Republicanos já não têm medo de criticar Trump mas ainda não lhe viram costas
Apesar de dez congressistas republicanos terem votado a favor do impeachment do presidente (o que não aconteceu na primeira vez), a maioria optou apenas por acentuar críticas. A destituição pode contudo afastá-lo das eleições de 2024 e abrir um novo capítulo no partido.
Em 2019, não houve um único congressista republicano a votar a favor do impeachment do presidente Donald Trump. Desta vez, num histórico segundo processo de destituição, a história é diferente. Ainda antes da votação na Câmara dos Representantes, pelo menos cinco republicanos já tinham dito que iam votar a favor e a Casa Branca estaria a contar com a "traição" de uma dúzia. No final foram dez, numa votação com 232 votos a favor e 197 contra. A dúvida é saber se estamos diante do princípio da revolta dentro do Partido Republicano ou se este continuará a proteger o presidente, ciente da força que o seu apoio ainda representa para parte do eleitorado.
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A maioria democrata na Câmara dos Representantes significa que o impeachment a Trump por "incitar à insurreição" vai avançar, independentemente do número de republicanos que o apoiem. Contudo, no Senado, as contas são mais complicadas, porque será preciso uma maioria de dois terços para destituir Trump - o que significa que 17 senadores republicanos terão de votar a favor. Algo que pode parecer difícil, mas Mitch McConnell (o ainda líder da maioria até à posse da vice-presidente Kamala Harris) já terá dito em privado que concorda com o processo. Apesar disso, não irá chamar os senadores de volta a Washington (os trabalhos estão suspensos até dia 19), pelo que será impossível julgar Trump antes de este sair da Casa Branca.
O processo poderá contudo continuar depois de dia 20 de janeiro, sendo o impeachment uma forma de os republicanos afastarem Trump das presidenciais de 2024. Isto porque, se a destituição for aprovada, bastará uma maioria simples para o impedir de concorrer a cargos públicos. Mesmo sem acesso ao Twitter ou às redes sociais, Trump não ficará por muito tempo fora da ribalta e se uma eventual candidatura não for rejeitada, possivelmente não deixará espaço de manobra ao partido nos próximos quatro anos. Se ele pessoalmente não puder ser candidato, será aberta a guerra interna para encontrar um sucessor - e o apoio de um ex-presidente que foi destituído poderá tornar-se tóxico.
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"Nunca houve uma maior traição de um presidente dos EUA ao seu cargo e ao seu juramento à Constituição", disse a congressista Liz Cheney. A filha do ex-vice-presidente Dick Cheney , que é a terceira republicana mais importante na Câmara dos Representantes, foi uma das que anunciaram antes da votação que iria votar a favor do impeachment. Os apoiantes de Trump dizem que poderá esperar a resposta dos eleitores nas urnas.
As sondagens mostram que os eleitores republicanos se opõem ao impeachment e aqueles que ainda são leais ao presidente não hesitaram em usar esse argumento na hora de ir a votos. "Qualquer senador ou congressista que vote a favor do impeachment terá de enfrentar essa escolha nas próximas primárias", disse à AP o conselheiro de Trump, Jason Miller.
Muitos congressistas republicanos optaram ontem por denunciar novamente a violência que se viveu no Capitólio, na semana passada, defendendo que o presidente deveria ter de imediato agido para condenar o que se estava a passar. E defendem que Trump deverá assumir parte da responsabilidade pelo que aconteceu, tendo incitado a multidão com o seu discurso. Mas votam contra a destituição. "Acredito que um impeachment num curto espaço de tempo seria um erro", disse o líder da minoria republicana, Kevin McCarthy, considerando que isso "só iria dividir mais a nação". Na prática, criticaram o presidente e as suas ações, mas não ficam no seu currículo com um voto contra Trump.
Numa mensagem divulgada pelo gabinete de imprensa da Casa Branca, Trump lançou ontem um apelo contra a violência, os crimes e o vandalismo de qualquer tipo, quando há indicação de que estão a ser preparadas manifestações e ações violentas para o dia da tomada de posse de Biden. "Não é isto que eu represento, e não é isto que a América representa", escreveu. "Peço a todos os americanos que ajudem a aliviar a tensão e a acalmar a situação", acrescentou, com a palavra "todos" em maiúscula, podendo ser um aviso também para os próprios congressistas.
Mas mesmo aqueles que ficam totalmente do lado de Trump também terão de enfrentar as consequências: várias empresas prometeram cortar todas as doações políticas a qualquer um dos 147 republicanos que votaram na semana passada para rejeitar a vitória de Biden, perpetuando falsas alegações por parte de Trump de que as eleições foram fraudulentas.
(Notícia atualizada às 10.30)
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