Família palestiniana em fuga dos campos de refugiados Al Nusairat e Al Bureije.
Família palestiniana em fuga dos campos de refugiados Al Nusairat e Al Bureije.EPA/MOHAMMED SABER

Já há mais de 120 milhões de pessoas deslocadas no mundo. Cinco países originam 69% dos refugiados

No final de 2024, havia 123,2 milhões de pessoas a viverem longe de casa devido a guerras, violência e perseguições. Número quase duplicou na última década, indica um relatório publicado pela ONU.
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Uma em cada 67 pessoas no mundo vive deslocada à força, devido a guerra, violência, perseguições ou desastres naturais. Os dados do último relatório da Agência da ONU para os Refugiados (ACNUR), divulgado esta quinta-feira (12 de junho), revelam que no final de 2024 o mundo registava um novo recorde de 123,2 milhões de pessoas deslocadas, um número que inclui mais de 42,7 milhões de refugiados em países que não o de origem e 73,5 milhões de deslocados internamente.

No espaço de uma década, esta crise humanitária quase duplicou face aos 65 milhões de deslocados registados em 2015, ilustrando a dimensão de uma realidade que se agrava por várias regiões do planeta. Face a 2023, o ano passado trouxe um aumento de cerca de 7 milhões de pessoas deslocadas (6 por cento mais).

Na segunda metade de 2024, e até o final de abril de 2025, o relatório da ACNUR estima, no entanto, que o número global de pessoas deslocadas à força terá caído ligeiramente, em 1 por cento, para 122,1 milhões – a primeira diminuição registada em mais de uma década.

A agência das Nações Unidas sublinha que, ao contrário da perceção existente em muitos países desenvolvidos, 60% das pessoas deslocadas à força não abandonam o país de origem e que, dos refugiados que o fazem, dois em cada três vivem em países vizinhos e três em cada quatro em economias em desenvolvimento.

Países que geram mais deslocados

O Sudão tornou-se o país com o maior número de deslocados forçados no mundo, com 14,3 milhões de pessoas afetadas pela guerra civil que se intensificou nos últimos anos. A crise sudanesa provocou grandes fluxos de refugiados para países vizinhos como o Chade, o Sudão do Sul e a Líbia, que acolhem a vasta maioria desses deslocados.

A Síria, que durante anos liderou esta triste estatística, ocupa agora a segunda posição neste relatório da ACNUR, com 13,5 milhões de deslocados. Apesar de uma recente onda de regressos espontâneos ao país, após a queda do regime de Bashar al-Assad em 2024, milhões de sírios continuam a viver fora das suas casas devido a mais de uma década de guerra civil.

O Afeganistão surge em terceiro lugar, com 10,3 milhões de deslocados. A combinação de décadas de conflito, repressão sob o regime talibã e deportações forçadas do Irão e do Paquistão explicam estes números, apesar da diminuição no número total de refugiados afegãos em 2024.

A Ucrânia, ainda assolada pela guerra iniciada pela Rússia em 2022, ocupa o quarto lugar com 8,8 milhões de deslocados. A maioria dos refugiados ucranianos está concentrada em países europeus, como Alemanha, Polónia e Chéquia.

Países que mais geram refugiados internacionais

A população global de refugiados internacionais diminuiu em 2024 em 613.600 pessoas (-1%), totalizando 42,7 milhões. Desses, 69% provêm de apenas cinco países:

Síria (cerca de 6 milhões)

Um em cada seis refugiados era sírio, apesar da diminuição de 6% em 2024, para 6 milhões. Como nos anos anteriores, a maioria deles foi acolhida pela Turquia (2,9 milhões, -10%), Líbano (755.400, -4%), Alemanha (725.100, +3%) e Jordânia (611.500, -6%).

Afeganistão (cerca de 5,8 milhões)

Aproximadamente 5,8 milhões de refugiados afegãos foram registados no final do ano, uma queda de 10% em comparação ao final de 2023. A República Islâmica do Irão (3,5 milhões, -7%) e o Paquistão (1,6 milhão, -22%) continuaram como os principais países de acolhimento de refugiados afegãos.

Ucrânia (cerca de 5 milhões)

O relatório da ACNUR refere que “o número de refugiados ucranianos acolhidos na Europa era de mais de 5 milhões no final de 2024”. A maioria foi acolhida na Alemanha (1,2 milhão, +10%), Polónia (991.200, +4%) e Chéquia (388.400, +4%).

Sudão do Sul (cerca de 2,3 milhões)

Havia 2,3 milhões de refugiados do Sudão do Sul no final do ano, “um número inalterado em relação ao ano anterior”. A maioria foi acolhida no Uganda (975.000), Sudão (613.100) e Etiópia (420.100).

Sudão (cerca 2,1 milhões)

“O número de refugiados sudaneses aumentou em 40%, alcançando 2,1 milhões até final de 2024”, denuncia o relatório divulgado. Quase todos os refugiados do Sudão (93%) foram acolhidos por países vizinhos, incluindo o Chade (1,1 milhões, +20%), Sudão do Sul (487.700, +36%) e Líbia (199.400, um aumento de 200 vezes).

Países que mais acolhem refugiados

Os países que mais acolhem refugiados em números absolutos são:

Irão – 3,5 milhões (principalmente afegãos)

Turquia – 2,9 milhões (sobretudo sírios)

Colômbia – 2,8 milhões (principalmente venezuelanos)

Alemanha – 2,7 milhões (ucranianos, sírios, afegãos)

Uganda – 1,8 milhões (sul-sudaneses e congoleses)

Em termos proporcionais à população nacional, no entanto, os países de acolhimento com maior peso de refugiados foram, em 2024, Líbano (1 refugiado para cada 8 habitantes), Chade (1 para cada 16) e Jordânia (1 para cada 16).

Segundo o relatório da ACNUR, três em cada quatro refugiados vivem em países em desenvolvimento, com 67% acolhidos por países vizinhos ao de origem, refletindo a geopolítica regional dos deslocamentos.

Entre as causas principais dos deslocamentos estão conflitos armados prolongados, como na Síria, Sudão, Ucrânia e Afeganistão; crise económica e autoritarismo, como no caso da Venezuela; e perseguições étnicas, religiosas ou políticas, especialmente em Myanmar e algumas regiões do Sahel africano.

Países que recebem mais pedidos de asilo

O relatório do ACNUR inclui também estatísticas relativas aos países que recebem mais pedidos de asilo. A lista é encabeçada, por larga margem, pelos Estados Unidos (729 mil só na primeira metade de 2024), seguidos do Egito (433 mil para todo o ano), Alemanha (229 mil), Canadá (174 mil) e Espanha (167 mil, muitos deles colombianos, venezuelanos e ucranianos).

A agência da ONU alertou que, apesar de o número de deslocados no mundo ter quase duplicado desde 2015, o financiamento disponível para ajuda humanitária continua praticamente estagnado, num contexto marcado por cortes severos, como o recente congelamento das contribuições dos Estados Unidos — um dos principais doadores.

Família palestiniana em fuga dos campos de refugiados Al Nusairat e Al Bureije.
Cerca de 200 mil refugiados regressaram à Síria desde a queda de Bashar al-Assad

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