Vozes contra Sánchez no PSOE por indultos aos presos catalães
A eventual decisão de aprovar um indulto aos líderes independentistas catalães, que tem o parecer negativo (não vinculativo) do Supremo Tribunal, não gera apenas críticas dentro da oposição, sendo também vista com maus olhos por alguns dirigentes socialistas. A meio do mandato, o primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez, parece contudo querer avançar no diálogo com a Catalunha e os presos serão sempre uma bomba relógio à espera de explodir.
Sánchez indicou que irá tomar uma decisão tendo em conta "valores constitucionais como a concórdia, o entendimento" a pensar "na superação de uma crise que dilacerou o conjunto da sociedade espanhola em 2017". E reiterou: "O entendimento, o encontro, esses princípios serão os que vão pesar como presidente do governo. O que não são princípios constitucionais são a vingança ou a desforra", disse. O líder da oposição, Pablo Casado, reagiu de imediato: "Cumprir a lei não é vingança, defender a unidade nacional não é desforra e dar um golpe de Estado não é um valor constitucional", escreveu no Twitter. O PP quer o primeiro-ministro no congresso na próxima semana para debater o tema.
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Em outubro de 2019, nove líderes independentistas - incluindo o líder da Esquerda Republicana da Catalunha (ERC), Oriol Junqueras - foram condenados a penas entre os 9 e os 13 anos de prisão por sedição e peculato na organização do referendo de 1 de outubro de 2017. Outros três foram condenados por desobediência e ao pagamento de uma multa. Mais de três anos e meio depois de terem sido detidos, poderá estar por semanas a decisão sobre um indulto.
A decisão está nas mãos do governo de Sánchez, que espera abrir a mesa de diálogo prometido com o novo executivo catalão - liderado por Pere Aragonès, da ERC - e aproveitar para ter maior estabilidade parlamentar. A sua coligação minoritária com a Unidas Podemos precisa do apoio de outras formações políticas, entre elas a própria ERC. O primeiro-ministro disse contudo que este último aspeto não é tido em conta: "Tomaríamos a mesma decisão com 300 deputados ou com 120 que são os que tem o grupo socialista, em nome da concórdia, da convivência e do encontro entre os espanhóis."
Mas não é apenas a oposição que está contra. Dentro do PSOE há divisão e quem não concorde com o indulto. É o caso do presidente da comunidade de Castela-Mancha, Emiliano García-Page: "Mais do que uma medida de graça, parece-me uma enorme desgraça. Há muitos argumentos jurídicos e políticos para pensar que a hipótese do indulto pode ser um dos mais graves erros da democracia". Ou o líder do governo da Estremadura, Guillermo Fernández Vara: "É evidente que não deve ser indultado quem não o quer ser porque não respeita nem acredita nas leis que o tornam possível. É igualmente evidente que os problemas que tem o nosso país de construção de um modelo de convivência não se resolverão enquanto ninguém o quiser", escreveu no Twitter.
O tema divide também ex-primeiros-ministros socialistas. "Nestas condições, eu não daria o indulto aos presos do processo", disse Felipe González num programa da Antena 3. Já José Luis Zapatero colocou-se do lado de Sánchez, dizendo que pode ajudar a melhorar a situação "entre Catalunha e o resto de Espanha, que o independentismo perca força e que o diálogo seja recuperado", disse à La Sexta. Defendeu que é o passo a tomar, mesmo que a decisão seja "difícil", lembrando que também não foi fácil para ele negociar com a ETA ou aprovar o casamento homossexual, mas que ambas as ações se revelaram acertadas.
A ministra das Finanças e porta-voz do governo, María Jesús Montero, lembrou aos "barões" do PSOE que se mostraram contra o indulto que a decisão cabe ao executivo, tendo em conta "o interesse geral". Mas apesar de a decisão vir de cima, as consequências vão ser sentidas por todos os socialistas, com o PP a prometer levar o debate a todas as oito mil câmaras e municípios do país, obrigando todos os eleitos socialistas a pronunciarem-se sobre o tema e a defender ou rejeitar a posição de Sánchz.
O indulto não é a amnistia que defendem os condenados, sendo os dois conceitos diferentes. O primeiro prevê o perdão da pena (parcial ou total), enquanto o segundo funciona como um perdão do crime. Ou seja, no caso do indulto é reconhecido na mesma a existência do crime, enquanto no caso da amnistia é como se os condenados não tivessem cometido qualquer crime, não ficando sequer com antecedentes penais.
"Nunca pedimos nem pediremos um indulto", disse um dos presos independentistas, o presidente da Ómnium Cultural, numa entrevista ao DN, publicada na semana passada. "Não me arrependo de nada do que fiz", acrescentou, indicando defender a amnistia "porque é a única solução global contra a repressão que afeta mais de 3300 cidadãos, que veem os seus direitos civis e políticos violados, sob acusações sem qualquer credibilidade". Nenhum dos nove condenados pediu o indulto (o processo foi desencadeado por terceiros), mas questionados sobre o tema pelo Supremo Tribunal, optaram por ficar em silêncio - à exceção de Cuixart.
Ao abrigo da Constituição, o indulto é dado pelo rei, mas a decisão é tomada pelo governo. No caso do indulto total, seria preciso um parecer favorável do tribunal que pronunciou a sentença - neste caso o Supremo Tribunal. Mas isso não é necessário no caso de indulto parcial - aquele que está a ser estudado, tendo a maioria dos presos já cumprido mais de três anos e meio de prisão. O Supremo pronunciou-se esta semana contra a hipótese de indulto. Os juízes consideram que o princípio da proporcionalidade das sentenças não foi violado e que não existe qualquer arrependimento da parte dos condenados.