Proposta da LusoLav apresenta solução de duas novas pontes sobre o Douro, separando linha de alta velocidade e rodovia.
Proposta da LusoLav apresenta solução de duas novas pontes sobre o Douro, separando linha de alta velocidade e rodovia.DR

Alteração ao traçado do TGV em Gaia. O que está em causa?

Duas novas pontes sobre o Douro, uma estação em Reserva Ecológica Nacional e menos quilómetros em túnel alimentam o debate sobre a nova proposta do consórcio LusoLav para a alta velocidade em Gaia.
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Depois de a proposta de alteração ter sido aprovada pelo executivo da Câmara Municipal de Gaia na quinta-feira à tarde, com votos contra dos vereadores do PSD, a concorrida Assembleia Municipal gaiense marcada para essa noite deliberou, já na madrugada desta sexta-feira, adiar a votação de pareceres não vinculativos a um traçado alternativo da linha de alta velocidade (TGV) para depois das eleições legislativas de 18 de maio.

A proposta de adiamento apresentada pelo Bloco de Esquerda e aprovada por larga maioria (à exceção de CDU e IL) argumenta a necessidade de mais tempo para “ter em conta todas as informações e avaliações necessárias” sobre a proposta que apanhou quase toda a gente de surpresa nos últimos dias, à exceção do executivo da autarquia de Gaia, liderado por Eduardo Vítor Rodrigues, que já há algum tempo vinha mantendo reuniões com o consórcio LusoLav sobre a proposta de alteração do traçado da linha de alta velocidade em Vila Nova de Gaia.

O consórcio LusoLav, composto por empresas como Mota‑Engil, Teixeira Duarte, Alves Ribeiro, Casais, Conduril e Gabriel Couto, apresentou uma série de mudanças ao traçado do TGV no concelho que, se implementadas, terão implicações profundas quer na infraestrutura, quer na mobilidade e no planeamento urbanístico da região.

Que alterações são propostas? Duas pontes, uma nova estação, menos túneis

Inicialmente prevista para ficar na área de Santo Ovídio, a nova proposta desloca a estação de alta velocidade cerca de dois quilómetros para sul, para a zona de Vilar do Paraíso, delimitada pela Rua da Junqueira de Cima, Rua e Travessa do Guardal de Cima e Travessa de Belo Horizonte, na localidade de São Caetano.

Essa mudança implica um prolongamento da Linha Rubi do Metro do Porto até à nova localização, além de um conjunto de acessibilidades rodoviárias, e retira à estação ferroviária a ligação direta à Linha Amarela do Metro do Porto (assim como um duplo interface com a Amarela e Rubi) como estava previsto para Santo Ovídio.

A nova localização proposta pelo LusoLav para a estação ferroviária de alta velocidade em Gaia está por cima de uma ribeira, e por isso em zona de Reserva Ecológica Nacional.

A estação, tal como a inicialmente projetada para Santo Ovídio, será da autoria do arquiteto Eduardo Souto Moura (com André Campos), contemplando ainda um parque urbano da autoria do arquiteto paisagista Sidónio Pardal.

Outra alteração significativa consiste na substituição da solução original de uma ponte rodoferroviária que atravessaria o Douro por um conjunto de duas pontes distintas, separando os modos ferroviário e rodoviário. O consórcio defende a mudança para diminuir os riscos de financiamento, de incumprimento de prazos e para clarificar as responsabilidades de manutenção.

Além das mudanças no traçado e na ponte, o novo projeto implica uma redução da obra em túnel. Enquanto o estudo prévio previa a extensão de 13 km na região de Gaia – com 10 km em túnel –, a proposta atual inverte os papéis, limitando a execução de túneis a cerca de 5 km e aumentando a parte em escavação, aterros e a construção de muros.

Essa alteração gera preocupações quanto ao aumento do impacto na superfície e à sobreposição com infraestruturas existentes, sobretudo em zonas densamente urbanizadas ou próximas de áreas habitacionais.

