Milhares de ucranianos saíram para as ruas de Kiev e de outras cidades na terça à noite e na quarta contra a lei que retira competências a dois organismos de luta contra a corrupção. O mote do protesto, dirigido a Volodymyr Zelensky, foi “Veta a lei!”, porém este acabou por promulgá-la. Perante a inédita oposição nas ruas e as críticas e advertências oriundas de aliados europeus, o presidente afirmou que a medida é necessária para combater a “influência russa”, mas disse ter ouvido a sociedade e deu um prazo de duas semanas para que as autoridades visadas na lei e o sistema de justiça apresentem um plano de ação conjunto para responder às preocupações levantadas. A nova lei, aprovada na manhã de terça-feira no parlamento com 263 votos a favor e apenas 13 contra, e promulgada à tarde, retira poderes à Agência Nacional de Luta Anticorrupção (NABU) e ao Gabinete do Procurador Especializado Anticorrupção (SAPO), dois órgãos independentes, em favor do procurador-geral, o qual é nomeado pelo presidente. Na véspera, foram conduzidas buscas nos escritórios das duas agências quando as respetivas chefias se encontravam em visita de trabalho no Reino Unido. Em resultado, um funcionário da NABU foi detido por suspeitas de espionagem pró-russa. Na terça-feira, Zelensky comentou a desqualificação das agências ao dizer que a “infraestrutura anticorrupção vai continuar operacional, mas sem a influência russa”. Mas até a deputada do seu partido Anastasia Radina, que preside à comissão anticorrupção, tem dificuldade em “compreender como é que as disposições deste projeto de lei combatem os alegados agentes russos” na NABU e no SAPO.Segundo fontes ouvidas pelo Kyiv Independent, estas mudanças, que representam um reforço do poder presidencial, foram motivadas por recentes investigações ao círculo de Zelensky. Oleksiy Chernyshov, vice-primeiro-ministro até à remodelação governamental da semana passada, foi acusado de suborno e abuso de poder no mês passado; e um familiar de Timur Mindich, coproprietário da produtora Kvartal 95, com Zelensky, é suspeito de peculato. (Refira-se que o referido site noticioso foi alvo de um ciberataque depois da cobertura noticiosa e de um editorial crítico de Zelensky). Enquanto os ucranianos passaram da indignação das redes sociais para as ruas - em especial os jovens -, o tema ultrapassou as fronteiras. Primeiro coube à embaixadora da UE na Ucrânia, Katarína Mathernova, afirmar a necessidade de “preservar os resultados das reformas”. Os embaixadores dos países pertencentes ao G7 foram mais diretos e mostraram “sérias preocupações” com o retrocesso da separação de poderes. O tom foi subindo, da comissária Marta Kos à presidente da Comissão Ursula von der Leyen ou ao ministro alemão Johann Wadephul. “Limitar a independência das agências anticorrupção impede a Ucrânia de avançar no caminho para a UE”, afirmou o chefe da diplomacia de Berlim, que transmitiu essa mensagem ao homólogo ucraniano, Andrii Sybiha.Perante a pressão nas ruas e das chancelarias, Zelensky encontrou-se com as chefias das agências visadas. Depois de ter dito que “ouve o que a sociedade tem a dizer”, prometeu resolver as contradições existentes com a aprovação da lei e pediu duas semanas para se avançar com um plano de ação. Mais tarde, na sua alocução diária aos ucranianos, Zelensky anunciou que vai propor um novo projeto de lei à Verkhovna Rada para “reforçar o sistema de aplicação das leis” contra a corrupção. “Todas as normas que garantem a independência das instituições de combate à corrupção serão respeitadas”, disse. A desconfiança, porém, instalou-se. .Zelensky tenta conter protestos a lei que retira autonomia às agências anticorrupção.Rússia diz ter proposto à Ucrânia tréguas de "24 a 48 horas" e aceitado troca de presos