Noboa favorito à reeleição no Equador apesar da violência e da crise energética
Com outro presidente, os cortes da luz durante mais de 14 horas por dia, a tortura e morte de quatro adolescentes depois de terem sido levados por militares ou a guerra aberta com a vice-presidente e as acusações de autoritarismo podiam ter sido motivo para crises políticas e baixa popularidade. Mas nada parece abalar o equatoriano Daniel Noboa, que algumas sondagens dizem que poderá vencer já à primeira volta as eleições desde domingo.
Noboa foi eleito presidente há apenas 15 meses, para terminar o mandato de Guillermo Lasso. O ex-presidente, ameaçado de impeachment, desencadeou pela primeira vez o mecanismo conhecido como "morte cruzada" - que o fez cair, mas também à Assembleia Nacional que o queria derrubar.
Agora, Noboa quer ser eleito para um mandato completo, que os seus apoiantes alegam ser necessário para poder levar a cabo a sua visão do país – que passa por uma maior aproximação aos EUA, o seu país natal.
O jovem empresário de 37 anos – que em 2023 foi o mais jovem presidente eleito do Equador – é herdeiro da fortuna da indústria das bananas do pai, que foi por cinco vezes candidato à presidência.
Nascido em Miami, o atual presidente – que prefere as redes sociais aos discursos e é popular entre os mais jovens – espera que o seu plano para enfrentar os cortes de energia (causados pela seca que esvaziou as barragens) e mão dura contra o crime (está a construir uma prisão de alta segurança ao estilo da que Nayib Bukele criou em El Salvador) sejam suficientes para garantir a vitória à primeira volta.
Mas, para isso, o candidato da Ação Democrática Nacional precisaria de ter mais de 50% dos votos ou 40% com uma vantagem de dez pontos em relação ao principal adversário. Caso isso não aconteça, haverá uma segunda volta a 13 de abril.
Apesar de ter 15 adversários, a única verdadeira ameaça é da "correísta" Luisa González – a candidata da Revolução Cidadã, do ex-presidente Rafael Correa. Os dois já se enfrentaram nas eleições de 2023, tendo Noboa ganho por menos de 400 mil votos na segunda volta.
A sondagem Ipsos dá 45,5% de intenções de voto a Noboa, frente a 31,3% de González. Já a Informe Confidencial coloca o presidente com 37%, com González a não ir além dos 29% - a margem que vale, historicamente, o "correísmo", com a advogada a parecer incapaz de ir mais além.
O voto neste país de 18 milhões de habitantes é obrigatório para os cidadãos entre os 18 e os 64 anos, e opcional entre os 16 e os 17 e a partir dos 65. O presidente, que tem governado muito por decreto, espera que as eleições lhe garantam também o controlo da Assembleia Nacional, onde a Revolução Cidadã tem o maior número de lugares (48 em 137). O número de lugares vai subir para 151.
Violência
O maior problema para os equatorianos é a insegurança, com o aumento do crime organizado – potenciado pela falta de emprego entre os jovens, que ficaram vulneráveis diantes dos grupos de narcotráfico vindos do México, da Colômbia e até dos Balcãs.
Em janeiro do ano passado, o presidente declarou a "guerra" contra estes grupos (declarou 22 organizações como "terroristas"), colocando os militares a fazerem também o trabalho das forças de segurança.
Noboa lembra que as mortes violentas caíram 15% no ano passado (de 8237 em 2023 para 6962 em 2024) e que o seu objetivo "não se pode conseguir num ano", mas os críticos dizem que ainda continua acima dos valores pré-pandémicos e os especialistas dizem que no final do ano estava a aproximar-se de números homólogos do ano anterior.
A taxa de homicídios é de 47,2 por cada cem mil habitantes, a mais elevada na América Latina e oito vezes superior à de 2016. E estão também a aumentar os casos de extorsão e de raptos.
Além disso, o poder reforçado dos militares gera receios de abusos. O caso mais grave envolve quatro adolescentes, que desapareceram na cidade portuária de Gayaquil e as imagens de videovigilância mostraram a serem levados por um veículo militar. Os corpos carbonizados acabariam por ser encontrados perto de uma base militar, com 16 soldados a serem detidos. O ministro da Defesa pediu desculpas às famílias.
Noboa, que esteve na tomada de posse de Donald Trump, quer melhorar as relações com os EUA e estará a equacionar mudar a Constituição para pôr fim à proibição de instalação de bases militares estrangeiras no país. Uma proibição criada durante a presidência de Correa, para afastar os EUA, que se considera contudo ser crucial para combater grupos criminosos organizados. O Equador é um dos países que aceitou os voos de deportação de imigrantes ilegais vindos dos EUA.
A violência é o principal problema, à frente das questões económicas. Isto apesar de 25% da população viver na pobreza, segundo os dados oficiais. A crise energética também não ajudou, com cortes de eletricidade de mais de 14 horas – uma situação que se poderá repetir este ano, por causa da seca.
A "guerra" com a vice-presidente
O presidente envolveu-se num desentendimento público com a vice-presidente Veronica Abad ainda antes de tomarem posse. As origens do feudo não são conhecidas, mas Noboa acabaria por nomeá-la embaixadora em Israel – de forma a afastá-la do país. Abad falou num "exílio forçado" e recusou uma ordem para mudar-se para a Turquia, por questões de segurança durante a guerra em Gaza.
O Ministério do Trabalho acabaria por suspender Abad, algo que o tribunal revogou, considerandoa medida inconstitucional (ela, tal como o presidente, foi eleita). Ainda assim, Noboa optou por nomear uma vice-presidente interina, Cynthia Gellibert (também ministra da Administração Pública).
A decisão prendia-se com o facto de, segundo a legislação equatoriana, os candidatos terem que deixar o cargo público que desempenham para poder fazer campanha – o que significaria que Noboa teria que entregar o poder na mão da vice.
Contudo, o presidente acabou por não pedir licença à Assembleia Nacional, optando por emitir uma série de decretos onde comunicava que se ausentava e passava o poder em Gellibert, por períodos máximos de quatro dias que usou para fazer campanha. Contudo, um tribunal considerou estes decretos inconsticionais, mas Noboa ignorou essa ordem. Abad reclama ações contra o presidente.
Sem Noboa, tornaram-se virais as figuras de cartão em tamanho real de Noboa (de fato e faixa presidencial, mas também em T-shirt e jeans ou em calções), que os seus apoiantes usaram para fazer vídeos e fotos que partilharam nas redes sociais.