Habitantes de Khan Yunis saem de Rafah a caminho da sua cidade após saberem da retirada israelita.
Habitantes de Khan Yunis saem de Rafah a caminho da sua cidade após saberem da retirada israelita.MOHAMMED ABED / AFP

Rafah e Hezbollah são os novos objetivos das forças israelitas

Retirada do sul da Faixa de Gaza justificada pelo êxito militar e para preparar novas ofensivas -- com o Hamas junto da fronteira com o Egito e com a milícia xiita libanesa.
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O exército israelita retirou de Khan Yunis, na Faixa de Gaza, atacou o leste e o sul do Líbano e afirma estar preparado para uma nova fase no conflito com o Hezbollah, no mesmo dia em que o contestado primeiro-ministro diz estar a “um passo da vitória” e Teerão ameaçou as embaixadas de Israel.

“Cheira a morte. Já não temos uma cidade, só escombros. Não sobrou absolutamente nada. Não consegui parar de chorar enquanto caminhava pelas ruas”, disse Maha Thaer à AFP, depois de ter regressado a Khan Yunis, a cidade natal do líder do Hamas Yahya Sinwar, em resultado da retirada das forças israelitas. O ministro da Defesa israelita Yoav Gallant justificou a saída pelo êxito da operação no enclave e para a preparação de futuras ações, em especial em Rafah, onde Telavive diz que permanecem quatro batalhões do braço armado do Hamas. Entretanto, os militares israelitas anunciaram ter concluído uma fase de preparação a norte do país, da defensiva para a ofensiva, no mesmo dia em que atacaram alvos do grupo xiita Hezbollah no leste e no sul do Líbano.

O Irão tinha prometido vingar-se do ataque aéreo ao anexo da embaixada iraniana em Damasco, que na segunda-feira matou sete elementos dos Guardas da Revolução, dois generais incluídos. Agora deu uma pista através de um conselheiro do guia supremo: “As embaixadas do regime sionista já não estão em segurança”, afirmou Yahya Rahim Safavi, que também disse ser “um direito legal e legítimo confrontar” o “regime brutal”, ou seja, Israel. Em resposta, o ministro da Defesa do estado hebraico disse que as suas forças estão preparadas para responder a qualquer ataque.

Em Israel, no sábado à noite deram-se as maiores manifestações desde 7 de outubro, com os cidadãos a exigirem eleições antecipadas e e um acordo para a libertação dos reféns. Em Telavive, onde se juntaram cerca de cem mil pessoas, cinco manifestantes ficaram feridos num atropelamento. No domingo o juiz prorrogou a ordem de detenção por mais 24 horas do autor do atropelamento por suspeita de pôr em risco vidas humanas. O detido é um treinador de futebol -- cuja mulher foi filmada momentos antes do atropelamento a injuriar os manifestantes -- e alegou que o carro sofreu uma avaria. No entanto, segundo a polícia, o automóvel não tinha qualquer problema.

O incidente levou a que quase todos os atores políticos, à exceção de Benjamin Netanyahu, reagissem. Benny Gantz, membro do gabinete de guerra de Israel, mas opositor do chefe do governo e que na semana passada apelou para a realização de eleições , comentou o sucedido como “horrível” e defendeu quem saiu à rua. “Comparar os manifestantes aos nossos inimigos e acusá-los de quererem assassinar o primeiro-ministro é uma irresponsabilidade”, disse. 

O homem favorito nas sondagens referia-se às declarações da ministra dos Transportes, Miri Regev, segundo a qual há manifestantes antigovernamentais que querem assassinar o primeiro-ministro. A manifestação de sábado realizou-se na rua Kaplan, local dos protestos semanais contra a reforma judicial e que abalaram o governo de Netanyahu em 2023. A novidade é que se juntaram algumas famílias dos sequestrados pelo Hamas, uma mudança que não caiu bem junto de outras famílias dos reféns, apoiantes do primeiro-ministro.

Em Inglaterra, o governo conservador seguiu a inflexão da presidência norte-americana em relação ao apoio ao governo israelita. No sábado à noite, o primeiro-ministro Rishi Sunak reafirmou o direito de Telavive se defender do Hamas, mas disse que é hora de o “terrível conflito terminar”. Já no domingo, o chefe da diplomacia David Cameron assinou uma opinião no The Sunday Times, e na qual afirmou que o apoio britânico a Israel “não é incondicional”, estando dependente do respeito pelo direito internacional. A esse propósito, o vice-primeiro-ministro Oliver Dowden explicitou, em entrevista à BBC, que a exportação de armas para Israel estará em risco se receber um parecer jurídico segundo o qual Telavive viole o direito humanitário internacional.

Na mensagem de sábado à noite, Sunak disse que a sociedade britânica está “chocada com o banho de sangue e consternada com o massacre dos bravos heróis britânicos que transportavam alimentos aos necessitados”. Dos sete voluntários da ONG World Central Kitchen que morreram na segunda-feira em Gaza, vítimas de bombardeamento israelita, três eram britânicos. Na Austrália, país de origem de outra vítima, o governo decidiu nomear um conselheiro especial para trabalhar com Israel de modo a garantir a “transparência” da investigação sobre o ataque aéreo.

O fundador da World Central Kitchen, o espanhol José Andrés, agradeceu a rapidez com que as forças israelitas admitiram o “erro trágico” em resultado de uma investigação levada a cabo, mas disse que o “perpetrador não pode investigar-se a si próprio”. Entrevistado pela ABC News, o chef disse que o conflito, “nesta altura, parece ser uma guerra contra a própria humanidade”.

cesar.avo@dn.pt

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