Ramos-Horta tem o dobro dos votos de Lú-Olo, mas não evita a 2.ª volta
O vencedor da primeira volta das eleições presidenciais de sábado em Timor-Leste, José Ramos-Horta, disse ontem estar muito "feliz e animado" com o "fator humano" que viveu na campanha, traduzido num apoio de quase 47% dos votos. O ex-presidente e Nobel da Paz conseguiu mais do dobro dos votos do segundo classificado, o atual chefe de Estado Francisco Lú-Olo Guterres, mas não evitou a necessidade de ir a uma segunda volta, a 19 de abril.
"Estou muito, muito animado e feliz porque concorrendo com 15 outros candidatos, fiquei em primeiro lugar com quase 47%, pouco mais do dobro do segundo mais votado", afirmou José Ramos-Horta à Lusa. "E além da política, dos compromissos da política, há sempre o fator humano. Foi mais uma grande lição de humildade ao receber tanto apoio, tanto carinho, tanto sacrifício de muitos timorenses de todas as idades e classes sociais que se mobilizaram para apoiar esta candidatura", afirmou.
José Ramos-Horta venceu a primeira volta das presidenciais com 301 481 votos (46,58%), segundo dados finais provisórios do Secretariado Técnico de Administração Eleitoral (STAE) - que vão ser agora confirmados pela Comissão Nacional de Eleições (CNE). O atual chefe de Estado, Lú-Olo, da Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin), foi segundo, com 143 408 votos (22,16%).
Em terceiro ficou a atual vice-primeira-ministra, Armanda Berta dos Santos, com 56 289 votos (8,7%). O ex-comandante das Forças Armadas Lere Anan Timur foi o quarto mais votado com 48 959 votos (7,57%), à frente do deputado Mariano Sabino, do Partido Democrático (PD), com 47 008 votos (7,26%). Os restantes 11 candidatos, nas mais concorridas eleições de sempre, somam entre si 7,73% dos votos. A taxa de abstenção nas eleições de sábado foi de 22,74%, mais baixa que os 28,84% registados nas presidenciais de 2017.
Uma segunda volta entre Ramos-Horta e Lú-Olo não é inédita, tendo ocorrido já em 2007. "Vamos à segunda ronda, tal como aconteceu em 2007. E eu nessa segunda volta consegui quase 80% dos votos", recordou Ramos-Horta.
O ex-presidente escusou-se a avançar já com que apoios adicionais contará na segunda volta, além do do Congresso Nacional da Reconstrução Timorense (CNRT), o partido de Xanana Gusmão (herói da independência e primeiro presidente de Timor-Leste), que o apoiou na primeira. "Eu não quero reivindicar ou reclamar apoios eu próprio. Estou em contacto com várias personalidades que concorreram para esta eleição. Não vou divulgar nomes, nem adiantar nada. Mas como é obvio, pessoalmente estou a fazer estes contactos com vista à segunda volta", disse.
Questionado sobre os fatores que contribuíram para a sua vitória, Ramos-Horta disse que ao longo da campanha, e nos dois anos anteriores, sentiu que o eleitorado "quer Xanana Gusmão de volta na chefia do Governo" e a ele na Presidência. Um apoio, considerou, que traduz a vontade de "dinamizar a economia, restaurar a posição de Timor-Leste no plano internacional, ser mais relevante no plano regional e internacional". Ao mesmo tempo, considerou, os resultados traduzem uma "rejeição da atual liderança da Fretilin".
O secretário-geral da Fretilin, partido que apoia a recandidatura de Lú-Olo (apesar de outros militantes terem também concorrido às eleições, com destaque para Lere Anan Timur), disse ontem estar confiante do apoio dos restantes partidos no Governo na segunda volta. Mari Alkatiri disse à Lusa ter já contactado os líderes do Partido Libertação Popular (PLP), o atual primeiro-ministro Taur Matan Ruak, e do Kmanek Haburas Unidade Nacional Timor Oan (KHUNTO), José Naimori. "Sim, falei com os dois. As conversas foram positivas", disse, afirmando que não tem dúvidas de que ambos apoiarão Lú-Olo na segunda volta.
Sobre o facto de Armanda Berta dos Santos, presidente do KHUNTO, ter conseguido o terceiro lugar com 8,7%, Alkatiri disse que o resultado "tem de ser reconhecido". Nas últimas legislativas em que concorreu sozinho, o KHUNTO obteve 7,41% dos votos, podendo o resultado de sábado confirmar um reforço da influência do partido que já controla cinco lugares no parlamento e que tem sido decisivo para as alianças de governação.
Quanto à segunda volta, Alkatiri disse que agora as coisas serão "diferentes", com uma campanha que procurará "reforçar a aliança" da Fretilin com a população. "Este resultado já foi. Agora vai para os arquivos. Vamos começar uma nova eleição e claro que a anterior tem influência, mas uma nova eleição só com dois e não 16", disse, considerando que historicamente Lú-Olo parte para o voto com um apoio do partido de mais de 30%.
Por seu lado, Ramos-Horta disse que vai manter "o civismo" que diz ter caracterizado a primeira volta, sem "um único ato de violência perpetrado por elementos da sua campanha", apesar, sustenta, da "muita violência verbal da campanha da Fretilin".