Ruanda vai às urnas para um novo mandato do “eterno” Kagame
Os ruandeses vão esta segunda-feira às urnas, com o presidente Paul Kagame praticamente assegurado de estender a sua liderança com punho de ferro e vencer uma corrida que o opõe aos mesmos rivais que derrotou há sete anos.
Líder de facto do Ruanda desde o genocídio de 1994, Kagame enfrenta as candidaturas de Frank Habineza, líder do Partido Democrático Verde - a única oposição autorizada - e Philippe Mpayimana, que concorre como independente.
Aos 66 anos, Kagame é visto como o responsável pela recuperação económica do Ruanda depois do genocídio, com o PIB a crescer a uma média de 7,2% entre 2012 e 2022
Mas o seu regime é amplamente criticado por sufocar a oposição política a nível interno, enquanto um relatório da ONU acusou as tropas ruandesas de lutarem ao lado da milícia rebelde M23 na vizinha República Democrática do Congo.
Kagame venceu três eleições com mais de 93% dos votos em 2003, 2010 e 2017, e surge agora com quase 99% na sondagem mais recente. Habineza obteve apenas 0,48% dos votos em 2017, com Mpayimana a ultrapassá-lo com 0,73%.
Os tribunais ruandeses rejeitaram os recursos de figuras proeminentes da oposição, como Bernard Ntaganda e Victoire Ingabire, para retirarem condenações anteriores que os impediam de concorrer.
A comissão eleitoral também proibiu a famosa crítica de Kagame, Diane Rwigara, alegando problemas com a sua papelada - a segunda vez que ela foi excluída da candidatura. Filha do industrial Assinapol Rwigara, um antigo grande doador da Frente Patriótica Ruandesa (RPF) de Kagame antes de este se desentender com os seus líderes, Rwigara foi acusada de falsificar documentos e presa em 2017, antes de ser absolvida pelos tribunais um ano depois.
Um total de 9,01 milhões de ruandeses estão registados para votar, indo as eleições presidenciais realizar-se ao mesmo tempo que as legislativas pela primeira vez.
Presidente para sempre
O desequilíbrio entre Kagame e os seus rivais ficou evidente durante o período de campanha de três semanas, à medida que a bem oleada máquina de relações públicas da RPF acelerava.
Galhardetes em carros, bandeiras, cartazes e faixas exibidas ao longo das estradas, as cores vermelha, branca e azul do partido no poder e os seus slogans “Tora Kagame Paul” (“Vote Paul Kagame”) e “PK24” (para “Paul Kagame 2024”) estão por todo o lado.
Em contraste com as multidões que assistiram aos seus comícios, os seus rivais têm lutado para fazer ouvir as suas vozes, com apenas 100 pessoas a comparecerem a alguns eventos. “Vim aqui para ouvir o que ele diz, mas votarei em Kagame... independentemente dos outros”, disse Beatrice Mpawenimana, de 30 anos, à AFP numa reunião organizada pelo partido de Habineza na aldeia de Juru, no Leste do país. “Ele deu-nos voz, a nós mulheres, trouxe estradas, hospitais, tantas coisas... Quero que ele seja presidente para sempre, ninguém pode substituí-lo.”
Tal como a maioria dos ruandeses - 65% da população do país tem menos de 30 anos - Beatrice só conheceu Kagame como líder.
O político de óculos está no comando desta nação sem acesso ao mar desde que a sua milícia RPF derrotou os extremistas hutus responsáveis pelo genocídio que deixou 800 mil mortos, principalmente tutsis, mas também hutus moderados.
Sem verdadeiro adversário
Tendo servido inicialmente como vice-presidente e ministro da Defesa, Kagame foi eleito presidente pelo parlamento em 2000, após a renúncia de Pasteur Bizimungu.
Desde então, ganhou eleições por sufrágio universal três vezes: 95,05% em 2003, 93,08% em 2010 e 98,79% em 2017.
“O partido no poder, a RPF, é bastante popular em todo o país, isso é inegável”, disse à AFP o advogado constitucional e analista político ruandês Louis Gitinywa.
“Quanto à eleição, é como um exercício que deve ser feito simplesmente para picar o ponto. Não há adversário verdadeiro contra Kagame.”
Grupos de defesa dos direitos humanos acusam o governo de abusos, incluindo a repressão da liberdade de expressão e a repressão da dissidência. A Amnistia Internacional afirmou esta semana que a oposição política no Ruanda enfrenta “severas restrições... bem como ameaças, detenções arbitrárias, processos judiciais, acusações forjadas, assassinatos e desaparecimentos forçados”.
Kagame procedeu a controversas alterações à Constituição em 2015, que encurtaram os mandatos presidenciais de sete para cinco anos, mas voltando a começar a contar do zero, permitindo-lhe potencialmente governar até 2034.