Joan Donoghue referiu que o tribunal tomou nota de declarações proferidas por dirigentes israelitas com “linguagem desumanizadora” utilizada contra os palestinianos.  EPA/Remko de Waal
Joan Donoghue referiu que o tribunal tomou nota de declarações proferidas por dirigentes israelitas com “linguagem desumanizadora” utilizada contra os palestinianos.  EPA/Remko de Waal

Tribunal das Nações Unidas dá um mês para Israel salvar a face

Coletivo de Haia decidiu levar por diante investigação sobre possível genocídio levado a cabo pelo exército israelita e ordenou a Telavive que tome medidas para o fim das mortes no enclave e preste assistência humanitária eficaz.   
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Quinze dos 17 juízes do Tribunal Internacional de Justiça (TIJ) concordaram dar provimento ao pedido de urgência da África do Sul para se tomarem medidas na Faixa de Gaza, entre as quais prevenir atos de genocídio e permitir a entrada de ajuda de forma “imediata e eficaz”. Ainda assim, o coletivo de Haia não tomou a decisão mais dura contra Israel, que seria decretar um cessar-fogo - sobre o qual, de qualquer das formas, o primeiro-ministro israelita já tinha afirmado que não iria respeitar. 

Foi um dia de emoções fortes junto do Palácio da Paz, na capital dos Países Baixos, mas também em muitos outros pontos onde a leitura da decisão do TIJ, órgão das Nações Unidas, foi seguida em direto. O que estava em causa era saber, em primeiro lugar, se os juízes acolhiam o caso apresentado por Pretória; e em segundo, se iriam determinar medidas de emergência sobre a guerra em curso.

A norte-americana Joan Donoghue, presidente do coletivo de juízes, deitou por terra a pretensão de Telavive - o arquivamento da ação de Pretória - ao confirmar que o tribunal tem jurisdição para analisar o processo. “Pelo menos alguns dos atos e omissões cometidos por Israel em Gaza parecem poder ser abrangidos pelas disposições da Convenção sobre o Genocídio”, disse, abrindo a porta para um processo que poderá durar anos.

Dois juízes votaram contra: a ugandesa Julia Sebutinde e o israelita Aharon Barak. Este último, numa declaração de voto, lamentou que a África do Sul tenha “procurado erradamente imputar o crime de Caim a Abel” e, enquanto sobrevivente do Holocausto, disse que o genocídio “é mais do que uma palavra; representa a destruição calculada e o comportamento humano no seu pior”.

Israel saiu igualmente vencido no que respeita ao pedido para o TIJ decretar “medidas provisórias” sobre o conflito, embora se tenha escapado de ter recebido ordem para um cessar-fogo - uma decisão que o Hamas iria observar, segundo disse a organização islamista, em contraste com o líder israelita, que já avisara não ceder. E voltou a dizê-lo após a decisão judicial, não na declaração em vídeo em língua inglesa, mas num comunicado em hebraico repetiu o mantra de que Israel irá lutar “até à vitória total, até à derrota do Hamas, ao regresso de todos os reféns e até assegurar que Gaza não será de novo uma ameaça”. 

“O tribunal está perfeitamente consciente da dimensão da tragédia humana que se está a desenrolar na região e está profundamente preocupado com a contínua perda de vidas e com o sofrimento humano”, declarou Donoghue. Como tal, o tribunal ordenou que o Estado de Israel tem de “tomar todas as medidas ao seu alcance” para não matar nem maltratar os cidadãos de Gaza, prevenir o incitamento ao genocídio, tomar medidas imediatas e eficazes de assistência humanitária, não destruir provas, e entregar um relatório, no prazo de um mês, sobre o cumprimento desta decisão, que é vinculativa, mas que não tem um mecanismo para a observância da mesma.

Em março de 2022, o TIJ ordenou à Rússia para parar a invasão da Ucrânia, e é o que se sabe.

A decisão do TIJ não satisfez plenamente nenhuma das partes, com membros do governo israelita a queixarem-se de um “tribunal antissemita” e palestinianos ouvidos em Gaza e fora do enclave frustrados por não ser ainda a hora do fim da guerra. Mas como disse o Hamas, “ajuda a isolar Israel”, uma vez que, entre os seus aliados, só os EUA mantêm que as acusações contra Israel são “infundadas”. A UE e vários líderes em particular pediram o cumprimento da decisão do TIJ e ao mesmo tempo a libertação dos reféns em posse do Hamas.

cesar.avo@dn.pt

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