Europa admite deixar pessoas para trás. CIA reuniu-se com líder dos talibãs

A ministra da Defesa espanhola fala em situação "dramática". "Os talibãs estão a tornar-se mais agressivos, há tiros, a violência é mais óbvia", relatou. Reino Unido quer tirar do Afeganistão o "máximo de pessoas", mas "nem todos vão sair" do país. O tempo não é suficiente, diz a Alemanha.
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Espanha não vai ser capaz de resgatar todos os afegãos que serviram em missões espanholas no Afeganistão por causa da situação "dramática" que se vive no país, disse esta terça-feira a ministra da Defesa Margarita Robles.

"Vamos retirar o maior número de pessoas possível, mas há pessoas que ficarão por motivos que não dependem de nós, mas da situação que se vive lá", disse a governante durante uma entrevista à rádio Cadena Ser.

"É uma situação muito frustrante para todos, porque, mesmo para quem chega a Cabul, o acesso ao aeroporto é muito complicado", acrescentou.

"Os talibãs estão a tornar-se mais agressivos, há tiros, a violência é mais óbvia. A situação é francamente dramática e, além disso, a cada dia que passa fica pior porque as pessoas estão conscientes de que o tempo se está a esgotar", continuou.

Robles admitiu que algumas pessoas serão deixadas para trás, até porque há intérpretes que vivem em zonas como Herat, a três dias de carro de Cabul, e mesmo quem consegue aproximar-se do aeroporto da capital enfrenta uma situação "extremamente complicada" em termos de segurança.

Segundo a agência espanhola EFE, Robles disse que a Espanha continuará a retirar refugiados de Cabul durante o máximo de tempo possível, embora isso dependa das decisões dos líderes do G7, cuja reunião está marcada para esta terça-feira.

Pela voz do ministro da Defesa, o Reino Unido admite igualmente que não vai conseguir retirar do Afeganistão todos os que gostariam. "O nosso foco é retirar o máximo de pessoas", começou por referir Ben Wallace em declarações à BBC. "Mas a dimensão do desafio significa que nem todos vão sair", reconheceu.

Uma posição igualmente partilhada pela Alemanha. O ministro dos Negócios Estrangeiros alemão também afirmou esta terça-feira que os aliados ocidentais não vão conseguir retirar do país todos os afegãos elegíveis até 31 de agosto, a data definida pelos EUA para a retirada das suas tropas no Afeganistão.

"Mesmo que (a operação de retirada) dure até 31 de agosto ou mais alguns dias, não será suficiente",​​​​​ disse Heiko Maas à Bild TV pedindo novamente mais diálogo com os talibãs para garantir as transferências.

Também esta terça-feira, o chefe de gabinete do ministro dos Negócios Estrangeiros francês disse que a França terá de cessar as suas operações de resgate em Cabul na quinta-feira, se os Estados Unidos saírem do Afeganistão em 31 de agosto.

Se os EUA mantiverem o objetivo de uma retirada total no final deste mês, "para nós, em termos de 'planeamento antecipado', isso significa que a nossa operação termina na noite de quinta-feira. Portanto, ainda temos três dias", explicou Nicolas Roche ao primeiro-ministro, Jean Castex, na presença de jornalistas, segundo a agência AFP.

A observação foi feita durante uma visita de Jean Castex ao Centro de Crise e Apoio (CDCS) do Ministério dos Negócios Estrangeiros francês.

O governo de Paris identificou 62 cidadãos franceses ainda por retirar do Afeganistão e um grande número de afegãos solicitou ajuda para sair do país, que as autoridades estão a examinar, acrescentou a AFP.

Já Espanha tem retirado os seus cidadãos que trabalham no Afeganistão desde que os talibãs assumiram o poder há dez dias. Madrid já retirou pouco mais de 700 pessoas do Afeganistão, mas a ministra da Defesa disse que ainda havia "muitas pessoas" que precisavam de sair do país.

O governo espanhol sempre se recusou a fornecer um número total de pessoas que planeava tirar do país.

O Reino Unido fez saber que retirou duas mil pessoas em 24 horas e "10 mil desde abril", disse o ministro da Defesa britânico.

Londres defende o prolongamento da presença dos EUA no Afeganistão, mas caso isso não aconteça, o Reino Unido irá sair no prazo definido.

O presidente dos EUA, Joe Biden, definiu 31 de agosto como a data para terminar o caótico transporte aéreo organizado por milhares de soldados temporariamente destacados dos EUA e do Reino Unido, mas deixou a porta aberta para uma extensão, caso seja necessário.

Os talibãs já avisaram na segunda-feira que são contra qualquer extensão das tropas norte-americanas e britânicas. O porta-voz do grupo islâmico radical disse mesmo que "haverá consequências" caso haja um prolongamento da presença dos EUA no Afeganistão.

O The Washington Post noticiou, entretanto, que o diretor da CIA, William J. Burns, encontrou-se na segunda-feira com o líder dos talibãs, Abdul Ghani Baradar, em Cabul.

De acordo com o jornal norte-americano, que cita oficiais norte-americanos familiarizados com o assunto, e que falaram sob condição de anonimato, terá sido provavelmente abordado o prazo definido para que os militares dos EUA concluíssem as operações de retirada de cidadãos norte-americanos e aliados afegãos.

A CIA preferiu não comentar a informação divulgada pelo jornal.

A confirmar-se, esta terá sido a reunião ao mais alto nível entre os talibãs e a administração de Biden desde que o grupo islâmico regressou ao poder no Afeganistão, a 15 de agosto.

A decisão do Presidente dos EUA, Joe Biden, de enviar Burns - frequentemente apresentado como o seu diplomata mais experiente - a Cabul ilustra a gravidade da crise no Afeganistão para o seu Governo, perante o cenário de retirada confusa da capital afegã de milhares de norte-americanos e afegãos.

Burns reuniu com o 'mullah' Abdul Ghani Baradar, que chefiou a delegação negocial dos talibãs no Qatar e que se tornou o novo homem-forte do regime que tomou o poder em Cabul.

Os dirigentes do G7 (Alemanha, Canadá, Estados Unidos, França, Itália, Japão e Reino Unido) vão avaliar hoje à tarde, numa cimeira extraordinária, a possibilidade de adiar a data de retirada das forças dos Estados Unidos e dos seus aliados, prevista para 31 de agosto.

O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, e o secretário-geral da NATO, Jens Stoltenberg, participam na cimeira extraordinária do G7.

Antes da reunião do G7, está prevista uma conferência de imprensa dos talibãs, dada pelo porta-voz do grupo islâmico, Zabihullah Mujahid, diz a Newsweek.

O presidente dos EUA, Joe Biden, também deverá fazer esta terça-feira uma atualização sobre as operações de retirada no Afeganistão, avança a Sky News. Na declaração, prevista para as 17:00, o presidente deverá anunciar se os EUA vão prolongar a sua presença no Afeganistão.

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