Julgamento de Trump avança no Senado

Seis republicanos votaram a favor da continuação do processo judicial de destituição, que começou com a divulgação de excertos dos acontecimentos de 6 de janeiro, dia do assalto ao Capitólio, em que morreram cinco pessoas. Foram também reproduzidas imagens do comício de Trump nesse dia.
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O Senado norte-americano aprovou esta terça-feira, com os votos dos senadores democratas e de alguns republicanos, a continuação do processo judicial de destituição do ex-presidente Donald Trump.

Com 56 votos a favor e 44 votos contra, a Câmara Alta do Congresso confirmou assim que o processo contra o ex-presidente se enquadra na sua jurisdição.

Seis republicanos votaram a favor da continuação do processo, juntamente com os 50 senadores democratas.

Entre os votos republicanos a favor, o único inesperado foi o do senador do Louisiana Bill Cassidy, que antes se havia declarado contrário ao processo, mas que mudou de posição depois da exposição dos argumentos.

Já esperados eram os votos favoráveis dos senadores Susan Collins (Estado do Maine), Lisa Murkowski (Alaska), Mitt Romney (Utah), Ben Sasse (Nebraska) and Pat Toomey (Pensilvânia).

O líder dos republicanos no Senado, Mitch McConnell votou contra a continuação do processo, como esperado.

A votação no Senado teve lugar no final do primeiro dia de debate, bastando uma maioria simples para que o processo avance.

Os democratas têm metade dos 100 lugares no Senado, e contavam com o apoio de alguns republicanos.

O processo judicial de destituição de Donald Trump começou com a exibição das imagens do assalto ao Capitólio em janeiro, que a acusação considera ter resultado de incitamento pelo ex-Presidente.

Sob fortes medidas de segurança no exterior do Capitólio, em Washington D.C., os 100 senadores - 50 democratas e 50 republicanos - assistiram a excertos dos acontecimentos de 6 de janeiro, quando se contavam no interior daquele mesmo edifício os votos do Colégio Eleitoral que davam a vitória a Joe Biden, que os apoiantes de Trump consideravam fraudulenta.

Além das imagens do assalto, em que morreram cinco pessoas, a acusação reproduziu também imagens do comício de Trump, então Presidente cessante, no exterior do Capitólio, em que este reiterou a acusação de fraude e proferiu uma frase que a acusação considera provar que incitou a violência que se seguiu: "vamos dirigir-nos ao Capitólio".

No final de mostradas as imagens do comício e da posterior violência, o congressista democrata Jamie Raskin, que lidera a acusação ao ex-Presidente, declarou: "Se isto não é uma ofensa digna de destituição, então não existe tal coisa".

Professor de Direito, Raskin prometeu aos senadores - hoje na posição de jurados depois de em janeiro muitos deles terem estado sitiados durante a invasão do Capitólio - apresentar "factos claros e sólidos" de crimes cometidos pelo ex-Presidente.

Hoje, militares armados da Guarda Nacional marcam presença no exterior do perímetro do Capitólio, vedado e protegido por arame farpado.

No primeiro dia do julgamento, os advogados de Trump contestaram a constitucionalidade do julgamento de destituição, quando o ex-Presidente já não está em funções, além do argumentarem que Trump estava apenas a exercer os seus direitos da Primeira Emenda da Constituição (de proteção à liberdade de expressão), quando contestou os resultados eleitorais.

Trump é o primeiro Presidente a ser sujeito a um processo de 'impeachment' por duas vezes no mesmo mandato e o único a ser julgado politicamente depois de já ter abandonado o cargo.

A Constituição determina que a condenação só será válida se tiver o apoio de dois terços dos 100 senadores, ou seja se aos 50 democratas se somarem 17 republicanos, mas da bancada republicana poucos se mostram favoráveis à condenação do ex-Presidente.

O julgamento irá continuar na quarta-feira às 12:00 locais de Washington.

Recorrendo a vídeos de congressistas democratas a pedir a destituição de Donald Trump, desde o início da sua presidência, a defesa do ex-presidente argumentou no Senado que o objetivo real do julgamento é impedir a sua recandidatura futura.

Depois de a própria acusação ter recorrido ao vídeo para sustentar perante os 100 senadores que o assalto ao Capitólio a 6 de janeiro resultou de incitamento à violência pelo ex-presidente, David Schoen, advogado de defesa de Trump argumentou, no primeiro dia de trabalhos, que o fim político do processo - travar a recandidatura de Trump - levou a várias inconstitucionalidades, em primeiro lugar o facto de "um cidadão" ser julgado no Senado, num processo reservado pela Constituição a presidentes em funções.

Para demonstrar o "ódio político" que levou à "irresponsabilidade no processo" em curso no Senado, Schoen mostrou alguns minutos de vídeo de congressistas democratas a defender a destituição de Donald Trump, desde 2017, casos das jovens Alexandria Ocasio-Cortez e Ilhan Omar.

Nalgumas declarações, os apelos à destituição, em comícios populares, surgiam misturados com injúrias pessoais ao ex-presidente.

Depois de o seu colega de defesa, Bruce Castor, ter "baixado a temperatura emocional" no Senado - aumentada, segundo admitiram elementos da equipa de Trump a repórteres presentes, pela exibição de vídeos do assalto ao Capitólio pela acusação - Schoen procurou vincar a inconstitucionalidade do processo, mas também a sua inoportunidade.

"A Nação não conseguirá reconciliar-se com este julgamento, ele vai abrir ainda mais as feridas (...) devido ao aproveitamento de uma oportunidade para fins políticos, de afastar Donald Trump da Presidência no futuro, negando a representação dos seus eleitores", disse Schoen.

"O processo de destituição não pode ser usado como arma para objetivos políticos e partidários", sublinhou.

O advogado de defesa ilustrou também o que qualificou de "impeachment precipitado" com o facto de ainda estar em curso uma investigação judicial aos acontecimentos de 6 de janeiro em Washington D.C., com "provas a chegar todos os dias de planeamento prévio por alguns dos responsáveis e da sua agenda".

Enquanto julgamento, o processo no Senado, defendeu, padece de irregularidades, nomeadamente o facto de o ex-presidente não ter sido confrontado antes com provas contra si - apenas foi requerido o seu testemunho durante as audiências - pelo que pode ser considerado denegação de Justiça a Donald Trump.

Colocou ainda em causa a imparcialidade do processo, uma vez que a presidir no Senado está o mais veterano senador democrata, Patrick Leahy, em vez de - como é prática nos processos de destituição presidencial - o presidente do Supremo Tribunal, John Roberts, que presidiu à primeira destituição de Trump, em 2020, mas pediu escusa do atual processo.

Reforçando a inconstitucionalidade do processo, Schoen sustentou que os artigos de destituição foram elaborados "apressadamente" pelos congressistas democratas "para ir ao encontro do clamor popular da sua base política", na altura indignada com os acontecimentos do Capitólio, ignorando que um cidadão privado "pode ser julgado no tribunal, mas não destituído pelo Senado".

Tal como a Constituição foi elaborada, disse Schoen, só presidentes podem ser alvo de destituição, sendo a pena a perda do mandato e, cumulativamente (não em alternativa) inibição de voltar a ser presidente no futuro.

"A instituição da presidência está em risco", disse Schoen, alertando para o facto de o mesmo processo poder vir a ser usado no futuro pelos republicanos contra um presidente democrata depois de abandonar funções.

Aliás, sublinhou, pela mesma lógica dos artigos de destituição apresentados ao Senado, um ex-presidente como Richard Nixon poderia hoje ser alvo de um processo de destituição.

Atualizado às 23:42

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