Portugal assume neste semestre a presidência da União Europeia. A Turquia, candidata oficial à adesão, espera alguma evolução nos próximos meses? Nós vemos a presidência da UE de Portugal como uma oportunidade para abrir caminho a relações mais justas e saudáveis entre a Turquia e a UE. Nós sempre valorizámos o apoio de princípio de Portugal em relação ao alargamento, ao processo de adesão da Turquia à UE e à melhoria das relações entre a Turquia e a UE. Estamos confiantes que Portugal está ciente do valor acrescentado que a Turquia tem para a UE. Após a última cimeira da UE, existe uma janela de oportunidade para uma agenda positiva que irá beneficiar ambos os lados. E a melhor ferramenta para isso é, de facto, a revisão da Declaração UE-Turquia de 18 de março sobre migração. Este é o melhor exemplo de como a Turquia e a UE podem agir com sucesso para contribuir para a segurança, a estabilidade e a prosperidade da região. Tal como acordado pelo presidente Erdogan, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, e o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, a 9 de março de 2020, em Bruxelas, nós precisamos de renovar a Declaração através do reforço da perspetiva da Turquia sobre a UE, do começo do processo de modernização da União Aduaneira Turquia-UE, da revitalização do diálogo de alto nível e das cimeiras, do encorajamento da liberalização dos vistos, e de uma melhor cooperação na gestão da migração irregular e da luta contra o terrorismo. Já tínhamos começado um exercício de revisão da Declaração com a Comissão, no entanto, este foi bloqueado por alguns Estados membros numa fase adiantada. A Turquia sempre demonstrou a sua posição de princípio relativamente à desescalada e ao diálogo. Ainda assim, isto não é suficiente. A UE deve encorajar todos os seus membros a adotarem uma abordagem mais positiva e construtiva..Portugal pode fazer a diferença? Continuaremos a contar com o apoio e a sabedoria estratégica de Portugal para, em conjunto, reconduzir as relações numa via mutuamente benéfica durante a sua presidência da UE. É importante que a presidência portuguesa trate todos os candidatos em pé de igualdade e os convide a todos para reuniões com países candidatos, como o Gymnich e a Conferência sobre o Futuro da Europa..As tensões recentes da Turquia com países como a França, a Grécia ou Chipre são um sinal de afastamento do projeto europeu e de procura de outros espaços de afirmação como o Médio Oriente e a Ásia Central? A Turquia tem sido e é, historicamente, uma parte inseparável da Europa. Somos um membro fundador de instituições europeias, incluindo o Conselho da Europa e a OSCE. Somos um membro da NATO desde 1952 e um dos principais contribuidores para as suas missões e operações em todo o mundo. É na Cimeira de Lisboa, em fevereiro de 1952, que a Turquia se associa oficialmente à NATO. A adesão à UE continua a ser um objetivo estratégico para a Turquia. Contudo, a nossa localização geográfica e o nosso contexto histórico oferecem-nos múltiplas identidades. Não somos apenas parte da Europa, somos também parte da Ásia, dos Balcãs, do Mediterrâneo e do Médio Oriente. Sempre considerámos isto mais como um recurso do que como uma responsabilidade. Por outro lado, numa ordem mundial dinâmica e em evolução, que se caracteriza pela multipolaridade, a diversificação das nossas opções de política externa e parceiros não se afigura como uma escolha mas sim como uma necessidade. Na implementação da nossa política externa empreendedora e humanitária, trabalhamos e interagimos com uma variedade de parceiros a leste, oeste, norte e sul pelo alcance de um único objetivo: contribuir para a paz e a prosperidade na nossa vizinhança e mais além. As nossas antigas e novas parcerias com diferentes partes do mundo, sejam a Europa, a Ásia, África ou a América Latina, não constituem uma alternativa, mas são complementares umas com as outras..A adesão à União Europeia continua a ser o objetivo? Acreditamos que a melhoria das nossas relações com a UE em linha com a nossa perspetiva de adesão é o caminho a seguir. O povo turco vê o seu futuro na UE. Tal como destacado pelo presidente Erdogan, queremos construir o nosso futuro juntos com a UE. As nossas crescentes relações e a política externa ativa noutras regiões do mundo não são um afastamento do projeto de integração europeia. Consequentemente, trata-se de um grande valor estratégico acrescido para a UE que a Turquia tenha laços fortes com estas regiões. Infelizmente, a UE não consegue ver este ativo estratégico que a Turquia consegue trazer. Em vez disso, a UE insiste em olhar para as relações entre a Turquia e a UE a partir de uma perspetiva estreita, identificada pelos problemas entre alguns membros e a Turquia. Acreditamos que problemas bilaterais podem ser resolvidos através do diálogo e não através de chantagem ou do abuso da plataforma da UE sob a solidariedade entre membros e do direito de veto contra a Turquia..Voltando à relação económica com Portugal, é de prever mais investimento turco e aumento das trocas comerciais? As relações económicas e comerciais entre a Turquia e Portugal encontram-se numa tendência positiva e o volume de negócio entre os nossos países quadruplicou nos últimos 15 anos. Em 2019, o nosso volume de negócios ultrapassou os dois mil milhões de dólares. Existem exemplos notáveis de investimentos turcos em Portugal. Para citar alguns: o Grupo OYAK comprou as operações da Cimpor em Portugal e Cabo Verde; o terminal de cruzeiros em Santa Apolónia foi construído e é operado por um consórcio em que a Global (uma empresa turca) é o maior parceiro; a Yýlport opera sete terminais de contentores em Portugal e os seus investimentos atingem os 500 milhões de euros. Esperamos que mais empresas turcas sejam ativas em Portugal assim que o impacto global da pandemia de covid-19 seja ultrapassado e vice-versa. Sendo a Turquia uma porta de entrada para a Ásia Central, o Cáucaso, o Médio Oriente e o norte de África, tal como Portugal o é para os países de língua portuguesa na América Latina e em África, ambos os países podem também ser parceiros de negócio estratégicos globais em países terceiros.