Gaza sob fogo. Jihad Islâmica contra-ataca, mas e o Hamas?

Israel avisa que "operação preventiva" pode durar uma semana. Grupo islamita respondeu com centenas de 'rockets'.
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Mais de um ano depois do conflito de 11 dias que opôs Israel ao grupo islamita palestiniano do Hamas, Gaza volta a ficar debaixo de fogo israelita, tendo já sido contabilizados pelo menos 24 mortos (entre eles seis crianças). Desta vez o alvo dos ataques é o grupo mais radical da Jihad Islâmica, que respondeu lançando centenas de rockets que fizeram soar as sirenes de alarme não apenas nas localidades junto à fronteira, mas também em Telavive. Israel avisa que os bombardeamentos podem durar toda a semana e a dúvida é saber o que irá o Hamas fazer.

O reacender do conflito surge após os israelitas terem lançado o que apelidaram de "operação preventiva" contra a Jihad Islâmica, que tem ligações ao Irão, alegando que esta estava a preparar um ataque numa altura de tensão ao longo da fronteira da Faixa de Gaza. O ataque na sexta-feira resultou na morte de um dos comandantes do grupo, Taysir al-Jabari, que os israelitas alegam ser responsável por uma onda de ataques dentro de Israel. Na segunda-feira, já tinha sido detido no campo de refugiados, em Jenin, na Cisjordânia, outro dos líderes, Bassem al-Saadi.

A Jihad Islâmica considerou os bombardeamentos - que, além dos 24 mortos, já causaram pelo menos 120 feridos - como uma "declaração de guerra". E respondeu com o lançamento de centenas de rockets, muitos deles intercetados pelo sistema de defesa israelita (Iron Dome), tendo pelo menos duas pessoas recebido tratamento após serem atingidas por estilhaços e 13 ficaram feridas quando corriam para os abrigos. "A batalha está apenas no início", disse ontem o líder do grupo em Gaza, Mohammed al-Hindi.

Já o lado israelita diz que a sua operação militar deve durar uma semana. "O Exército não está atualmente a realizar negociações de cessar-fogo", disse um porta-voz, citado pela AFP. "As forças de segurança vão atuar contra os terroristas da Jihad Islâmica e remover a ameaça para os cidadãos de Israel", disse o primeiro-ministro israelita, Yair Lapid, que é candidato às eleições legislativas antecipadas de 1 de novembro. Nos bombardeamentos de ontem, Israel disse ter atingido militantes que se preparavam para lançar rockets , além de pelo menos cinco casas em Gaza.

Este sábado, pelo menos nove palestinianos morreram, incluindo três crianças, numa explosão em Jabalia (no norte de Gaza). Mas o porta-voz do exército israelita, brigadeiro-general Ran Kohav, rejeitou a responsabilidade, alegando que imorreram numa tentativa falhada de lançamento de um rocket palestiniano. "Não lançámos ataques naquela altura", afirmou, citado pelos media locais.

Na sexta-feira, tanto o Hamas (que assumiu o controlo da Faixa de Gaza em 2007) como a Fatah (que governa na Cisjordânia) condenaram os ataques israelitas. O porta-voz do Hamas, Fauzi Barhum, avisou que Israel "vai ter de pagar o preço", frisando que a organização "está preparada" para retaliar. "A resistência, com todas as suas armas militares e fações, está unida nesta batalha", acrescentou. Contudo, não se juntaram no lançamento de rockets contra Israel.

Em 2019, quando o antecessor de Al-Jabari, Baha Abu al-Ata, foi morto por Israel e houve um reacender do conflito com a Jihad Islâmica, o Hamas não se juntou às hostilidades. Nessa altura, foram lançados 450 rockets contra o território palestiniano. O facto de o Hamas ter conseguido recentemente mais ajuda económica para os habitantes de Gaza pode levar o movimento a continuar à margem da situação, segundo os analistas, que avisam, contudo, que o aumento das mortes de civis - ou de qualquer membro do Hamas - poderá obrigar a uma resposta. Da mesma forma, eventuais confrontos em locais religiosos - este domingo é o feriado de Tisha Ba"av e muitos judeus devem visitar o Monte do Templo em Jerusalém (sagrado também para os muçulmanos) - podem levar o Hamas a responder.

Diante do reacender do conflito israelo-palestiniano, a comunidade internacional apressou-se a apelar à calma. Os EUA reiteraram o direito de Israel a defender-se dos grupos terroristas, apelando, contudo, a que se evite uma escalada da violência.

Já a Rússia disse observar com "extrema preocupação" a situação, apelando à "máxima contenção". O mesmo pediu a União Europeia. "Apesar de Israel ter o direito de proteger a sua população civil, tudo tem de ser feito para prevenir um conflito alargado", indicou um porta-voz do chefe da diplomacia dos 27, Josep Borrell.

O Irão, que apoia a Jihad Islâmica, disse que os militantes palestinianos de Gaza "não estão sozinhos" na luta. "Estamos com vocês neste caminho", indicou o líder dos Guardas da Revolução, major-general Hossein Salami, num encontro com o líder da Jihad Islâmica, Ziad al-Nakhala, em Teerão. Já os países árabes, da Jordânia ao Líbano, passando pelo Iraque ou Síria, condenaram a "agressão" israelita.

A ideia do Movimento da Jihad Islâmica da Palestina nasceu no final dos anos 1970 pelas mãos de dois estudantes palestinianos - Fathi Shikaki (assassinado em 1995 pela Mossad, em Malta) e Abd Al Aziz Awda - que se conheceram numa universidade egípcia. Inspirados pela Revolução Islâmica no Irão, fundaram, no regresso a casa em 1981, o grupo que tem como objetivo conseguir, exclusivamente através de meios militares e não do diálogo, um Estado palestiniano soberano e islâmico no território que inclui Israel. Em 1992, foi formada a Brigada Al-Quds, a ala armada, com o grupo - designado como organização terrorista por EUA e União Europeia - a assumir a responsabilidade por vários atentados suicida. Apesar de, por vezes, atuar em coordenação com o Hamas, mantém a sua independência em relação ao grupo maior, que controla Gaza. A Jihad Islâmica tem o apoio financeiro e militar do Irão.

susana.f.salvador@dn.pt

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