Projéteis nos céus de Jerusalém, depois de o Irão ter lançado 180 mísseis balísticos contra Israel.
Projéteis nos céus de Jerusalém, depois de o Irão ter lançado 180 mísseis balísticos contra Israel.MENAHEM KAHANA/AFP via Getty Images

Israel promete retaliar “onde, quando e como” quiser ao ataque do Irão

No dia em que os israelitas confirmaram uma “incursão limitada” no Líbano para atacar alvos do Hezbollah, Teerão escolheu responder às mortes do máximo dirigente do grupo xiita libanês e do líder político do Hamas com o lançamento de 180 mísseis.
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As autoridades israelitas prometeram esta terça-feira responder ao “grave ataque” do Irão, que lançou 180 mísseis balísticos contra Israel. É o segundo ataque direto iraniano contra o território israelita no espaço de seis meses, com Teerão a dizer tratar-se da resposta à morte do líder político do Hamas, Ismail Haniyeh, e do máximo dirigente do Hezbollah, Hassan Nasrallah. O ataque surgiu no dia em que Israel confirmou uma “incursão terrestre limitada e localizada” no Líbano.

“O ataque do Irão é uma escalada grave e perigosa. Haverá consequências”, disse o porta-voz das Forças de Defesa de Israel (IDF, na sigla em inglês), o contra-almirante Daniel Hagari. “Responderemos onde, quando e como escolhermos, de acordo com as diretrizes do governo de Israel”, acrescentou. “O Irão cometeu um grande erro esta noite. E vai pagar por isso”, reagiu o primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu. 

A representação do Irão nas Nações Unidas indicou, numa mensagem no X, que o ataque foi uma resposta “legal, racional e legítima” aos “atos terroristas” de Israel. E deixou o aviso: “Se o regime sionista ousar responder e cometer mais atos de malevolência, haverá uma resposta subsequente e esmagadora.” 

De acordo com os iranianos, 90% dos mísseis - terão sido usados pela primeira vez os hipersónicos Fattah - atingiram os alvos, que eram três bases militares. Mas, segundo os israelitas, a maioria dos projéteis foi intercetada, com o apoio dos EUA e de outros parceiros, admitindo  apenas “impactos isolados” e nenhuma vítima. Havia contudo informações de que um civil palestiniano poderá ter morrido na Cisjordânia devido aos estilhaços de um dos mísseis - que sobrevoaram o território ocupado.

O sistema de defesa israelita inclui a famosa Iron Dome (Cúpula de Ferro), mas esta está preparada para intercetar rockets como os disparados pelo Hamas e o Hezbollah. No caso de mísseis balísticos como os utilizados pelo Irão terão sido ativados outros dois sistemas, a Funda de David e a Flecha 2 e 3. Este último sistema é especialmente usado no caso de mísseis cujo trajeto sai para lá da atmosfera terrestre.  

“O ataque parece ter sido derrotado e ineficaz”, disse o conselheiro de Segurança Nacional da Casa Branca, Jake Sullivan, confirmando a participação dos EUA na operação. O Pentágono indicou depois que os norte-americanos dispararam dezenas de intercetadores a partir dos navios destroyer que estão na região. 

O ataque iraniano surgiu poucas horas depois de os EUA terem avisado que estava “iminente” e que seriam usados mísseis balísticos - que demoram apenas 12 minutos a chegar a Israel vindos do Irão. Há seis meses, tinham sido lançados cerca de uma centena de mísseis balísticos, antecedidos de outros tantos drones e mísseis cruzeiro que demoram horas a chegar. 

A 13 de abril, em resposta ao ataque contra a embaixada iraniana em Damasco que matou vários generais, Teerão efetuou o primeiro ataque direto contra Israel usando mais de 200 drones e mísseis. Uma manobra militar que foi vista como tendo sido coreografada, com avisos prévios que permitiram a Israel e aos aliados intercetar 99% dos projéteis. Desta  vez não houve aviso, tendo sido os sistemas de vigilância que permitiram antecipar o ataque. 

