Excluída a Guiné-Bissau, que declarou a independência em 1973 e a viu reconhecida por Portugal em setembro do ano seguinte, os restantes Territórios Ultramarinos - como se lhe chamava à época - tornaram-se países soberanos em 1975. Uma quádrupla comemoração, em diferentes datas e com graus muito diversos de preparação das festividades.Moçambique O primeiro dos quatro países africanos a comemorar a independência, em 25 de junho, é aquele que, neste momento, enfrenta a situação mais conturbada. (A Guiné-Bissau, fora deste quadro por já ter cumprido o cinquentenário, vive também uma situação política pouco promissora, com o presidente Umaro Sissoco Embaló, acusado de autoritarismo pela oposição, a marcar e cancelar Eleições Legislativas por três vezes nos últimos meses). . Quando Samora Machel proclamou a independência, no Estádio de Machava, fez questão de deixar claro, sobre a hierarquia do poder: “A República Popular de Moçambique, Estado do povo trabalhador moçambicano, será dirigida pela Frelimo, instrumento de organização, de mobilização do povo moçambicano no combate pela libertação nacional (...). Em todos os níveis será afirmada a primazia das decisões e estruturas do partido sobre as do Governo.”Na antevéspera do Natal, os resultados das eleições realizadas em outubro foram validados pelo Conselho Constitucional. O desfecho eleitoral, em especial das Presidenciais, nas quais o candidato da Frelimo Daniel Chapo surgiu com 70,6% foi contestado nas instâncias eleitorais e jurídicas, bem como nas ruas.O homem que afirma ter vencido as eleições, Venâncio Mondlane, tinha previsto entrar num novo período de protestos, a “fase ponta-de-lança”, mas acabou por adiar a mesma. Alegou que os moçambicanos precisam de enterrar os mortos da repressão policial e que se instalou um clima de medo generalizado gerado pelo partido no poder, recorrendo inclusive à libertação de presos. Mais de 1500 reclusos fugiram de uma cadeia de alta segurança.A oposição promete mais manifestações pacíficas, alimentadas pelo descontentamento crescente, em especial entre os mais jovens - um terço da população que não encontra emprego ou perspetivas e não se revê na Frelimo, mas também com a população a ter de enfrentar filas para adquirir produtos básicos.A tomada de posse de Chapo, prevista para dia 15, é motivo de especulação e ansiedade, uma vez que Mondlane também afirma que nesse mesmo dia irá igualmente tomar posse. Neste quadro, as comemorações dos 50 anos da independência ainda não apareceram no espaço público.Cabo VerdeNa mensagem de Ano Novo, o presidente cabo-verdiano fez um apelo à mobilização e união “em torno dos ideais da independência, comemorando com criatividade e olhando em frente esse momento ímpar na vida política”, que se deu no dia 5 de julho de 1975. Disse José Maria Neves: “Não se trata de comemorações centradas no poder político ou na glorificação do passado. Trata-se de um dever de memória, de um momento de valorização da História e de imaginação do futuro.” . Em outubro último, o Parlamento aprovou a criação de uma comissão organizadora da comemoração dos 50 anos da independência. Presidida pela deputada Isa Moreno Rodrigues, do MpD, partido no poder, o órgão deverá seguir as linhas enunciadas pelo presidente, numa celebração que não se ficará pelo arquipélago, mas também chegará à diáspora, como disse a ministra Janine Lélis.Até agora não se conhece o programa das comemorações do país, que é considerado um “exemplo para África” pelos Estados Unidos. Cabo Verde, país classificado “livre” pela Freedom House, com uma classificação superior ao Reino Unido, Itália ou Espanha, por exemplo, tem apresentando os melhores indicadores de crescimento social e económico entre os quatro países.São Tomé e PríncipeTal como Cabo Verde, São Tomé e Príncipe é um arquipélago poupado à guerra civil, ao invés de Angola e Moçambique. No entanto, a trajetória do pequeno país de 230 mil habitantes perde em comparação com Cabo Verde, desde a organização e funcionamento do Estado, ao índice de desenvolvimento social e a uma economia mais madura - por exemplo, São Tomé, como Moçambique, depende de países doadores. Se, em 1994, o Produto Interno Bruto de ambos era semelhante (1000 dólares), em 2023 o de São Tomé situava-se nos 2600 dólares e em Cabo Verde em 4300 dólares.. Em 12 de julho passado, nas cerimónias da independência, o presidente são-tomense Carlos Vila Nova fez um retrato duro do país. “A nossa independência política ou jurídica, nascida total e completa há 49 anos, logrou derrubar de forma irreversível o jugo colonialista e outorgar a São Tomé e Príncipe a condição de país independente e soberano. No entanto, volvidos todos esses anos, continuamos a lutar pela nossa independência económica, que tarda a chegar, com todas as consequências que isto acarreta para as nossas populações, sobretudo para as camadas mais desfavorecidas.”Não há ainda qualquer notícia de um plano de comemorações dos 50 anos da independência.AngolaO último país a lograr a independência, no dia 11 de novembro, foi o primeiro a começar os festejos do cinquentenário da independência, tendo dado o tiro de partida em 22 de novembro, com um fórum para debater a qualidade da Educação. As comemorações da Dipanda (nome pelo qual é conhecida a independência angolana) estendem-se até ao último dia deste ano. De Cabinda ao Cunene, além das missões diplomáticas mundo fora, a data vai ser assinalada sob o lema “Um futuro melhor, 50 anos: preservar e valorizar as conquistas alcançadas, construindo Angola”.Um país que não tem conseguido potenciar os seus recursos humanos e naturais, nem realizado uma transição democrática - tem 28 pontos em 100 na lista da Freedom House contra 44 de Moçambique, 84 de São Tomé e 92 de Cabo Verde -, está a tentar virar a página da dependência económica da China, como se vê no projeto do Corredor do Lobito, apoiado pelos EUA.. Depois de, em outubro passado, o presidente João Lourenço ter reunido o Conselho da República para analisar o ponto da situação do programa gizado pela comissão interministerial, a porta-voz daquele órgão consultivo, Rosa Cruz e Silva, destacou os objetivos das comemorações: “Reforçar o patriotismo e o orgulho nacional, promover o conhecimento sobre a História e a Cultura de Angola, refletir sobre os desafios enfrentados e as oportunidades futuras para o desenvolvi- mento do país, e celebrar a solidariedade e cooperação entre os diversos setores da sociedade.” O ato central já está marcado para a Praça da República, em Luanda, e será presidido por Lourenço.E Portugal?A antiga potência colonizadora não vai ficar de fora. Ao nível oficial é de esperar que esteja representado nas cerimónias principais. Por exemplo, o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa já disse que irá estar presente nas comemorações da independência de Cabo Verde. O tema vai ser igualmente objeto de debate. A Nova Faculdade de Ciências Sociais e Humanas será palco do colóquio “Os 50 Anos das Independências das Colónias Portuguesas em África”, a decorrer de 17 a 19 de julho, numa iniciativa em que também participa a Universidade de Coimbra.Sendo certo que em Portugal se cultiva uma relação afetiva com estes países - nas relações bilaterais ou no quadro da Comunidade de Países de Língua Portuguesa - a mesma não é efetiva. O peso do investimento direto ou do comércio é pouco significativo. Por exemplo, em 2023, 2,4% das exportações portuguesas foram destinadas a estes quatro países e, em sentido inverso, apenas 0,3% das importações tiveram origem em Angola, Cabo Verde, Moçambique e São Tomé, segundo dados do Instituto Nacional de Estatística.