Ao mesmo tempo que o primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, reunia o gabinete de segurança que iria dar a luz verde ao acordo de cessar-fogo com o Hezbollah, as Forças de Defesa de Israel (IDF, na sigla em inglês) bombardeavam o centro de Beirute. Horas antes, de manhã, e em apenas dois minutos, tinham atingido 20 locais nos arredores da capital libanesa, enquanto a comunidade internacional repetia os apelos para calar as armas no país..A luz verde ao acordo chegou pouco depois das 18.00 de terça-feira em Lisboa, com Netanyahu a anunciar que este ia ser apresentado ao conselho de ministros para aprovação - no gabinete nacional de segurança passou com 10 votos a favor e um contra, o do ministro da Segurança Nacional, o extremista Itamar Ben-Gvir, que o considerou um “erro histórico”..O primeiro-ministro alegou que “o Hezbollah não é o que era” e que a ação militar israelita - desde o início da troca de tiros quase diária na fronteira após o ataque do Hamas a 7 de outubro de 2023 até à incursão quase um ano depois - permitiu fazer o grupo “recuar décadas”. Nomeadamente ao cortar “a cabeça da serpente”, referindo-se à morte do líder do grupo xiita libanês, Hassan Nasrallah, mas também de muitos outros dirigentes. .“A duração do cessar-fogo depende do que acontecer no Líbano. Faremos cumprir o acordo e responderemos vigorosamente a qualquer violação”, disse Netanyahu. Mais tarde, congratulando-se com o acordo, o presidente dos EUA, Joe Biden, disse que este está “desenhado para ser uma cessação permanente das hostilidades”, mostrando-se esperançoso que possa ajudar também a um acordo com o Hamas e a libertação dos reféns. “A paz é possível”, insistiu. .Do lado de Israel, Netanyahu deu três razões para avançar agora para o cessar-fogo no Líbano. Em primeiro lugar, o acordo irá permitir a Israel “focar-se na ameaça iraniana”. Em segundo lugar, permitirá “rearmar” as forças israelitas - admitindo atrasos na chegada de armas - e finalmente irá “isolar” o Hamas. “A nossa pressão sobre o Hamas irá aumentar e isso irá ajudar a trazer os reféns para casa”, disse. .Mas antes de o acordo entrar em vigor (a previsão era a madrugada), Israel gastou os “últimos cartuchos” em Beirute e no resto do Líbano. O alvo dos bombardeamentos de última hora era o Hezbollah, tendo sido alegadamente atingidos 180 locais ligados ao grupo xiita libanês em todo o país. Pelo menos dez pessoas morreram nos ataques no centro de Beirute, segundo as autoridades. O Hezbollah também manteve os ataques com rockets contra Israel no mesmo período..O acordo requer que as tropas israelitas retirem em 60 dias, sendo enviado para a região o exército libanês. O Hezbollah tem que retirar as suas forças a sul do rio Litani - onde os israelitas terão chegado ontem pela primeira vez desde que saíram em 2000. .Comissão Civil de Inquérito.Apesar do anúncio de cessar-fogo no Líbano, não há sinal de que um acordo do género esteja próximo na Faixa de Gaza. As famílias das vítimas do ataque de 7 de outubro criaram, há quatro meses, uma Comissão Civil de Inquérito, devido à falta de resposta das autoridades israelitas. Esta terça-feira vieram a público as conclusões da comissão, liderada pela ex-juíza Varda Alsheikh, sendo arrasadoras para Netanyahu e o seu governo, acusados de falhar na proteção dos cidadãos..Segundo o Times of Israel, a comissão fala em “arrogância” pelo facto de as IDF “não estarem preparadas para a invasão” dos “terroristas do Hamas, apesar de o seu plano ser conhecido”. Da mesma forma, “a arrogância e a cegueira inerente levaram também a liderança política a continuar a trabalhar para fortalecer o Hamas, transferindo fundos e evitando tomar uma iniciativa ofensiva face às ameaças, ao mesmo tempo que idealizava a realidade e tentava comprar a tranquilidade do Hamas usando dinheiro”. Em relação ao primeiro-ministro, culpam-no de ignorar “avisos repetidos” da liderança militar, falando de uma “relação má” entre ambas as partes..susana.f.salvador@dn.pt