Nova Constituição provisória constitui "nova página na história" da Síria
O presidente interino da Síria, Ahmed al-Sharaa, assinou esta quinta-feira a declaração constitucional redigida por uma comissão por ele nomeada, saudando-a como uma "nova página na história do país" após mais de uma década de guerra.
"Esta é uma nova página na história da Síria, onde estamos a substituir a injustiça pela justiça [...] e o sofrimento pela misericórdia", declarou Al-Sharaa, depois de a declaração constitucional ter sido lida por um porta-voz do comité de redação numa conferência de imprensa no Palácio Presidencial em Damasco.
A Constituição temporária substitui a que vigorava há mais de 50 anos e deixa o país sob domínio islâmico durante uma transição de cinco anos.
A declaração constitucional garante "liberdade de expressão e de imprensa" e os direitos "políticos e económicos" das mulheres e estabelece uma rigorosa separação de poderes na Síria.
"Dado que o princípio da separação de poderes estava ausente [...], optámos deliberadamente por uma separação rigorosa de poderes", disse o porta-voz do comité de redação.
A declaração garante "um vasto leque de direitos e liberdades, incluindo a liberdade de opinião, de expressão e de imprensa", ao mesmo tempo que garante às mulheres "os seus direitos sociais, económicos e políticos".
Os governantes interinos do país têm lutado para exercer a sua autoridade em grande parte do país desde que o antigo grupo insurgente islâmico Hayat Tahrir al-Sham, ou HTS, liderou uma insurgência-relâmpago que derrubou o antigo líder Bashar al-Assad, a 8 de dezembro.
O ex-líder do HTS Ahmed al-Sharaa tornou-se o +residente interino do país, decisão anunciada após uma reunião dos grupos armados que participaram da ofensiva contra Assad. Na mesma reunião, os grupos concordaram em revogar a antiga Constituição do país e disseram que uma nova seria redigida.
Embora muitos estivessem felizes em ver o fim do regime ditatorial de mais de 50 anos da família Assad no país devastado pela guerra, minorias religiosas e étnicas estavam céticas em relação aos novos líderes islâmicos e relutantes em permitir que Damasco, sob as suas novas autoridades, assumisse o controlo das suas áreas.
Abdulhamid al-Awak, um dos sete membros do comité criado por Al-Sharaa para redigir a Carta Magna temporária, disse esta quinta-feira, na mesma conferência de imprensa, que a Constituição manterá algumas artigos da anterior, incluindo a estipulação de que o chefe de Estado deve ser muçulmano e que a lei islâmica é a principal fonte de jurisprudência.
No entanto, al-Awak, especialista em Direito constitucional que leciona na Universidade Mardin Artuklu, na Turquia, também disse que a Constituição temporária inclui disposições que consagram a liberdade de expressão e de imprensa.
A Constituição irá "equilibrar entre a segurança social e a liberdade" durante a instável situação política da Síria, disse, adiantando que está para breve a formação de um novo comité para redigir uma Constituição permanente, estando, porém por esclarecer se será mais inclusiva para os grupos políticos, religiosos e étnicos da Síria.
Na segunda-feira, Al-Sharaa chegou a um acordo histórico com as autoridades curdas apoiadas pelos EUA no nordeste da Síria, incluindo um cessar-fogo e uma fusão das suas forças armadas com as agências de segurança do governo central.
O acordo aconteceu depois de as forças do Governo e grupos aliados terem derrotado uma insurgência lançada na semana passada por homens armados leais a Assad. Grupos de direitos humanos dizem que centenas de civis, a maioria da seita minoritária alauíta à qual pertence Assad -- foram mortos em ataques de retaliação por fações na contraofensiva.
Um objetivo fundamental da Constituição provisória é definir um cronograma para a transição política do país após concluída a transição. Em dezembro, Al-Sharaa disse que poderia levar até três anos para reescrever a Constituição da Síria e até cinco anos para organizar e realizar eleições.
O comité foi criado na sequência de uma conferência de diálogo nacional realizada em fevereiro. Críticos disseram que a conferência organizada à pressa não foi inclusiva dos diferentes grupos étnicos e sectários da Síria ou da sociedade civil.
Os EUA e a Europa têm hesitado em suspender as duras sanções impostas à Síria durante o governo de al-Assad até que estejam convencidos de que os novos líderes criarão um sistema político inclusivo e protegerão as minorias. Al-Sharaa e os governos regionais têm pedido que reconsiderem, temendo que a economia em ruínas do país possa trazer mais instabilidade.