Polícia lança gás lacrimogéneo contra candidato Venâncio Mondlane e carrega sobre manifestantes em Maputo
LUÍSA NHANTUMBO/LUSA

Polícia lança gás lacrimogéneo contra candidato Venâncio Mondlane e carrega sobre manifestantes em Maputo

Candidato presidencial Venâncio Mondlane convocou marchas pacíficas para repudiar homicídio de dois apoiantes. Polícia lançou granadas de gás lacrimogéneo e disparou tiros para o ar enquanto carregava para dispersar os manifestantes. Dois jornalistas ficaram feridos.
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A polícia moçambicana lançou esta segunda-feira gás lacrimogéneo contra o local onde o candidato presidencial Venâncio Mondlane fazia declarações aos jornalistas, a apelar à calma no âmbito da marcha que convocou, obrigando o político a fugir.

O candidato, que reivindica vitória nas eleições, falava com os jornalistas junto à rotunda da Organização das Mulheres Moçambicanas, no início da Avenida Joaquim Chissano, no centro de Maputo.

Os manifestantes que se encontravam no local estavam a tentar fazer um cordão humano, mas a polícia voltou a lançar gás lacrimogéneo.

Um jornalista foi ferido nesta ação depois de outro ter também ficado ferido na carga policial que ocorreu ao início da manhã.

A polícia moçambicana dispersou dezenas de pessoas que se concentravam para uma manifestação no centro de Maputo convocada pelo candidato presidencial Venâncio Mondlane repudiando o homicídio de dois apoiantes. As autoridades carregaram sobre os manifestantes que estavam no local. 

Cerca das 10:00 locais (09:00 em Lisboa), a polícia itensificou o lançamento de granadas de gás lacrimogéneo e disparou tiros para o ar enquanto carregava para dispersar os manifestantes, que responderam com o arremesso de pedras e com o lançamento de artefactos pirotécnicos.

Durante a carga policial, um jornalista ficou ferido.

Os confrontos entre a polícia e os manifestantes começaram cerca das 07:30, com a força policial a dispersar os grupos que se começavam a juntar para participarem nas marchas pacíficas.

A polícia está também a recorrer a elementos com cães e um helicóptero está a sobrevoar a baixa altitude a zona da saída da marcha, o local do duplo homicídio de sexta-feira.

Os manifestantes gritavam palavras de ordem como "Salvem Moçambique" e "Este país é nosso"

Em declarações à Lusa no local, Armando Morona disse que foi atingido pelo gás e que as autoridades não disseram nada: "Só estão a disparar para um lado e para o outro"

"Mas eles que nos aguardem, estamos aqui, ninguém vai recuar", disse o manifestante, referindo que a situação em Moçambique é "uma vergonha à escala mundial, onde se mata um advogado".

"A polícia está a fazer esta pouca vergonha, isto é mais um repúdio aos resultados eleitorais", referiu.

Portugal pede contenção a partidos e autoridades e manifesta preocupação

O ministro dos Negócios Estrangeiros, Paulo Rangel, disse, entretanto, que o Governo português continua a acompanhar "com grande preocupação" a situação em Moçambique e apelou à contenção de todas as forças políticas e autoridades do país.

"Estamos a seguir a passo e passo, com grande preocupação", disse Paulo Rangel.

Governante lembrou que Portugal já condenou na semana passada "de forma muito categórica" a violência que levou aos assassínios do assessor jurídico e do mandatário de Venâncio Mondlane e pediu agora contenção a "todas as forças políticas e a todas as autoridades", de forma a haver garantia de "regularidade e estabilidade no processo eleitoral".

"É fundamental para Moçambique que o processo eleitoral corra bem e que dele resultem autoridades legítimas e respeitadas por todos", acrescentou o ministro português, que falava aos jornalistas em Madrid, onde hoje se reuniu com o homólogo espanhol, Jose Manuel Albares, e com os ministros da Defesa de Portugal e Espanha, Nuno Melo e Margarita Robles.

