Durão Barroso quer uma Europa competitiva num mundo “mais perigoso”.
Durão Barroso quer uma Europa competitiva num mundo “mais perigoso”.Rita Chantre / Global Imagens

Durão Barroso destaca cumplicidade ibérica para uma Europa “mais forte e sem complexos”

Ex-presidente da Comissão Europeia falou de integração europeia e de imigração na conferência “Inspira Portugal”, em Madrid.
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Num mundo muito tecnológico queremos ouvir as pessoas, saber o que pensam, que falem, que nos inspirem”, começava por dizer ontem em Madrid o embaixador de Portugal em Espanha, João Mira Gomes, no arranque da conferência “Inspira Portugal. 50 anos depois. Trajetória de Portugal e o seu diálogo com Espanha”. E foram quase oito horas de “inspiração”, de ouvir os oradores, as suas ideias e projetos que marcam a diferença. Também houve espaço para a voz da experiência no âmbito político, económico e cultural. O auditório da Fundação Ramón Areces foi o palco para todas estas conversas. 

O ex-presidente da Comissão Europeia e ex-primeiro ministro de Portugal, José Manuel Durão Barroso, abordou na sua intervenção o futuro da Europa, com “muitas razões de esperança” mas também de “preocupação”. Depois de passar em revista os principais momentos do seu mandato europeu, como a assinatura do Tratado de Lisboa, que trouxe “uma Europa mais resiliente” , Durão Barroso sublinhou as oportunidades que trouxeram as crises, “e fizeram possível coisas que antes não o eram”. Por exemplo, uma resposta “de união forte” perante a guerra na Ucrânia e uma Europa “mais consciente da geopolítica”. Na sua opinião, o Brexit não representa o princípio da desintegração. “O Brexit foi mais uma vacina do que um vírus” porque países com um pensamento mais próximo do Reino Unido, “são hoje mais europeus”. E inclusive os partidos mais radicais, à esquerda e à direita, “têm posições críticas da Europa mas dentro da Europa”. 

O ex-mandatário europeu acredita que o processo de integração europeia tem condições para continuar, mas a Europa tem problemas estruturais que devem ser resolvidos. Um deles, o demográfico, com uma população muito velha que traz “falta de dinamismo e inovação, perdemos a força”. E o envelhecimento traz a necessidade de mais imigração, mas “os europeus não querem mais imigrantes, sobretudo aqueles que são de países ou religiões onde existem problemas de integração”, sublinhou na sua intervenção. No seu entender, para manter uma Europa livre de fronteiras, “devemos ter fronteiras exteriores”. Outro dos problemas é o da energia e lembrou o “grito de alarme” do ex primeiro-ministro italiano Mario Draghi no seu relatório para uma UE mais competitiva. “Precisamos de aproveitar a escala europeia para competir” num mundo “mais perigoso”. Durão Barroso pede à Europa para proteger os seus interesses e considerou que “não podemos ser geopoliticamente adolescentes”.

A cumplicidade ibérica foi outro dos assuntos abordados pelo político português, um “valor acrescentado” onde não é preciso que exista a coincidência mas “sim a convergência”. Espanha e Portugal devem defender os valores europeus e dizer ao resto dos Estados que “a Europa deve ser mais forte, sem complexos”. O seu conhecimento e experiência também devem servir para estar mais próximos de África e da América Latina. 

António Portela, CEO da Bial, partilhou a experiência da farmacêutica portuguesa no mercado espanhol, “com uns inícios muito difíceis porque não o estudámos bem”. Perderam dinheiro, mas agora faturam perto de 100 milhões de euros e “tudo o que aprendemos em Espanha permitiu-nos, a partir de 2015, entrar noutros países de forma muito mais simples”. Antonio Brufau, presidente de Repsol, e Miguel Stilwell, CEO da EDP, definiram o mercado ibérico da eletricidade, MIBEL, como um exemplo de sucesso de cooperação ibérica, mas pediram às autoridades uma regulação que permita avançar na competitividade. 
Madrid e Lisboa

Na última palestra, o presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Carlos Moedas, e o seu homólogo madrileno, José Luís Martínez-Almeida, analisaram a importância do turismo nas duas capitais. Para Moedas, “a conexão Lisboa-Madrid deve ser um objetivo comum, os governos devem avançar. Vai mudar a estratégia toda e vai dar muito potencial às duas cidades, muito diferentes, mas muito complementares”. Moedas definiu o sistema de Madrid para controlar os carros no centro da cidade como o “melhor” e estamos a “estudá-lo” para Lisboa. Trata-se do sistema de baixas emissões que reduz em 33% a contaminação. Moedas trouxe também ao debate o tema da imigração, “essencial para um país. Não pode haver uma política onde toda a gente entra”. A Europa “precisa de imigrantes” e Lisboa deve “saber receber as pessoas e os que chegam devem respeitar os nossos valores”. Moedas disse que, se pudesse, ficava com “a autoestima dos madrilenos” enquanto Almeida gostava de ter “o pôr de sol sobre o Tejo”. 

No encerramento do evento, o ministro da Economia português, Pedro Reis, falou da necessidade de uma “estratégia ibérica” que se pode converter na base do futuro da Europa. E propôs a construção de clusters ibéricos em diferentes setores, entre eles a saúde e tudo o que envolve a defesa, a aeronáutica, o automóvel e os componentes. Salvador Sobral, ao piano, fechou com chave de ouro uma jornada inspiradora.

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