Um navio da organização não-governamental (ONG) espanhola Open Arms, carregado com 200 toneladas de alimentos, aguardava este sábado no porto cipriota de Larnaca a luz verde para poder estrear o “corredor humanitário marítimo” para a Faixa de Gaza. A expectativa da ONG era que seria possível sair ainda este sábado à noite ou, o mais tardar, este domingo do Chipre - que fica a 400 quilómetros do enclave palestiniano - rompendo o bloqueio marítimo imposto por Israel desde 2007..“Há três semanas, o navio da Open Armas, em colaboração com a World Central Kitchen, atracou no Chipre para uma missão conjunta. O que inicialmente parecia um desafio intransponível está agora à beira de realizar-se”, indicou no X (antigo Twitter) a ONG, conhecida também pelos resgates de migrantes ilegais no Mediterrâneo. “A situação em Gaza está a deteriorar-se rapidamente e o tempo é essencial. Quantas mais vidas terão de ser sacrificadas antes de o mundo responder com a urgência que a situação exige?”..A embarcação transporta água, farinha, arroz, latas de atum e outros alimentos, que serão recebidos e distribuídos pelas equipas da World Central Kitchen, a organização não-governamental do chef espanhol José Andrés que está no terreno desde o início da guerra. A carga estava este sábado a ser inspecionada pelas autoridades israelitas, que tinham dado luz verde a uma missão deste género ainda em dezembro de 2023. A missão não detalhou, por motivos de segurança, o local onde vai desembarcar, dizendo que já estava a construir uma estrutura provisória para isso..Os EUA, que este sábado realizaram o quinto lançamento aéreo de ajuda humanitária, também já anunciaram que pretendem construir um porto flutuante temporário ao largo de Gaza. O objetivo é facilitar a entrega da ajuda, mas o Pentágono indicou que essa construção pode demorar 60 dias - sendo necessário o trabalho de cerca de mil militares norte-americanos que o presidente Joe Biden garantiu que não vão pôr pé na Faixa de Gaza. .Na sexta-feira, a presidente da Comissão Europeia, Ursula Von der Leyen, anunciou que o corredor marítimo começaria a funcionar este fim de semana, mas as fontes da Open Arms disseram à agência EFE que não receberam nenhum apoio de Bruxelas. A ONG desconhece se quando Von der Leyen disse que um primeiro navio partiria “hoje mesmo” (na sexta-feira) se estava a referir à sua missão ou a alguma outra, mostrando-se contudo disponível para colaborar..As Nações Unidas defendem que a prioridade deve ser a abertura de mais vias terrestres. O relator especial sobre o Direito à Alimentação, Michael Fakhri, considerou “absurdo” que os EUA estejam a procurar alternativas para permitir a entrada de ajuda num território bloqueado pelo seu próprio aliado. “De uma perspetiva humanitária, de uma perspetiva internacional, de uma perspetiva de direitos humanos, é absurdo de uma forma sombria e cínica”, afirmou em Genebra. Israel rejeita estar a bloquear a entrada de ajuda através de duas fronteiras no sul da Faixa de Gaza..Segundo o Ministério da Saúde do enclave palestiniano, controlado pelo Hamas, pelo menos 25 pessoas - a maioria bebés - já morreram por subnutrição e desidratação. Estima-se que, só no norte do território, 700 mil pessoas correm o risco de morrer à fome. De acordo com as contas do Hamas, desde o início da guerra já morreram mais de 30 900 pessoas na Faixa de Gaza. Os bombardeamentos começaram a 7 de outubro, após os ataques do grupo terrorista contra Israel, que terão causado cerca de 1200 mortos..Ramadão e tréguas.O navio da Open Arms deverá chegar em pleno mês sagrado do Ramadão (que começa esta segunda-feira), durante o qual os muçulmanos jejuam do nascer até ao pôr do sol, e ainda com bombardeamentos e operações israelitas em curso. Falhou até agora a negociação de uma trégua entre Israel e o Hamas, que permita não só parar os combates como abrir a porta à libertação de reféns - ainda haverá cerca de 120 em Gaza, sendo que o grupo terrorista alega que pelo menos 70 já morreram nos bombardeamentos israelitas, mas Israel só confirma a morte de 31..O governo de Israel revelou este sábado que o líder dos seus serviços secretos (a Mossad), David Barnea, se encontrou na sexta-feira com o homólogo norte-americano, o responsável da CIA, Bill Burns. Segundo um comunicado em nome da Mossad emitido pelo gabinete do primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, “o Hamas está a insistir na sua posição como alguém que não está interessado num acordo e está a esforçar-se por inflamar a região durante o Ramadão às custas dos residentes palestinianos da Faixa de Gaza”. Apesar disso, a Mossad diz que “o diálogo e a cooperação com os mediadores continua a toda a hora numa tentativa de reduzir as lacunas e avançar acordos”..susana.f.salvador@dn.pt