Manifestantes e polícia de Liverpool envolveram-se em escaramuças.
Manifestantes e polícia de Liverpool envolveram-se em escaramuças.PETER POWELL / AFP

Extrema-direita recebida nas ruas britânicas pela polícia e por contramanifestações

Sob o pretexto (falso) de que o assassino de três crianças é um perigoso imigrante muçulmano, a extrema-direita britânica mostrou os dentes em 25 localidades. Ao contrário dos dias anteriores, as autoridades controlaram os distúrbios.
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A violência voltou às ruas do Reino Unido, desta vez com os protestos da extrema-direita a serem recebidos com contramanifestações, e com as forças de segurança a mostrarem-se mais preparadas do que nos dias anteriores para lidar com o que o primeiro-ministro Keir Starmer apelidou de “bando de arruaceiros”. Os distúrbios eclodiram na terça-feira depois de a extrema-direita propagar desinformação sobre o autor do ataque mortal, na véspera, a crianças que frequentavam uma aula de dança em Southport, vila a norte de Liverpool.

Segundo uma contagem da Sky News, estavam planeados 30 protestos da extrema-direita com o nome genérico Enough Is Enough (“Basta”) contra a imigração e o Islão e, do lado oposto da barricada, cinco manifestações antirracistas.

Em Belfast, na Irlanda do Norte, nacionalistas irlandeses e unionistas marcharam lado a lado com as respetivas bandeiras - um raro momento de unidade entre católicos e protestantes antes de se envolverem em tensas trocas de palavras com manifestantes antirracismo, e onde fogo de artifício atingiu uma mulher. No centro de Liverpool, manifestantes atiraram cadeiras, tochas e tijolos contra os agentes da polícia, tendo vários ficado feridos. Não longe, em Manchester, também se registaram confrontos entre a polícia e os manifestantes.

Em Hull, no nordeste, três polícias ficaram feridos e quatro pessoas foram detidas depois de terem atacado um hotel que hospeda requerentes de asilo. Em Leeds, a extrema-direita saiu à rua em menor número do que a manifestação contrária, cuja frase de ordem era: “Escumalha nazi fora das ruas”. Em Blackpool, segundo a Sky News, entoaram-se cânticos a Tommy Robinson, nome de guerra de Stephen Yaxley-Lennon, fundador da Liga de Defesa Inglesa, organização de extrema-direita.

Robinson, diga-se, faltou a um julgamento e fugiu de Inglaterra. Em 2021 foi condenado por ter difamado um jovem sírio. O extremista voltou a repetir as acusações, pelo que iria responder por desrespeito ao tribunal.

Não é preciso estar em solo britânico para propagar desinformação e ódio. Desconhece-se para já o que levou o jovem de 17 anos a invadir a aula de dança inspirada em Taylor Swift e a esfaquear mortalmente três crianças (uma delas filha de um casal madeirense) e a ferir oito crianças e dois adultos. Por norma os suspeitos menores não são identificados pelas autoridades, mas a onda de desinformação foi tal que o juiz abriu uma exceção e disse que o detido se chama Axel Rudakubana, nascido no País de Gales de pais ruandeses.

Num vídeo publicado no X, na terça-feira, Robinson afirmou que “a raiva é justificada” em Southport, porque as autoridades britânicas “abriram as fronteiras”, o que resultou em “crianças a serem massacradas e assassinadas”. O problema, diz, é que o poder “preocupa-se mais com afegãos, somalis, eritreus, sírios, paquistaneses”. E concluiu: “Eles são um perigo para nós.”

Quando o líder da Liga de Defesa Inglesa se dirigiu aos seus seguidores já as chamas da indignação haviam tomado o lugar do luto: uma conta no X, associada a um suposto meio de comunicação intitulado Channel 3 Now News, partilhara que o atacante era um imigrante que tinha entrado ilegalmente no Reino Unido de barco. Além disso estava em listas de vigilância relacionadas com segurança e saúde mental. Seguiram-se tumultos em Southport e em Sunderland, com ataques a mesquitas, e até uma manifestação às portas da residência oficial do primeiro-ministro.

Keir Starmer: “Às grandes empresas de redes sociais, e quem as gere, permitam-me dizer também que a desordem violenta foi desencadeada online. Isso também é um crime e a lei tem de ser cumprida em todo o lado.” HENRY NICHOLLS / AFP

Keir Starmer, chamado a resolver a primeira crise desde que assumiu a chefia do Governo, culpou a extrema-direita, responsabilizou as redes sociais pela propagação de falsidades e saiu em defesa da polícia, além de ter anunciado um programa para as autoridades partilharem melhor informações entre agências e agirem de forma mais rápida.

cesar.avo@dn.pt

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