Em abril, Israel respondeu dias depois de forma controlada, evitando a escalada do conflito.  Não é claro que esse cenário se repita, podendo Netanyahu, aproveitar para atacar o programa nuclear iraniano. Tudo dependerá de como o ataque for apresentado -mais um falhanço do Irão ou uma nova ameaça contra Israel. 

Desde a morte num atentado em Teerão do líder político do Hamas que o Irão ameaçava com nova retaliação. Mas o país por detrás do “eixo da resistência” - que inclui o Hamas, o Hezbollah, os Houthis no Iémen e grupos iraquianos - tinha evitado envolver-se diretamente, ciente de que será alvo de uma resposta israelita e tem muito a perder. Netanyahu tinha avisado das possíveis consequências. 

A incursão terrestre das IDF no Líbano, dias depois da morte de  Nasrallah e de vários comandantes do Hezbollah, parece contudo ter sido a gota de água para o líder supremo iraniano. Ali Khamenei terá dado pessoalmente a ordem para o ataque de ontem. “A vitória pertence aos defensores da justiça”, escreveu no X. Horas antes tinha sido anunciado que vai liderar a oração de sexta-feira em Teerão - algo que só faz em circunstâncias especiais, a última delas em 2020 - não sendo claro se tal se mantém após o ataque contra Israel.

As salvas de tiros e manifestações de alegria em Beirute, Gaza ou em Teerão pelo ataque iraniano contrastam com as condenações ocidentais. O primeiro-ministro britânico, Keir Starmer, estava ao telefone com Netanyahu quando começou o ataque, tendo condenado “nos mais fortes termos” a ação iraniana. Starmer também defendeu a importância de um cessar-fogo no Líbano e na Faixa de Gaza.

“Condeno o alargamento do conflito no Médio Oriente com escalada após escalada. Isso deve parar. Precisamos absolutamente de um cessar-fogo”, escreveu o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, no X. “A União Europeia condena nos termos mais veementes o ataque do Irão contra Israel. O perigoso ciclo de ataques e retaliações corre o risco de se descontrolar. É necessário um cessar-fogo imediato em toda a região. A UE continua plenamente empenhada em contribuir para evitar uma guerra regional”, escreveu, por seu lado, o chefe da diplomacia europeia, Josep Borrell. 

Incursão

O ataque iraniano surgiu no dia em que as IDF confirmaram ter lançado uma “incursão terrestre limitada e localizada” no sul do Líbano, revelando contudo que têm levado a cabo operações secretas em território libanês no último ano. Os alvos israelitas são infraestruturas do Hezbollah e o objetivo é travar um ataque como o do Hamas de 7 de outubro, que alegam estar a ser planeado. O grupo xiita libanês negou qualquer incursão israelita. 

A par da operação terrestre, que Israel prometia continuar apesar do ataque iraniano, prosseguiram os bombardeamentos. As IDF deram ordens para a evacuação de 30 localidades a sul do rio Litani - na zona tampão que foi criada pelas Nações Unidas no sul do Líbano após a guerra de 2006 e de onde era suposto tanto Israel como o Hezbollah saírem (os segundos não o fizeram). 

As ordens são para retirar para norte de outro rio, o Awali, apesar de os bombardeamentos israelitas ocorrerem também mais a norte, incluindo na capital Beirute. Num desses ataques  terá sido morto o comandante da unidade do Hezbollah responsável pelo contrabando de armas do Irão, Muhammad Ja’far Kasir.

Alegadamente não terá ainda havido combates entre os dois lados, com o grupo xiita a alegar mesmo que não houve invasão. Esta não será contudo a primeira vez que tropas israelitas entraram no Líbano desde o início da guerra em Gaza, após os ataques terroristas do Hamas que marcaram o início da troca quase diária de tiros entre Israel e o Hezbollah na fronteira. Os israelitas têm efetuado incursões secretas para recolha de informação e para destruírem túneis e armamento do grupo xiita. 

susana.f.salvador@dn.pt

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