Nem Boulos (centro), nem Haddad (dir.), Lula ainda é melhor opção do PT para 2026.
Nem Boulos (centro), nem Haddad (dir.), Lula ainda é melhor opção do PT para 2026.

Sem sucessores, esquerda continua refém do octogenário Lula em 2026

Se o campo progressista se quiser manter competitivo nas próximas eleições presidenciais, o atual chefe do Estado é “obrigado” a recandidatar-se e aliar-se cada vez mais  ao centro-direita, avaliam PT e politólogos.
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Dada a ascensão das direitas no Brasil nas municipais de outubro, à esquerda resta a recandidatura de Lula da Silva como planos A, B e C para se manter no Planalto em 2026. Mas Lula, com 81 anos por altura da eleição, corre risco de “bidenização”. Há alternativa no campo progressista ao atual presidente? Haver há mas nenhuma parece suficiente para vencer, segundo confidenciam dirigentes do PT e observam imprensa e cientistas políticos.

O PT, tendo em conta 2016 e 2020, auge e ressaca da Lava-Jato, não se saiu tão mal na municipal de 2024: venceu em 252 municípios, contra 182 de há quatro anos, e ainda conquistou, oito anos depois, uma capital estadual, Fortaleza. Mas, além de estar longe das 624 cidades, incluindo São Paulo, que comandava em 2012, viu o PL, a formação que aloja Jair Bolsonaro, conquistar quatro capitais.

Entretanto, os grandes vencedores foram os partidos da direita tradicional, aquela que, para fincar os dentes no orçamento, apoia todos os governos, dos de Lula e Dilma Rousseff aos de Fernando Henrique Cardoso, Michel Temer e Bolsonaro, como o MDB, de Ricardo Nunes, vencedor da eleição paulistana, e o PSD, de Eduardo Paes, ganhador, logo à primeira volta, da carioca.

O PT, aliás, apoiou o centrista Paes; mas em São Paulo apostou todas as fichas no derrotado Guilherme Boulos, do PSOL, partido à sua esquerda. O recado foi dado: o partido de Lula é muito mais competitivo se se unir ao centro do que se se limitar à esquerda.

“Foi um erro de origem lançar um candidato que só dialoga com a esquerda, um terço do eleitorado”, disse Washington Quaquá, vice-presidente do PT, à revista Carta Capital. “Não é um problema de Boulos, isso aconteceu com [o ex-PSOL] Marcelo Freixo [na eleição para governador do Rio de Janeiro] em 2022, eles chegam às segundas voltas mas chegam para perder”.

Alexandre Padilha, ministro das Relações Institucionais, foi mais longe e disse que o PT, nas municipais, não saiu ainda do “Z4”, um termo usado no futebol brasileiro para se referir aos quatro clubes na zona de descida à segunda divisão.   

Gleisi Hoffmann, a presidente do PT, discorda que Boulos tenha sido erro de casting - “tinha de ser ele”, tendo em conta que em 2020 o candidato chegara à segunda volta - mas concorda que o PT tem de se unir ao centro para reeleger Lula. Porém, como é típico de casa onde não há pão, ralhou com Padilha: “Z4? Mais respeito com o partido que lutou por ‘Lula Livre’ e ‘Lula Presidente’ quando poucos acreditavam (...) Padilha deve focar nas Relações Institucionais”.
Alternativas

Todos avaliam, portanto, que para se reeleger, Lula, que já tem o “centrista” Geraldo Alckmin (PSB) como vice, deve aliar-se mais ainda ao centro. Mas e se nessa equação o problema do PT não for o fator “centro” e sim o fator “Lula” - isto é, e se Lula, que terminará eventual mandato com 85 anos, não se recandidatar?  

“Ele pode ser ‘bidenizado’ pela oposição, não que ele esteja a dar sinais de fraqueza mas a política muda muito, como dizia Tancredo Neves, ‘a política é como nuvem, você olha e está de um jeito, você olha de novo e já mudou’”, diz ao DN o politólogo Vinícius Vieira.

“O partido está a colher não ter semeado um sucessor, embora ele até tenha escolhido um, Fernando Haddad, já numa tentativa de se aproximar ao centro, mas Haddad não vingou por lhe faltar carisma e porque o antipetismo no Brasil se revelou mais forte”, completa o académico, referindo-se ao atual ministro das Finanças, que perdeu a reeleição na prefeitura de São Paulo em 2016 para João Doria, a presidencial em 2018 para Bolsonaro e o governo do estado em 2022 para Tarcísio de Freitas, presidenciável em 2026 pelo campo bolsonarista.

Outro nome na calha para “novo Lula” é o do próprio Boulos, que pondera trocar PSOL por PT, mas as duas derrotas seguidas na corrida a prefeito paulistano mancham a carreira daquele que foi o candidato a deputado federal mais votado em São Paulo em 2022.

Camilo Santana, ministro da Educação e padrinho da vitória do petista Evandro Leitão em Fortaleza, ganhou pontos na corrida sucessória. “Mas não parece um nome nacionalizável”, opina Vieira. “Já João Campos, eleito com larga margem no Recife e muitos votos dos evangélicos, segundo as sondagens, pode sê-lo, mas não é do PT, falta-lhe muita quilometragem ainda e Pernambuco não é o Brasil”, continua o politólogo, referindo-se ao jovem (30 anos) prefeito de Recife, do PSB, partido de Alckmin.   

“O Alckmin seria uma saída viável, eventualmente com Haddad como vice, mas o PT não quer apoiar para presidente um candidato de outro partido e, ainda por cima, um que veio do PSDB e disse um dia que com ele ‘bandido tem duas opções, prisão ou caixão’”, acrescenta.

“Em suma, acho que o PT prefere ir para a oposição a não ter candidato mesmo que isso represente ver o bolsonarismo envergonhado, na figura do Tarcísio de Freitas, vencer”. E finaliza: “Acredito que a direita, se se articular, fique no poder nos próximos 20 anos, a não ser que Lula conquiste o centro e aproveite as fissuras dela - Bolsonaro pode não apoiar tanto assim Tarcísio porque quer concorrer em 2030 e tem medo que este o engula”. 

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