Rangel acrescentou que os últimos desenvolvimentos em Moçambique são também preocupantes "porque a imprensa foi afetada no seu trabalho", reiterando que o Governo está a seguir a situação com preocupação.

"É fundamental que todo o processo eleitoral (...) decorra com caráter ordeiro, com caráter legal, com caráter regular. Moçambique tem uma democracia que precisa de ser afirmada", sublinhou, acrescentando que, neste contexto, haver violência, "necessidade de intervenção policial", desacatos ou "intervenções que podem pôr em causa a estabilidade" é algo que "preocupa muito" o governo português.

Maputo acordou hoje praticamente sem movimento.

Numa ronda feita pela Lusa na capital moçambicana foi possível constatar uma cidade com trânsito anormalmente reduzido para o primeiro dia semana de trabalho, poucos transportes a funcionarem, embora algum movimento pedonal e cafés a funcionar.

Também era visível algum reforço policial, sobretudo na zona prevista para a saída da marcha, o local do duplo homicídio de sexta-feira, e igualmente junto à sede do município.

"Vai ser a primeira etapa, pacífica, em que nós vamos paralisar toda a atividade pública e privada. Vamos para a rua com os nossos cartazes, vamos manifestar o nosso repúdio", anunciou Venâncio Mondlane, no sábado, em Maputo, no local em que dois apoiantes foram assassinados.

Garantiu que a greve, no setor público e privado, que tinha pedido para hoje, em contestação aos resultados preliminares das eleições de 9 de outubro, é para manter, passando agora para a rua, e responsabilizou as Forças de Defesa e Segurança (FDS) pelo duplo homicídio.

A polícia moçambicana confirmou no sábado, à Lusa, que Elvino Dias, advogado de Venâncio Mondlane, e Paulo Guambe, mandatário do Podemos, partido que apoia Mondlane, foram mortos a tiro numa "emboscada".

Vigília em homenagem a Elvino Dias, advogado do candidato presidencial Venâncio Mondlane, e Paulo Guambe, mandatário do Podemos, partido que o apoia, mortos a tiro em Maputo
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O crime aconteceu na avenida Joaquim Chissano, centro da capital, e segundo a polícia uma mulher que seguia nos bancos traseiros da viatura onde seguiam Elvino Dias e Paulo Guambe, foi igualmente atingida a tiro, tendo sido transportada para o hospital.

Em Maputo, a marcha está convocada para sair às 10:00 do local do duplo homicídio.

A polícia moçambicana avisou, antes do duplo homicídio que levou à convocação da marcha, além da paralisação, que vai travar qualquer ato de violência e desordem pública que ocorra hoje.

As eleições gerais de 9 de outubro incluíram as sétimas presidenciais - às quais já não concorreu o atual chefe de Estado, Filipe Nyusi, que atingiu o limite de dois mandatos - em simultâneo com legislativas e para assembleias e governadores provinciais.

A CNE tem 15 dias para anunciar os resultados oficiais, data que se cumpre em 24 de outubro, cabendo depois ao Conselho Constitucional a proclamação dos resultados, após concluir a análise, também, de eventuais recursos, mas sem prazo definido para esse efeito. 

As comissões distritais e provinciais de eleições já concluíram o apuramento da votação das eleições gerais de 09 de outubro, que segundo os anúncios públicos dão vantagem à Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo, partido no poder) e ao candidato presidencial que o partido apoia, Daniel Chapo, com mais de 60% dos votos, embora o candidato presidencial Venâncio Mondlane conteste esses resultados, alegando com os dados das atas e editais originais da votação, que recolhe em todo o país.

Venâncio Mondlane garantiu na quinta-feira, na Beira, centro de Moçambique, que após o anúncio dos resultados das eleições gerais vai recorrer ao Conselho Constitucional, com as atas e editais originais da votação.

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