Câmara de Lisboa diz que "não faz sentido" apoiar construção de mesquita nem outros templos
O vice-presidente da Câmara de Lisboa, Filipe Anacoreta Correia (CDS-PP), disse esta sexta-feira que "não faz sentido" um poder público associar-se à construção de um templo religioso, atribuindo às comunidades a responsabilidade quanto a uma eventual nova mesquita na Mouraria.
"Relativamente ao processo que herdámos [de construção de uma mesquita na Mouraria], no entender deste executivo não faz sentido associar um templo religioso, independente da religião a que se refere, a uma determinada comunidade nacional. Não temos esse histórico. Nunca, julgo eu, nenhum poder público se associou à construção de uma sinagoga para os judeus polacos ou os judeus de Marrocos ou para uma igreja de uma determinada comunidade nacional ou para uma mesquita para uma determinada comunidade nacional", afirmou Anacoreta Correia, referindo-se ao apoio específico a determinadas comunidades de um país e não à colaboração com diferentes religiões.
O autarca falava no âmbito de uma audição com as 3.ª e 6.ª comissões da Assembleia Municipal de Lisboa (AML), que fiscalizam as áreas de Urbanismo e Direitos Humanos e Sociais, respetivamente, e que estão a avaliar a eventual construção de uma nova mesquita na Mouraria, processo que se arrasta há mais de década.
"Não podemos deixar de estranhar o contraste muito evidente entre aquilo que se foi dizendo e as expectativas que se foram criando e aquilo que efetivamente se fez, e tratando-se de uma comunidade vulnerável, esse contraste é mais chocante, é bastante chocante", declarou Anacoreta Correia.
Aos deputados municipais, o autarca disse que este processo é "no mínimo tortuoso", referindo que teve início em 2009, com o então presidente da câmara António Costa (PS), em que a primeira deliberação ocorreu em 2012 quanto à criação da Praça da Mouraria e, depois, em 2015 houve a declaração de utilidade pública de expropriação, com caráter urgente, de três prédios particulares na Rua do Benformoso.
O vice-presidente da câmara disse ainda ter conhecimento de um protocolo celebrado em 2013 entre o município e a Centro Islâmico do Bangladesh - Mesquita Baitul Mukarram para a instalação da mesquita, no âmbito do projeto da Praça da Mouraria, mas ressalvou que "não houve nenhuma deliberação" para o aprovar.
"Não basta haver um papel para ele existir institucionalmente", salientou, rejeitando obrigações da câmara no cumprimento desse protocolo.
De acordo com o autarca do CDS-PP, em 2016 foi adjudicada ao município a propriedade de dois dos prédios expropriados, que eram de António Barroso, que impugnou judicialmente o processo, e, de acordo com a lei, até 2018 a câmara teria de alocar estes imóveis ao fim para o qual foi efetuada a expropriação, no entanto "nada fez" até essa data e também "nada aconteceu de 2019 a 2021", período em que o município estava sob gestão do PS.
"Partindo do princípio que não é uma matéria de incompetência, houve certamente uma decisão de não dar seguimento a este processo", apontou Anacoreta Correia.
Contestando esta posição, o deputado do PS Pedro Roque considerou que "não há dúvidas sobre a validade" do protocolo de 2013, que inclui um estudo prévio de arquitetura da Praça da Mouraria, argumentando que houve "muita coisa a acontecer".
O socialista acusou ainda o atual executivo, sob gestão de PSD/CDS-PP, de "deliberadamente" dar instruções para que o processo fosse interrompido.
O vice-presidente da câmara referiu que existem, neste momento, seis mesquitas ativas na Mouraria e reforçou que Lisboa é uma cidade plural que respeita o direito constitucional de liberdade religiosa.
"Desde que tomámos posse [em outubro de 2021], não tivemos nenhum pedido formal relativamente a uma comunidade sobre qualquer envolvimento da câmara na construção de uma mesquita", adiantou.
Indicando que a autarquia apoia projetos que pugnem por uma vivência "pacífica e respeitadora desse mesmo pluralismo", mas numa perspetiva "que não seja nem de guetização, nem especificamente dirigido a uma determinada comunidade nacional", Ancoreta Correia sublinhou que "será sempre a partir das comunidades que os projetos terão de ser desenvolvidos".
Quanto à eventual mesquita na Mouraria, o autarca salientou ainda que "não se pode ignorar a existência da Mesquita Central de Lisboa", espaço de culto da comunidade islâmica que "tem ainda uma capacidade muito superior àquela que hoje é a procura em termos de espaço de frequência", estando a "1/3 da sua capacidade potencial".