Ephemera concedeu uma grande quantidade de materiais da resistência e de propaganda contra o antigo regime.
Um dos objetos mais curiosos que pode encontrar na Gare Marítima de Alcântara é o chapéu de um comando português com o nome das operações em que ele participou. "Algumas destas operações foram feitas em conjunto com os rodesianos, e portanto eram operações duplamente secretas pois a colaboração com rodesianos não era admitida por ninguém", explica Pacheco Pereira. A Rodésia [onde atualmente é o Zimbabwé] foi um estado não reconhecido no sul de África durante a Guerra Fria.
A história desportiva do Barreiro está em destaque com vários documentos, nomeadamente do Barreirense, incluindo cartazes de promoção de jogos de futebol, bilhetes de uma partida com o Dínamo Zagreb para a Taça das Cidades com Feiras, e até um outdoor para um encontro de basquetebol com o Benfica. O Arquivo Municipal do Barreiro quis reunir documentos de alguns desportistas do Barreiro, que se tornaram relevantes a nível nacional.
O Barreiro, no distrito de Setúbal, cresceu em torno do complexo industrial da CUF, que se instalou na cidade em 1907 e se tornou no maior complexo industrial da Península Ibérica do século XX e um dos maiores da Europa. No seu auge o Barreiro chegou a ter 12 mil operários. A CUF produzia e comercializava diversos produtos como adubos, sabões, velas, óleos vegetais, entre outros.
A dimensão social e cultural da CUF está presente nesta exposição com documentos do cinema, das creches e dos refeitórios, dos equipamentos desportivos, que eram infraestruturas que estavam dentro do complexo industrial e que permitiam aos operários viver toda uma vida dentro desta empresa.
Atualmente, o complexo industrial da antiga CUF é gerido pela Baía do Tejo e lá se encontram estúdios de artistas e arquivos, além de 240 empresas de vários setores, como serviços, indústria e logística.
sara.a.santos@dn.pt
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