A caminho do Património Mundial, Vila Viçosa quer passar a ser cidade

Conhecida pelo seu património histórico e pelos monumentos renascentistas, a vila pretende agora ser cidade. "Vila Viçosa não vai perder o seu estatuto", garante a autarquia.
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A localidade alentejana de Vila Viçosa pode vir a ser elevada a cidade ainda este ano. Depois de, no anterior mandato autárquico, ter sido apresentada a candidatura a Património Mundial da UNESCO, foi agora aprovada a elevação do estatuto da vila alentejana.

A decisão foi aprovada por maioria em Assembleia Municipal, com votos a favor do Movimento por Vila Viçosa (coligação composta por PSD, CDS e independentes), que governa a autarquia. O PS e a CDU apresentaram também outra proposta, que incluía um referendo à população sobre o assunto, que acabou por ser rejeitada.

Ao DN, Tiago Passão Salgueiro, vice-presidente da autarquia com os pelouros da Cultura e do Turismo, explica que "a ideia surgiu porque o atual Executivo considera ser essencial para atingir um conjunto de objetivos", nomeadamente ao nível dos fundos comunitários, que podem ser importantes para o desenvolvimento do município. "Ao passar a ser cidade, Vila Viçosa pode ser colocada num patamar mais elevado, que permite outro desenvolvimento", considera o responsável. Além da candidatura a fundos da União Europeia, o plano é, revela Tiago Passão Salgueiro, "poder passar a integrar as redes de cidades ibéricas e transfronteiriças e, com isso, poder participar em projetos que sejam importantes para Vila Viçosa".

Numa publicação na rede social Facebook, o autarca calipolense já tinha explicado que esta decisão é vista como essencial para tornar o município "atrativo e competitivo, depois de anos de marasmo".

CitaçãocitacaoAo passar a ser cidade, Vila Viçosa pode ser colocada num patamar mais elevado que permite outro desenvolvimento.

No entanto, quando se soube da decisão do Executivo, a receção não foi, numa fase inicial, a mais positiva, com os habitantes de Vila Viçosa a manifestarem-se sobretudo nas redes sociais. As reivindicações eram comuns: ao passar de vila a cidade, a população calipolense tinha receio de que passasse a haver um aumento de taxas e de impostos municipais, ao mesmo tempo que temiam pela memória histórica da localidade. Algo que, assegura Tiago Passão Salgueiro, não vai acontecer. "A discussão foi muito saudável e até teve a sua pertinência, mas é importante ressalvar que Vila Viçosa não vai perder o seu estatuto, nem sequer vai haver mais taxas para as pessoas. Aquilo que queremos é ser mais competitivos", esclarece.

Aliada a esta elevação a cidade está também a candidatura a Património Mundial. Aquando da entrada do novo Executivo municipal, após as autárquicas do ano passado, a proposta - que tem a sua origem em meados dos anos 1990 - voltou a ser repensada, depois das recomendações apresentadas pela Comissão Nacional da UNESCO. Nesse sentido, foi criado "um novo gabinete para começar a reformular a proposta de candidatura de acordo com o que foi pedido", explica Tiago Passão Salgueiro. "A reformulação é muito importante e, por isso, estamos muito empenhados nisso. É importante que assim seja", considera.

Ao ser, simultaneamente, cidade e património mundial, Vila Viçosa pode passar a ter "uma porta aberta para o desenvolvimento do concelho" que, segundo dados dos últimos Censos, perdeu 934 habitantes. A população é, de resto, um dos critérios para a elevação a cidade.

Segundo a Lei 11/82, de 2 de junho, uma vila só pode passar a cidade "quando conte com um número de eleitores, em aglomerado populacional contínuo, superior a oito mil". Apesar deste critério não ser cumprido, uma vez que, em dez anos, Vila Viçosa passou de 8319 habitantes, em 2011, para 7385 residentes no espaço de dez anos, o vice-presidente da autarquia calipolense, relembra que a vila - onde nasceram figuras como Florbela Espanca ou Bento de Jesus Caraça - "tem, como é sabido, um elevado património histórico", uma das exceções previstas na lei, onde se incluem também "razões de natureza cultural e arquitetónica".

Depois de aprovada a proposta em reunião de Câmara e na Assembleia Municipal, segue-se agora a redação dos argumentos que serão enviados para a Assembleia da República, que tem a última palavra sobre a mudança do estatuto de Vila Viçosa. A expectativa é de que haja uma decisão até final do ano, revela Tiago Passão Salgueiro.

"Estamos agora a começar a escrever o documento. Apesar de não termos todos os critérios, correspondemos a grande parte e é nesses que nos foquemos", explica o vice-presidente da autarquia. Quanto à candidatura a Património Mundial, o autarca não tem expectativa sobre a decisão, que considera "vir trazer vantagens para todos os calipolenses".

Património histórico e cultural jogam a favor

Historicamente, Vila Viçosa tem um forte património histórico e cultural, com o maior ex-libris a ser o Paço Ducal que, em tempos, serviu de casa de férias real nos diferentes reinados portugueses e de sede do ducado de Bragança, cuja construção se iniciou em 1577. Outra das construções importantes da vila alentejana é o castelo que, após a Reconquista Cristã, foi mandado construir por D. Dinis. É no castelo que se situa o Santuário de Nossa Senhora da Conceição, considerada padroeira de Portugal, que o Papa João Paulo II visitou em 1982. Além do património histórico, Vila Viçosa é também o local onde nasceram figuras importantes da cultura portuguesa, como a poetisa Florbela Espanca, o matemático Bento de Jesus Caraça ou o pintor Henrique Pousão. A vila é também conhecida pelo papel que tem na exploração do mármore.

Uma em 16

A região do Alentejo é, em termos geográficos, a maior de Portugal. No entanto, a desertificação e a falta de oportunidades afastam cada vez mais as populações. Ao olhar para o mapa, e fazendo-se um levantamento do número de cidades na região - não tendo em conta a divisão por Nomenclatura das Unidades Territoriais para Fins Estatísticos (NUTS) -, é possível perceber que, apesar da vasta área, o Alentejo tem apenas 16 cidades. Uma lista da qual Vila Viçosa quer fazer parte, juntando-se às cidades vizinhas de Borba e Elvas.

População superior a oito mil mas...

Segundo a Lei n.º 11/82, de 2 de junho, um dos critérios para uma vila passar a ser cidade é a população, que não pode ser inferior a oito mil. Além disso, decreta o diploma, é necessário ter pelo menos metade de um conjunto de serviços, como instalações hospitalares com serviço de permanência, farmácias, museus e bibliotecas, ou ainda instalações de hotelaria. A mesma lei especifica que, apesar dos critérios, pode haver "razões de natureza histórica que poderão justificar uma ponderação diferente" dos requisitos, razão pela qual Vila Viçosa pode vir a ser cidade.

rui.godinho@dn.pt

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