Nova estação de TGV em Gaia proposta pela LusoLav é situada em zona de Reserva Ecológica Nacional
Nova estação de TGV em Gaia proposta pela LusoLav é situada em zona de Reserva Ecológica NacionalDR

Câmara de Gaia aprova, Governo e Porto desconhecem

Na reunião extraordinária da Câmara de Gaia, quinta-feira, as propostas do consórcio foram aprovadas pela maioria socialista – com votos contrários dos vereadores do PSD, que classificaram o novo traçado como “imperfeito”, com impactos negativos durante a execução e para o futuro, nomeadamente em termos de acessibilidades e encargos financeiros. Foram assinaladas ainda questões de transbordo para utilizadores do metro da linha Amarela, que perderiam assim o interface com o TGV, e a possibilidade de encargos municipais na manutenção de uma ponte rodoviária separada.

“Vejo com alguma preocupação estas alterações ao estudo prévio inicial. Por um lado, o que estava previsto era que o território de Vila Nova de Gaia ia ter um atravessamento na ordem dos 13 quilómetros e cerca de 10 seriam em túnel, e o remanescente em escavação, e agora invertem-se os papéis, cerca de cinco quilómetros em túnel e o remanescente em escavação", disse o vereador social-democrata Rui Rocha Pereira, para quem a nova solução traria "enormes impactos junto da população quer durante a execução da obra, pelos atravessamentos", mas também "para futuro", com "impactos visuais, impactos acústicos e demais".

Acresentou "alguma preocupação com a questão de termos duas pontes em vez de uma ponte", "por uma questão de financiamento", alertando para a possibilidade de haver encargos para os municípios na gestão de uma ponte separada. E considerou ainda uma perda grande a possibilidade de não haver ligação direta a duas linhas metro em Santo Ovídio, mas apenas a uma (a linha Rubi, que teria de sofrer uma extensão) na nova solução proposta para a estação, mais a sul. O que, disse, põe em causa "a joia da operação".

Já o autarca socialista Eduardo Vítor Rodrigues sublinhou que a aprovação desta solução não é vinculativa e permite apenas “abrir o debate”. A decisão será tomada pelo governo que sair das próximas eleições legislativas e pela Infra-Estruturas de Portugal.

Eduardo Rodrigues disse que a nova proposta não anula a solução anterior, referindo que "a estação de Santo Ovídio será sempre uma alternativa viável até decisão por parte da tutela" e que "em nenhuma circunstância, poderá estar em causa a estação de Gaia ou o projeto nacional, elemento central para o projeto e para a região".

Entre as vantagens apontadas pelo executivo gaiense à nova proposta do consórcio LusoLav está o facto de a nova localização da estação em Vilar do Paraíso poder melhorar a conectividade regional por estar “equidistante” dos grandes eixos rodoviários A1, IC1 e A29.

Pela Lusolav, Rui Guimarães garantiu na reunião extraordinária do executivo camarário, quinta-feira, que estas alterações não estão relacionadas com custos, sublinhando até que “esta [nova] estação é muito mais cara para nós”. Mas adiantou que é mais fácil garantir financiamento com esta nova solução do que com uma estação a 60 metros de profundidade.

Apesar das propostas apresentadas pelo consórcio LusoLav, a Infraestruturas de Portugal afirma não ter sido informada sobre qualquer alteração à proposta originalmente apresentada ao concurso público. Do lado do Governo, há apenas a indicação de que o Ministério das Infraestruturas e Habitação se encontra em diálogo com a IP sobre o assunto.

Também a Câmara do Porto diz desconhecer as alterações no projeto, especialmente no que diz respeito à possibilidade de se construir duas pontes entre Gaia e Porto, mas Eduardo Vítor Rodrigues garante sintonia com o homólogo portuense Rui Moreira.

O debate prolongar-se-á seguramente após as eleições legislativas antecipadas. A polémica, essa, é garantida

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